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Um passinho, muitas caretas e seis milhões de cliques

Dois jovens da periferia de São Paulo ficam famosos com o Passinho do Romano, um funk que intercala passos frenéticos com movimentos de um robô em câmera lenta

O funkeiro Fezinho Patatyy,, em sua casa em São Paulo.
O funkeiro Fezinho Patatyy,, em sua casa em São Paulo.BOSCO MARTÍN

Uma coreografia que intercala passos frenéticos com imitações de robôs em câmera lenta mudou radicalmente a vida de dois adolescentes da periferia da zona leste de São Paulo. Em menos de dois meses, esses dois jovens passaram de estudantes a celebridades da Internet com o Passinho do Romano, uma dança ao som de funk que dificilmente é repetida da mesma forma. O vídeo que um deles postou no YouTube já teve mais de 6,8 milhões de visualizações.

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Antes de terem centenas de fãs Pedro Felipe de Jesus Dias, de 18 anos, e Higor dos Santos, 14, sonhavam ser jogadores de futebol. Agora, com nomes novos, ambos pensam em investir na carreira artística. Dias é o dançarino que na laje de sua casa, com uma parede suja ao fundo, tornou a dança famosa. Agora, ele assina Fezinho Patatyy. Santos é um dos que se autodenomina autor da música, hoje ele é MC Crash. Há ainda um terceiro jovem, também de 18 anos, que diz ser o autor do funk, o MC Dadinho, do Rio de Janeiro.

O sucesso da dupla, que já foi desfeita por desentendimentos nos rumos da carreira, se deve a um apaixonado por música que não colheu as glórias de sua criação. Geovani do Divino Silva, conhecido como Magrão, adorava funk e fazia suas próprias coreografias nos bailes a céu aberto do Jardim Romano. Antes de patentear a sua dança, porém, ele morreu. Tinha 34 anos quando foi vítima fatal de um acidente de moto no fim do ano passado. O nome da música era para ser passinho do Magrão, mas como ele a dançava sempre nos bailes de rua do Jardim Romano, bairro pobre da zona leste paulistana, a comunidade local a adotou.

“Eu tinha visto o Magrão dançar uma vez e, no começo, só achei engraçado. Achava que ele era meio maluco. Mas depois olhei melhor e vi que a dança era interessante, resolvi imitar e gravei um vídeo”, diz Patatyy, que escolheu esse apelido porque era fã dos palhaços Patati Patatá.

A gravação chegou na Internet em maio e, desde então, nem o dançarino nem o cantor tiveram a mesma vida. Já participaram de programas de TV, deram autógrafos e não param de tirar fotos com fãs e curiosos. No domingo passado, por exemplo, Patatyy foi acordado por 20 meninas que diziam ser suas fãs. “Fiz cinco shows na madrugada de sábado para domingo e, de manhã, minha mãe veio me acordar com um monte de menina. Foi um baita susto. Elas eram do meu fã clube, me deram camisetas e fizeram fotos comigo na cama.”, disse o jovem.

O sucesso da dupla, que já foi desfeita por desentendimentos nos rumos da carreira, se deve a um apaixonado por música que não colheu as glórias de sua criação

Sim, ele já tem fã clube, com página na Internet e meninas enlouquecidas por um rapaz magricelo com bastante molejo e o apelido gravado no novo penteado.

A rotina de Crash não é tão diferente, enquanto conversava com a reportagem, havia dez pessoas no portão da casa dele querendo tirar fotos com a jovem celebridade. “Todo dia é assim. Nunca imaginei que teria tanto sucesso, mesmo cantando desde os meus dez anos”, afirma o MC, que foi proibido pela mãe de abandonar o ensino médio. “Se eu deixar a escola, ela me mata. Ainda quero fazer uma faculdade de Contabilidade ou Arquitetura, mas vamos ver”.

Simplicidade e sonhos

As casas onde ambos vivem é simples. Têm algumas improvisações e várias pessoas dividindo uma mesma habitação. Até o mês de maio quem botava a comida na mesa era exclusivamente a mãe de cada um. A de Crash é metalúrgica e a de Patatyy, autônoma. Hoje, a maior parte das rendas das famílias vem do trabalho dos jovens. O show de cada um deles dura meia hora e custa de 2.000 a 5.000 reais (depende da localização ou se o contratante fecha um pacote). No princípio, faziam as apresentações juntos. Mas se separaram porque Crash queria um novo empresário. Patatyy ficou com os antigos.

E como são as apresentações agora? “Fico meia hora cantando o Passinho do Romano, cada hora com uma adaptação diferente”, diz o MC, que tem dois novos dançarinos o acompanhando e gravou seu primeiro clipe na ultima sexta-feira. “Vai ser um sonho. Ainda mais ao saber que será produzido pelo KondZilla”, afirma ele se referindo a um dos principais produtores de funk em São Paulo.

Quando estou no palco eu só não posso olhar para as pessoas. Preciso me concentrar na dança, senão minha timidez me trava"

Fezinho Patatyy

Já Patatyy recebeu o convite para cantar, mas diz ser muito tímido e, por isso, prefere agitar os bailes. “Danço de tudo um pouco, black music, axé, tudo que anima a galera. Quando estou no palco eu só não posso olhar para as pessoas. Preciso me concentrar na dança, senão minha timidez me trava”, afirma o bailarino, que usa um som mecânico para se apresentar. Nos próximos meses, ele pretende se unir ao MC Dadinho, o outro funkeiro que se denomina compositor da música viral.

Juntos ou separados, o dançarino e o MC só querem aproveitar a fama repentina e, quem sabe ganhar um trocado para pintar a parede da laje, reformar um dos cômodos e, em breve ostentar as grossas correntes e anéis de ouro que muitos funkeiros costumam usar.

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