COI suaviza os temores iniciais sobre a organização da Rio 2016
Para Comitê Olímpico Internacional, equipe mostrou "estar com a situação sob controle”
O ambiente no Brasil mudou bastante desde que, em abril de 2014, às vésperas da Copa do Mundo de futebol, o vice-presidente do Comitê Olímpico Internacional, John Coates, reclamou que os preparativos dos Jogos Olímpicos e Paralímpicos de 2016 eram “os piores” que ele já viu. Na época, vazou a existência de um suposto plano B (a repetição dos Jogos em Londres) se as obras previstas na Cidade Maravilhosa não terminassem a tempo. A Copa foi um sucesso inesperado de organização.
Faltando pouco mais de um ano e meio para a realização dos primeiros Jogos Olímpicos sul-americanos, os dirigentes e federações internacionais suavizaram sua postura ao ponto do próprio Coates dizer que os preparativos estão “bem melhores” e o COI, após constatar um “inverno bem sucedido”, afirma que “a equipe do Rio demonstrou claramente estar com a situação sob controle”.
A sombra do 'caso Petrobras'
Os Jogos Olímpicos e Paralímpicos do Rio pretendem melhorar a reputação internacional do Brasil. “Esse deve ser o uso geopolítico”, afirma o prefeito Paes, para quem o cumprimento dos custos estipulados se transformou em uma “obsessão”. Seria uma novidade: basta relembrar que os Jogos Pan-americanos realizados no Rio em 2007 estouraram o orçamento estipulado em 500% e que vários estádios construídos para a Copa do Mundo custaram três vezes mais do que o previsto.
As promessas de transparência são afetadas pelo gigantesco escândalo de corrupção que afeta a maior empresa do país, a petrolífera estatal Petrobras, no qual alguns dos maiores empresários construtores do país encontram-se processados e presos. Não existem, até agora, indícios de fraudes ou subornos nos projetos olímpicos, apesar de algumas empresas incluídas na Operação Lava Jato (Andrade Gutierrez, Queiroz Galvão e OAS) estarem executando obras de infraestrutura para os Jogos. O mesmo acontece com a gigante construtora Odebrecht, uma das empresas que mais cresceram na última década, já na mira pelos atrasos e superfaturamentos de alguns estádios da Copa do Mundo.
Agora, o maior temor das autoridades é que, dependendo da evolução da investigação, as construtoras implicadas percam a chamada “idoneidade” para fechar contratos com o setor público, o que causaria a paralisação de obras.
O hiperativo prefeito do Rio, Eduardo Paes, sustenta que o estouro de abril foi “uma crise de pânico artificial, de desconfiança com o Brasil” e destaca, em entrevista para este jornal, que o COI “tem uma sensibilidade política muito maior do que a FIFA”. “A FIFA se importa com os estádios, os hotéis e os voos. O COI é diferente. Nossa candidatura ganhou pelas mudanças que faria na cidade. Se não acontecerem, o objetivo não foi cumprido. [...] Temos conflitos permanentes, mas eu gosto muito do COI” afirma o prefeito. A cidade, que segundo Paes quer superar até mesmo Barcelona 92 como exemplo de legado urbanístico, experimenta uma profunda transformação que irrita o cidadão comum. O centro parece uma escavação arqueológica. As obras do metrô congestionam os bairros de Ipanema e Leblon. O tráfego é um inferno durante grande parte da semana. “Sou obcecado pelos prazos”, reconhece Paes, que (brincam alguns operários) mantém “no chicote” três turnos de trabalho diários para cumprir com as datas prometidas.
“Mais do que ter mal-estar, faltava informação para o COI”, afirma Roberto Ainbinder, diretor de projetos da Empresa Olímpica Municipal, durante uma visita ao futuro Parque Olímpico. As obras do Parque Deodoro, onde serão realizadas nove provas esportivas, estão finalmente nos eixos depois de um atraso assombroso em sua licitação e têm previsão de entrega para o último trimestre de 2015. Só o velódromo está com um atraso de três semanas, em relação aos planos. As 52 obras projetadas têm data de entrega entre setembro de 2015 e junho de 2016 (Os Jogos começarão em 5 de agosto). O orçamento final parece fechado em 37,6 bilhões de reais, sendo que a metade será paga pelo setor privado.
A nomeação de um novo ministro dos Esportes no segundo Governo de Dilma Rousseff prometer ser um novo e inesperado viveiro de conflitos. A escolha do pastor evangélico George Hilton (apresentador de tevê, além de teólogo) de 43 anos, enfureceu numerosos setores esportivos. A organização Atletas pelo Brasil (que reúne, entre outros, Dunga, Oscar Schimdt e Rubens Barrichello) acusou Rousseff de utilizar o cargo meramente para “escambos políticos” e critica a escolha de ministros que não têm “familiaridade” com o esporte.
As reticências de Grael estão muito relacionadas com um dos maiores problemas do Rio 2016: a poluição da Baía de Guanabara, onde serão disputadas as provas de vela, remos e natação em águas abertas. “A qualidade da água é péssima. Existem muitos dejetos e peixes mortos. Fico com um pouco de medo em navegar aqui e ter problemas de saúde”, afirmou recentemente para a agência Swissinfo o velejador suíço Yannick Braulic. Dezembro, além disso, trouxe também a notícia do aparecimento na Baía, em plena praia do Flamengo (que já é um local contaminado), de uma superbactéria resistente a antibióticos chamada KPC, detectada habitualmente em resíduos hospitalares, que pode causar problemas urinários, gastrointestinais e pulmonares. Durante suas duas semanas de treinamento no Brasil, Yannick Braulic disse ter tido febre e diarreia por alguns dias e assegura que o mesmo aconteceu com outros atletas. “Sinto falta dos lagos limpos de casa”, disse seu companheiro Romuald Hasser. “A água é imunda”, completa seu compatriota Matias Bühler.
O comitê organizador criou uma equipe especial para lutar contra a superbactéria, mas é bem improvável que cumpra a promessa feita na candidatura olímpica de limpar 80% dos dejetos presentes (de animais mortos à móveis, bicicletas e todo tipo de resíduos orgânicos que fluem livremente para o mar nessa cidade de 6,5 milhões de habitantes).
Todos os principais responsáveis pelos Jogos consultados durante 2014 por este jornal destacaram constantemente as “dificuldades” inerentes à organização do maior evento esportivo do planeta. O prefeito Eduardo Paes, apesar de assegurar que “a situação está controlada”, admite que nunca está tranquilo.
Críticas aos horários noturnos
Pela primeira vez na história dos Jogos, alguns atletas competirão à meia-noite. Serão os nadadores e os jogadores de vôlei de praia, cujas sessões começarão às 22h (algumas partidas de vôlei de praia estão marcadas para meia-noite, na praia de Copacabana). O plano apresentado pelo COI, concebido para maximizar a audiência televisiva nos Estados Unidos, recebeu críticas de diversos países. O horário da natação tem sido chamado de “ultrajante” pelo técnico da equipe inglesa Jon Rudd. “É uma falta de respeito com os atletas, o evento e o que a Olimpíada significa”, afirmou.
O vice-presidente do COI, John Coates, afirmou em novembro que os horários impunham uma “exigência não razoável” aos atletas, ainda que posteriormente tenha recuado e assegurado que era hora de “aceitar os horários noturnos das finais no Rio e continuar trabalhando” após não conseguir a adesão de norte-americanos e canadenses em seus protestos. Os horários anunciados se ajustam à cobertura noturna da rede de televisão NBC, que tem os direitos exclusivos de retransmissão, e casam bem com a tradição brasileira de transmitir eventos esportivos tarde da noite.
As finais do atletismo no Rio serão no período da manhã, pela primeira vez em 28 anos, de acordo com o mesmo argumento de visibilidade internacional. Isso também não foi bem aceito na Austrália pela campeã olímpica e multi-recordista mundial de natação Libby Trickett.
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