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O Brasil adota pragmatismo para retomar a credibilidade no mercado

Depois de ajustar preços da Petrobras, Governo avisa que deixará de lado a contabilidade criativa para reconquistar a confiança dos investidores

Carla Jiménez

A poucos dias de terminar 2013, e de dar início a um ano eleitoral, o Brasil começa a adotar uma postura mais objetiva para contornar os principais focos de tensão na economia. Em compasso de espera para os efeitos que a decisão sobre a política monetária dos Estados Unidos, a ser definida nesta semana, pode trazer ao país, o Governo vem dando vários sinais de que pretende responder à ansiedade do mercado – e a seus opositores na corrida eleitoral – sobre questões cruciais que lotaram os ouvidos da equipe do Governo Dilma Rousseff de críticas à condução da economia.

Em entrevista neste final de semana ao jornal O Estado de S. Paulo, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, disse, por exemplo, que o superávit fiscal (receitas menos despesas do Governo), que foi cumprido nos últimos anos por meio do que foi batizado de “manobras contábeis” – a inclusão de recursos futuros na equação do resultado primário, ou triangulação de recursos entre instituições públicas – não seguirá mais esse receituário. Mantega admitiu que, embora estivesse dentro da lei, ficava confuso para o mercado, e agora a ordem é que uma transação deve não só ser, mas parecer correta. Tal qual a mulher de Cesar.

Semanas atrás, foi a vez de a Petrobras ajustar seus preços, depois de quase um ano sem correção, porque o Governo estava preocupado com os efeitos que essa alta poderia trazer aos índices da inflação. Diante da ambição de a estatal cumprir um plano de negócios bilionário, os preços foram reajustados no final do mês passado, ainda que numa dose menor do que a necessária.

Os ajustes na política econômica são notórios e a percepção é de que a equipe de Rousseff não tem tempo a perder. “Há um pragmatismo voltando”, avalia Zeina Latif, sócia da Gibraltar Consulting.

A notícia poderia soar como música para os ouvidos dos investidores, mas chega com atraso. Para muitos analistas, o Governo estendeu demais a política de incentivo ao consumo de bens duráveis (carros e eletrodomésticos, principalmente), além de subsídios para alguns setores em dificuldades. Foi uma estratégia que mirou a preservação do emprego, um grande trunfo para ficar bem com os eleitores. Somente durante a administração de Rousseff, foram gerados mais de 4 milhões de postos de trabalho com carteira assinada.

Isso explica por que os índices de popularidade da presidenta Rousseff estejam indo bem, e ela lidere as pesquisas eleitorais. O último levantamento do instituto de pesquisa Ibope mostra que 56% da população aprova sua maneira de governar.

Os mercados, porém, e a iniciativa privada não têm a mesma avaliação sobre seu modus operandi. Esse grupo pode não representar um grande número de votos, mas são decisivos para manter a estabilidade da economia, e para aumentar os investimentos que, no longo prazo, são o caminho mais saudável para garantir empregos. A taxa de investimentos em relação ao PIB ainda é de 19,1%, muito abaixo da meta proposta por Rousseff em 2010, quando ainda era candidata, de alcançar os 24%. A da China, por exemplo, ultrapassa os 45%. Com a demanda em alta, e oferta em baixa, o país fecha essa equação com a importação de bens e serviços.

Como resultado, o PIB brasileiro continua à mingua, com queda de 0,5%, no terceiro trimestre deste ano, embora possa superar os 2% em 2013. Nem mesmo a potencial retomada nos últimos meses do ano tira o mau humor residual que esse resultado deixa. “É um número medíocre”, diz Luiz Eduardo Assis, do banco ABC, ex-diretor do Banco Central.

Trata-se de uma avaliação unânime. Embora o país tenha gerado milhões de empregos, e se mantenha um otimismo com o futuro entre os brasileiros, há no Brasil, e no mundo, uma espécie de viuvez do ano de 2010. Foram 12 meses excepcionais naquele período, quando o país cresceu 7,5%, em meio à crise global que se aprofundava na Europa e nos Estados Unidos. Era o tal crescimento chinês num país subdesenvolvido, com um certo gosto de revanche depois dos anos negros da economia brasileira nos anos 80 e 90, enquanto os países ricos nadavam confortáveis em seus modelos de estabilidade e expansão contínua.

Pois 2011 e 2012 vieram e a expansão de 2,7% e 0,9%, respectivamente, decepcionou. O fato é que 2010 havia deixado a impressão de que o Brasil tinha finalmente encontrado o caminho do gol para deixar para trás todas as suas mazelas. Mas, a verdade é que somente quem olhava de binóculos para o país, principalmente do exterior, poderia ter acreditado que todos os problemas brasileiros seriam resolvidos em curto espaço de tempo. De perto, era fácil enxergar que os tais 7,5% eram fruto de uma recuperação do tombo de 0,2% do ano anterior, e de uma sobredose de estímulos ao consumo, sem fundamentos necessários para sustentar esse voo acelerado.

“Ainda estamos muito longe do que precisamos. Não temos fôlego para alcançar 22% ou 23% de taxa de investimento, nem para crescer 4% ao ano”, avalia Claudio Frischtak, da consultoria InterB. “A menos que você queira voltar ao processo inflacionário”, completa. Em outras palavras, quem “comprar” o Brasil tem de assimilar a ideia de que o país continuará crescendo, mas a passos lentos, embora contínuos.

E o ano de 2013 deixou claro que com inflação não se brinca no Brasil. O país tem ainda introjetada a memória dos reajustes aleatórios – se a loja ao lado aumenta em 10% seus preços, o vizinho aumenta em 15% - que vigorou até 1994. E, nesse sentido, o Governo Rousseff foi bem intencionado, ao querer se desfazer do título de país com os maiores juros do mundo, que encarecem o crédito para o consumidor e o setor privado. Por isso, partiu numa cruzada pela queda de juros, que saíram de 12,50% em julho de 2011, e foram caindo gradativamente até ficar em 7,25% em outubro de 2012.

Os juros se mantiveram nesse patamar até abril de 2013, mas àquela altura o dragão inflacionário rugia alto e a inflação de 12 meses já ultrapassava o teto da meta de 6,5%. Foi preciso elevar as taxas novamente, que voltaram ao patamar de dois dígitos em novembro, com o incômodo título de maiores do mundo, quando o Banco Central elevou os juros a 10%. A inflação oficial, ao menos, arrefeceu, e deve fechar abaixo dos 6% neste ano.

“Se bobear, voltamos com a inflação”, afirma Frischtack. Não se trata de uma defesa pelos juros altos, como alguns integrantes do Governo alardeiam, pois de fato, muita gente ganhava dinheiro fácil nos tempos das taxas na alturas, apenas aplicando em papeis do mercado financeiro. Porém, é uma realidade que funciona como um vírus internalizado no DNA dos brasileiros, que lembra até o alcoolismo. Não se pode dar o primeiro gole ou todo o sacrifício para deixar de beber é desperdiçado.

O mesmo vale para todos os fundamentos da economia, como os ruídos em torno do superávit primário, o controle da inflação e da administração dos gastos públicos. “É muito mais fácil perder a credibilidade do que ganhá-la”, completa o economista da InterB. A equipe de Rousseff corre para corrigir a rota do seu Governo. Se for premiada com a reeleição, terá mais quatro anos para reconquistá-la.

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