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CAMPEONATO ESPANHOL | BARCELONA x ATLÉTICO DE MADRI

O Atlético enaltece o “sí, se puede”

O time madrilenho, com infinita paixão e boas doses de futebol, conquista o título espanhol após uma temporada colossal, tendo como auge, até agora, outro momento épico no Camp Nou

José Sámano
Os jogadores do Atlético levantam Simeone.
Os jogadores do Atlético levantam Simeone.alejandro ruesga

Um comboio de bravos liderado por esse Espártaco que é Simeone acabou com a plutocracia do futebol espanhol, onde Barça e Real Madrid impuseram durante exatamente uma década tanto sua fidalguia como o fundamentalismo financeiro imperante. Com sua décima Liga, certificada em Barcelona (1 x 1) com paixão infinita e boas doses de futebol, o Atlético constatou que é possível improvisar a glória, enaltecendo esse hino quixotesco que para muitos parecia ser o “sí, se puede” [“pode-se, sim”].

Foi uma trilha emotiva para o time alvirrubro, um maiúsculo ato de fé. A caminho da sua segunda final do Campeonato Europeu, a travessia do Atlético é colossal, não só pelo que foi conquistado, mas pela barreira himalaica imposta pelo destino: há um ano conquistava a Copa do Rei na casa do Real Madrid; neste sábado precisou jogar a decisão da Liga no campo azul-grená, com dois pretorianos como Diego Costa e Arda lesionados antes da meia hora de jogo, e um golaço de Alexis para o Barça, empatado depois por Godín. Uma conquista que desbanca Barça e Real Madrid pela primeira vez desde o Valencia em 2004, o que amplia o valor da vitória colchonera.

O gol do barcelonista Alexis retratou esse Barça terreno que aponta para apagar tudo e começar de novo: restam-lhe apenas episódios impossíveis, como esse chutaço do chileno ou sua vitória pela Liga no Santiago Bernabéu. O Barça celestial havia feito o impossível com a infinita sucessão de êxitos possíveis. Não há ficção para este Atlético transformado em um depósito sentimental, que se livrou de todas as feridas, um grupo de mosqueteiros em que foram um por onze, e onze sempre foram um. Até o Camp Nou rendeu homenagem à apoteótica equipe alvirrubra: glória.

O Barça foi incapaz de fazer em 90 minutos o que não fez em nove meses

Para o Barça não houve emenda para seu caminho mumificado. A Liga, à qual tinha dado as costas com churrascos e festas fora de hora, não o redimiu, não serviu como subsídio para o seu abandono dos últimos tempos. O título teria significado uma taça para o Barça menos Barça da era Messi, de contrato renovado para liderar, supõe-se, uma contrarreforma. Do outro Barça, aquele que extasiava como poucos ao longo da história, fica seu maravilhoso testamento, o de uma equipe póstuma. Diante do Atlético, contra quem não pôde em seis partidas, foi incapaz de fazer em 90 minutos o que não conseguiu em nove meses. O furor, como o que teve na parte final da partida, não o distingue. Agora é o time da singularidade, do futebol sem aditivos, e ante os homens de Simeone evidenciou pela enésima vez que é somente uma imagem do que foi.

Prenunciava-se um duelo de divã, uma guerrilha mental entre a vertigem para o sucesso do Atlético e o medo do fracasso de um Barça nas últimas, e na frente dos seus. Nem com a ajuda da torcida o grupo azul-grená teve chances, vencido que foi por um timaço coral, que encarou os barcelonistas e em vários momentos da partida os dominou. Alguém dirá que faltam aos colchoneros celebridades que enfeitem as manchetes nesse esporte em que os camarins costumam primar sobre os vestiários. Mas por seu caminho, à sua maneira, o Atlético foi o melhor, o mais inquebrantável. Com esse ar de charlatães que têm os seus jogadores, todos souberam se virar diante dos grandes, fossem eles o Real Madrid, o Barça ou o Chelsea.

Todos os alvirrubros são agora melhores do que ontem, e juntos puderam com rivais enormes

Não é fácil saber o que fazer a cada momento, mostrar o caráter necessário para não ser atropelado pelas individualidades dos grandes, fomentar o coletivo acima de tudo, explorar as melhores aptidões – o empate de Godín foi o 12.º gol de bola parada –, fazer com que, diante dos rivais de maior peso, cada ataque se torne um filme de terror, manter o vigor físico de agosto a maio.

Todos os jogadores alvirrubros são agora melhores do que ontem, e juntos eles conseguiram condenar gênios como CR ou Messi. Isso é futebol também, um jogo em que “sentir” – algo que o Barça já não tem, e o Real quis administrar além da conta – é primordial. E o Atlético, junto com a sua torcida, foi uma pulsação perpétua, partida a partida. Por isso, a partir da subversão, a sua história acabou sendo uma ode à felicidade, maior ainda se possível que o do duplo título de 96. A proeza é anda maior. E resta a estação de Lisboa. Assim é este Atlético, o Hamelin de todos aqueles que acreditavam que no futebol não se pode sonhar. Que perguntem em Sevilla, no Eibar ou no Calderón. Pode-se, sim, claro que pode. Um brinde ao Atlético.

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