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Sérgio Machado, o paranóico com grampos que virou algoz do PMDB

Ex-presidente da Transpetro negocia, de acordo com várias publicações, um acordo de delação premiada

Sérgio Machado, ex-presidente da Transpetro.
Sérgio Machado, ex-presidente da Transpetro.Agência Brasil

Contam nos corredores da Transpetro que seu ex-presidente Sérgio Machado (Fortaleza, 1946) desconfiava até de quem trazia o cafezinho. Machado sempre preferiu o telefone fixo ao celular e não costumava começar conversas em ambiente nenhum antes de garantir sua privacidade. Ironias do Brasil de hoje, o responsável por gravar às escondidas um encontro com Romero Jucá no qual discutem como parar a “sangria” da Lava Jato era visto como um “paranóico” quando o tema era a possibilidade de cair num "grampo".

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Desde esta segunda-feira, Machado, que aguarda a homologação da sua delação premiada pelo Supremo Tribunal Federal de acordo com várias publicações, encarna o papel de homem-bomba do PMDB e pode ter usado seu apreço detalhista justamente para planejar gravações. Sua colaboração com a Justiça pode conter informações e áudios capazes de comprometer o presidente do Senado, Renan Calheiros, o ex-ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, o ex-presidente José Sarney e o senador Jader Barbalho. Segundo o jornal Valor Econômico, Machado gravou até mesmo Renan, seu padrinho político e responsável por sua nomeação na Transpetro, além de Sarney. O conjunto é  informação suficiente para espalhar ainda mais ansiedade em Brasília.

Machado, à frente do braço logístico da Petrobras por mais de 11 anos, apareceu na mira dos investigadores após a delação do ex-diretor de Refino e Abastecimento da Petrobras, Paulo Roberto Costa, que afirmou ter entregue nas mãos do peemedebista meio milhão de reais. As acusações entraram no radar da PricewaterhouseCoopers, auditora das contas da Petrobras desde 2012, que pressionou para a saída da Machado da Transpetro, considerada a maior processadora de gás natural do país.

Machado não aguentou a pressão e se afastou temporariamente em novembro de 2014 –  ele continua renovando sua licença anualmente –, mas qualificou a acusação de “leviana” e “absurda”. Em dezembro de 2015, a Polícia Federal bateu à porta da casa de Machado para cumprir um mandado de busca e apreensão em um dos desdobramentos da Operação Lava-Jato. Segundo a reportagem do jornal O Povo, Machado estava em casa e se negou a liberar a entrada dos agentes que tiveram que chamar um chaveiro para acessar à residência.

Desde então, Machado transmitia sua inquietação pelo avanço das investigações à cúpula do PMDB, incluindo o presidente do Senado. Nas gravações divulgadas nesta segunda-feira pela Folha de S. Paulo, Machado ilustrava assim seu receio ante Jucá, com quem, segundo ele, tinha mais intimidade: “O Janot [procurador-geral da República] está a fim de pegar vocês. E acha que eu sou o caminho […] Ele acha que eu sou o caixa de vocês.” Janot pediu, em maio, que o ex-presidente da Transpetro fosse incluído no inquérito-mãe da Lava Jato no Supremo.

Antes de virar ele mesmo um candidato a homem-bomba, Machado já havia sido citado pelo homem-bomba do PT, o ex-senador Delcídio Amaral, preso em flagrante sob a acusação de obstaculizar as investigações e cuja delação ameaça além da cúpula petista, Aécio Neves e até o presidente interino Michel Temer. “Seguidas vezes o vi, semanalmente, despachando com Renan na residência oficial da Presidência do Senado”. Delcídio, conforme publicou a revista Época, reconhece no seu depoimento que não pode prová-lo, mas explica que “por sua proximidade com Renan, o tempo de permanência e os níveis das contratações realizadas pela Transpetro”, haveria valores relacionados a contratos dessa empresa que foram repassados a políticos a título de propina.

Entre as qualidades que levaram a Machado a ser o mais longevo diretor da Transpetro está esse seu bom trânsito em Brasília e seu empenho em aprender do negócio. O peemedebista, que chegou a tocar uma fábrica de jeans da sua família, começou sua trajetória política no PSDB do Ceará e se elegeu deputado federal em 1990. Em 1994, ganhou a eleição para o Senado, e tornou-se líder do governo Fernando Henrique Cardoso. Em 2001, o cearense trocou os tucanos pelo PMDB e, um ano depois, tentou conquistar sem sucesso o cargo de governador do seu Estado. Naquele mesmo ano, ele escolheu apoiar Luiz Inácio Lula da Silva à Presidência. Esse seria seu passe para que, no ano seguinte e com apoio do Renan, ele chegasse à Transpetro.

Seis anos atrás, atribuiu-se a ele, num perfil do portal IG, uma frase que dizia: “Quem quer crescer não pode ser a única árvore na floresta”. Hoje, entre outras frases instantaneamente lendárias, resta a que ameaça com derrubar a floresta toda: "Aí fodeu. Aí fodeu para todo mundo. Como montar uma estrutura para evitar que eu desça [à primeira instância em mãos do juiz Sergio Moro]? Se eu descer…”

O que é a Transpetro

A Transpetro é uma subsidiária da Petrobras, criada em 1998 para a estatal separar seus ativos de logística. Entre as atividades da nova empresa incluiram-se o transporte e o armazenamento de petróleo, derivados e gás, e a operaração e construção de dutos, terminais marítimos e embarcações.

Sob o comando de mais de uma década de Machado, a empresa aumentou seu tamanho até alcançar 8,9 bilhões de receita. "Na presidência da Transpetro desde junho de 2003, estive à frente do processo que a transformou na maior empresa de transporte e logística de combustíveis do Brasil", disse Machado na sua nota de renuncia em 2014.

Em 2010, Machado chegou a entra na lista das 100 figuras mais influentes no setor marítimo. O jornal especializado do setor Trade Winds colocou Machado na 65ª posição do ranking, só atrás de um brasileiro, Roger Agnelli, presidente da Vale, morto em março em um accidente aéreo.

A publicação qualificou o peemedebista como um "executivo visionário e corajoso, que pautou sua atuação em favor da revitalização da indústria naval brasileira com base na sua relação de amor com o país", segundo o site da Transpetro.

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