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Coluna
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A fila do sexo anda, a do amor... tartaruga

No amor, a fila empaca como um jegue teimoso, para usar uma imagem do meu sertão/veredas

A mensagem de Lili a Sérgio em Juazeiro do Norte.
A mensagem de Lili a Sérgio em Juazeiro do Norte.Reprodução (Twitter)

Essa história demasiadamente otimista de que “a fila anda” vale para o sexo casual, o sexo do aplicativo, o sexo dos tarados da objetividade... Serve para o desprotegido sexo dos anjos e para os que se fantasiam de demônios com tridentes carnavalescos. No sexo do “book rosa” da novela Verdades Secretas, a fila avança conforme os dedos, levemente umedecidos na saliva do desejo, tocam as páginas para mudar de figura. A fila avança, perversamente, entre modas & modinhas.

No amor, todavia, a fila anda mais devagar do que a de um novo emprego em tempos de crise terrena; mais devagar do que a fila do velho INPS, o extinto Instituto Nacional de Previdência Social –os mais antigos recordam e se benzem. Mais devagar do que as filas privadas de companhias telefônicas que vendem os mais moderníssimos aparelhos e serviços...

A fila do amor sequer existe. Parece mais um lance do acaso, um game over em um jogo de coincidências, parece mais aquela brincadeira de onde está Wally. Para cada amor à primeira vista, centenas de tentativas de amores a prazo que acabam não dando certo –nem dando de maneira alguma, mesmo que toda forma de amor valha a pena.

Sem luto amoroso não há cura de um amor que doeu pra cacete

No amor, a fila empaca como um jegue teimoso, para usar uma imagem do meu sertão/veredas. Onde o jegue, aliás, e isso não tem nada a ver com o drama amoroso, ficou obsoleto, substituído pelas motocicletas. Em muitos casos somos esse lerdo jegue parado no tempo, com a cara mais enfezada do que a fuça do filósofo existencialista francês Jean-Paul Sartre (1905-1980).

Turismo sexual

A fila anda... no Tinder. Aí sim. Corra, Lola, corra. Como me diz aqui em um grupo de WhatsApp uma amiga de Salvador, a onda é fazer “turismo sexual”. Para não correr o risco de se deparar com os mesmos manjados marmanjos de outras aventuras provincianas, com muitos colegas de firma e até com os primos da infância no interior, a danada viaja somente com a intenção de baixar os aplicativos da pegação em outra praça.

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A destemida soteropolitana fez a festa no final de semana passado em São Paulo: “três homens, com direito a um incrível e dois mais ou menos”, conta. O mais louco: o tal do macho incrível era um novo baiano que passeava sob a garoa. “Irene ri, Irene ri”, diz ela, brincando com o seu apelido emprestado da canção do conterrâneo Caetano.

As Irenes do Tinder têm motivos de sobra para dar suas risadas. Mesmo quando o desapego deixa alguma ressaquinha moralizante –está para nascer uma criatura à prova total de culpa, sempre fica uma zoeira cristã no juízo, um INRI tatuado no inconsciente maluco. As Irenes, no entanto, riem, se divertem mesmo.

Enquanto isso, na fila do amor... Olhares baixos, homens e mulheres fingem que não é com eles, mascam o papelzinho da senha no canto da boca, demoradas senhas dificilmente piscadas no painel de atendimento. Essas estranhas figuras que ainda acreditam e querem algo mais sólido do que o pinga-pinga do amor líquido.

Enquanto Irene ri, o tempo passou na janela e só Carolina, para variar, não viu. Carolina e seus zolhinhos tristes na fila de um quase impossível amor. Como dizem os mineiros, menina Carolina, o trânsito “garrou”. Engavetamento geral na avenida Afonso Pena, BH, hora do rush, José para onde?

Outdoor da Lili

Óbvio que vocês leram aquele caso, nesta semana mesmo, da Lili, a ex, a exemplo da tirinha genial, sexy e vingativa de Caco Galhardo na Folha. O amor está nas coincidências. Lili, no episódio da vida real, é aquela mulher que exibiu, em um outdoor em Juazeiro do Norte, terra do mitológico padre Cícero, os seguintes dizeres:

"Sérgio, suas escolhas destruíram nossos sonhos de vivermos juntos. Agora tenho outro no lugar".

Muita gente, inclusive o pessoal do serviço de publicidade, jura que se trata de uma bela vingança com o canalha que pisou na bola, não seria um golpe publicitário, como a gente sempre suspeita nessas ocasiões.

Esse “tenho outro no lugar”, cá entre nós, é que não me convenceu muito. O urso do tipo ostentação, o cara que, na pisada macia, fez a fila do amor de Lili andar lindamente, não me pareceu tão crível. Tomara que eu esteja cronicamente errado.

A maioria das pessoas, no badalo das redes sociais, vibrou com a atitude de Lili. Tomara Deus que seja isso mesmo realidade. Desconfio, porém, de uma chantagem pública. Um blefe. Muitos homens só reagem e voltam a amar loucamente uma ex depois de um chifre anunciado. Só o chifre humaniza o macho.

Muitos homens só reagem e voltam a amar loucamente uma ex depois de um chifre anunciado. Só o chifre humaniza o macho

Cabras bíblicos e pródigos retornam ao lar doce lar com o tesão de outrora e o rabinho entre as pernas. Viram, se transformam em uma espécie de corno-goteira -aquele que espera, debaixo da tempestade, a mais torrencial das chuvas passarem para ter direito a se abrigar de novo sob o mesmo teto.

No que indago Lili, a ex de Juazeiro: se está satisfeita assim com o novo amor, por que ainda pensar no desalmado, o traste-das-costas-ocas que ficou no retrovisor da estrada? Por que dizer tudo como se o mundo a quisesse ouvir?

Será que Lili viveu o luto amoroso antes de pegar a senha na fila? Sem luto amoroso não há cura de um amor que doeu pra cacete. Lili, me escreva, Lili, me conte tudo. Talvez Lili tenha sido muito humilhada publicamente e, por que não?, agora deu seu justo e possível troco.

Foi a tartarugosa fila do amor que andou, Lili?

A sempre sábia dona Maria do Socorro, que mora a menos de 2 km do barulhento outdoor juazeirense, me disse ontem à noite por telefone:

“Safadeza, meu filho, ela só quer voltar para o outro ou fazer propaganda de alguma besteira que essa gente mais besta ainda compra, esse povo só pensa no shopping.”

Donde Maria do Socorro vem ser a minha santa mãezinha, viva meu freudiano Cariri, região, ventre e juízo de origem. E aí está outra fila que não anda: ter Complexo de Édipo por uma mãe alheia é uma tremenda safadeza. Prefiro não inventar essa moda, né? Mãe, te amo, só te amo.

Xico Sá, escritor e jornalista, é autor do romance “Big Jato” (Companhia das Letras) e comentarista dos programas “Papo de Segunda” (GNT) e “Extra-Ordinários” (Sportv).

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