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Coluna
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O STF e os pipoqueiros de Copacabana

STF deve julgar legalidade dos pipoqueiros autônomos, aparentemente mais nocivos do que Cunha

O pipoqueiro Ceará, que ronda por várias ruas de Copacabana, passa e provoca o colega de ofício que estaciona o carrinho de pipoca na frente do cine Roxy, onde descola um troco honesto: “Essa moleza vai acabar, hein, baixim, os homi vão cortar tuas asas e tuas pernas”. “Bota essa boca de praga pra lá, misera, tira o olho gordo do meu negócio”, rebate Paraíba, que vende sua iguaria aos frequentadores do cinemão da rede Kinoplex.

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Avisado por este cronista, vizinho da área, os amigos pipoqueiros ficaram assombrados com a possibilidade do Supremo Tribunal Federal proibir a entrada de “pipoca clandestina” nas grandes casas cinematográficas de todo o país. Tive que insistir com os ambulantes, velhos conhecidos aqui da minha cartografia sentimental carioca. Não queriam acreditar que a corte superiora, acionada por uma cadeia de exibidores, decidiria em breve sobre o tema.

“Só pode ser onda, não caio nesse migué, os homens das capas pretas, igual ao negão porreta Joaquim Barbosa?”, perguntou Paraíba. “Regulando minha mixaria? É ruim, hein!” “É de vera, pra valer”, comentou Ceará ao ler no meu smartphone –não botava fé até mostrá-lo o noticiário. “Tá atrapalhando o combo dos bacanas, quem manda vender teu milho velho quase de graça, fi de rapariga”, prosseguiu sacaneando o colega.

Ave, Cesar

Pipoca aqui, pipoca ali, mas na calçada, meu querido e liberalíssimo Adam Smith, sai tudo mais em conta e as opções ficam ao gosto do freguês. De três reais por diante, está valendo, você leva um saquinho para curtir o “Ave, Cesar!”, o novo filme dos diretores Joel e Ethan Coen. Lá dentro, o combo com uma coca-cola, fica na casa dos R$ 15. Ao recorrer ao STF, alegando concorrência desleal e inconstitucional, os donos das telas pleiteiam o monopólio da iguaria do milho.

A ameaça dos pipoqueiros de rua à Nação é mais grave que as tramoias golpistas do réu que comandou o impeachment da presidenta Dilma na Câmara

E quando, na prosa com as figuraças do bairro mais famoso do mundo, caí na besteira de dizer aos pipoqueiros que eles representavam um perigo maior para a Constituição da República Federativa do Brasil do que a roubalheira e as contas na Suíça do nobre deputado Eduardo Cunha?

Sim. A ameaça dos pipoqueiros de rua à Nação é mais grave que as tramoias golpistas do réu que comandou o impeachment da presidenta Dilma na Câmara. O julgamento do peemedebista carioca no STF está igual àqueles caroços de milho que teimam em não estourar no fundo da panela quente de óleo. Espera há quatro meses por uma iniciativa dos senhores de toga. E nada.

“Vão lascar primeiro a gente para depois pensar no cara de fuinha?”, gargalhou Ceará, referindo-se ao Cunha. “Que alarme, nem vem com essa lorota, bem que me disseram que você é comunista e contra a saída da dona Dilma”, o conterrâneo me apontou o dedo, na buena onda.

Paraíba renovou a fornada de pipoca para a próxima sessão e cochichou -não estava gostando nada daquela conspiração em alto e bom som na frente do cinema-, educadamente: “Quero que essa mulher vaze logo, quase toda freguesia fala que ela tá lascando a economia do Brasil, olha a crise aí, é verdade. Vamos tirar ela, depois tiram fora esse Cunha”.

Ceará, de partida, carrinho já apagado, provocou mais uma vez o colega do divertido milharal de Copacabana: “Cuidado, você vai sair dessa mamata na frente do cinema bem antes desse fela da mãe da chefia da Câmara”.

Aguardem as cenas dos próximos capítulos. Ave, Cesar!

Xico Sá, escritor e jornalista, é autor de “Big Jato” (editora Companhia das Letras), e comentarista dos programas “Redação Sportv” e “Papo de Segunda” (GNT).

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