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Cunha interfere no Conselho de Ética e paralisa toda a Câmara (e o Brasil)

Aliados do presidente da Câmara agora querem substituir o presidente do colegiado Nenhum projeto foi analisado nesta semana. Conselho se reúne somente na terça

Deputados Wellington Roberto e Zé Geraldo se estapeiam.
Deputados Wellington Roberto e Zé Geraldo se estapeiam.Lula Marques

Depois de conseguir trocar o relator do caso contra Eduardo Cunha (PMDB-RJ) no Conselho de Ética da Câmara, aliados do presidente da Casa agora querem substituir o presidente do colegiado, José Carlos Araújo (PSD-BA) e protelar ainda mais o julgamento do peemedebista por quebra de decoro parlamentar. A ofensiva para destituir Araújo começou na sessão de quarta-feira e se estendeu na desta quinta-feira. A justificativa é que ele estaria interferindo no processo para que o colegiado aceite logo a abertura do processo contra Cunha. Um pedido de suspeição foi levantado pelo deputado Carlos Marun (PMDB-MS) para o próprio Araújo analisar. Se ele o rejeitar o deputado deverá recorrer à Mesa Diretora, órgão sob comando do presidente da Casa, que tem acatado os pleitos de seus aliados, sem titubear.

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Enquanto a situação de Cunha não se resolve, o Parlamento brasileiro fica completamente paralisado (e, consequentemente, também o Brasil). Nesta semana, além da escolha da comissão especial que analisará o impeachment de Dilma Rousseff (PT), nada mais se votou na Câmara. A estagnação e a falta de compromisso com o regimento interno do Legislativo são tamanhos que nem esta única proposta analisada nos últimos quatro dias chegou a ter validade: o Supremo Tribunal Federal suspendeu seus efeitos para decretar um novo rito ao processo.

Os opositores do presidente iniciaram obstrução de qualquer votação no plenário da Câmara e ele, por sua vez, não levou nenhuma matéria para ser votada. “Enquanto a situação do presidente não se resolver, nada vai andar na Casa”, reforçou o deputado Alessandro Molon (REDE-RJ) durante a tumultuada reunião do Conselho de Ética.

Neste cenário, as medidas que o cambaleante Governo de Dilma Rousseff propôs para reaquecer a economia continuam paralisadas. O projeto que recria a CPMF (o imposto sobre movimentações bancárias) não avançou. As propostas que rediscutem o aumento dos tributos sobre combustíveis, sobre cosméticos e os cortes das desonerações também não foram analisados pelos congressistas. Por mais que as comissões das casas produzam, nada acaba sendo analisado pelo plenário.

Reunião foi marcada por muito bate-boca, troca de tapas e uma série de desabafos do antigo relator do processo contra Cunha

E o Conselho de Ética é apenas o reflexo dessa estagnação. No sétimo encontro do colegiado para discutir apenas a admissibilidade do processo contra Cunha, nada avançou. E o mérito da questão, a quebra de decoro parlamentar por mentir na CPI da Petrobras, por envolvimento na Operação Lava Jato e por esconder dinheiro fora do país, ainda nem chegou a ser analisada. Na reunião, houve muito bate-boca, troca de tapas e uma série de desabafos do antigo relator do processo, Fausto Pinato (PRB-SP), e do atual presidente, que demonstrou temer ser substituído do cargo. “Parece que quem não fizer o que um todo poderoso quiser não pode ocupar essa presidência”, reclamou Araújo.

Antes disso, os deputados Wellington Roberto (PR-PB) e Zé Geraldo (PT-PA) se estapearam enquanto discutiam. Geraldo disse que a “turma de Cunha” estava bagunçando o andamento dos trabalhos. Irritado, por entender que “quem faz parte de turma é bandido”, Roberto deu um tapa na mão do petista que revidou. A Polícia Legislativa e outros parlamentares tiveram de intervir para separar os dois. Nos corredores da Casa os funcionários comentavam entre si: “Vocês viram o MMA no Conselho de Ética?”, perguntou uma funcionária parlamentar. “Para mim parecia uma briga de dois moleques na escola”, respondeu um colega dela em frente a uma das lanchonetes da Câmara.

Depois de quase dez minutos de paralisação, a sessão do conselho recomeçou para não chegar a lugar nenhum. O novo relator do caso, Marcos Rogério (PDT-RO) apenas anunciou que apresentará seu parecer pedindo a admissibilidade do caso na sessão da próxima terça-feira. A expectativa é que a tropa de choque de Cunha volte a agir, primeiro reforçando o pedido de destituição do presidente da Casa, depois solicitando a vista do processo e, nas próximas sessões, tentando alterar os prazos para a votação do caso.

Além da atuação dos cães de guarda de Cunha, que durante as sessões são frequentemente abastecidos por seus assessores com possíveis medidas protelatórias ao julgamento do caso, os advogados dele estudam novas medidas judiciais para apresentarem antes do início da próxima sessão. Nesta semana, chegaram a ingressar no STF para tentar substituir o relator Pinato. Não conseguiram no Judiciário, mas foram bem-sucedidos com o aval da Mesa Diretora.

As tentativas de barrar as manobras de Cunha finalmente surtiram efeito em alguma entidade fora do Legislativo. Nesta quinta-feira, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) divulgou uma nota cobrando celeridade dos processos no Conselho de Ética e ameaçou ir ao Supremo para interferir no processo. “A OAB está pronta para ir ao STF com uma ação para garantir o funcionamento adequado do Conselho de Ética, caso isso seja necessário. O Colégio de Presidentes das seccionais da Ordem dos Advogados já se manifestou no sentido de que há motivos para o mandato de Eduardo Cunha ser cassado, respeitado o devido processo legal e a ampla defesa. Prezamos pelo bom funcionamento das instituições”, diz uma nota assinada pelo presidente do órgão, Marcus Vinícius Furtado Coelho.

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