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Último estudo de Stephen Hawking mostra que buracos negros gravam informações

Cientista britânico tentou resolver um problema da física que o havia perseguido durante metade da vida

Nuño Domínguez
Stephen Hawking em seu escritório em Cambridge, em 2011.
Stephen Hawking em seu escritório em Cambridge, em 2011.AFP

Até poucos dias antes de morrer, Stephen Hawking trabalhou na resolução de um dos maiores problemas da física. Agora estão sendo publicados os resultados dessas investigações, que são o último estudo assinado pelo célebre cientista britânico.

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O trabalho centra-se no chamado paradoxo da informação. Em 1974, Hawking defendeu ideia de que qualquer objeto que cair em um buraco negro desaparece para sempre e nada da informação que possa haver em seus átomos sobrevive. Nos últimos anos, Hawking percebeu que estava equivocado. O problema da informação perdida poderia ter solução. Ao lado de Andrew Strominger, da Universidade de Harvard, e de seus colegas da Universidade de Cambridge Sasha Haco e Malcolm Perry, Hawking começou a trabalhar em uma solução em 2015. “Trabalhamos durante18 meses nesse estudo. Ele não podia mais escrever, mas nos oferecia sua intuição, nós fazíamos os números, os líamos para ele e ele nos guiava”, explica Haco, que começou a trabalhar com Hawking há três anos. O estudo defende que no horizonte de eventos, o ponto para além do qual não há possibilidade de escapar da atração da gravidade do buraco negro, existem partículas que funcionam como um gravador e retêm informações sobre os objetos que são engolidos por esses corpos.

“As leis da mecânica quântica determinam que a informação nunca pode desaparecer. Se você queima um livro, embora o texto desapareça, usando as leis da mecânica quântica você poderia recompô-lo a partir das cinzas”, explica Haco. Este estudo é o terceiro de uma série em que a equipe tentou “encontrar um ponto fraco na teoria da perda de informação”. Neste terceiro estudo “explicamos como se podem recuperar informações sobre a entropia de um buraco negro, que é uma medida da informação nele contida, algo como a quantidade de bits que compõem um computador ou, neste caso, um buraco negro”, explica Haco.

A teoria da relatividade de Einstein previu a existência de buracos negros e assume que podemos conhecer apenas três coisas deles: sua massa, sua carga e seu sentido de rotação. A teoria de Hawking e seus colegas é que essas partículas nas proximidades do horizonte de eventos armazenam outras informações, ou seja, existem mais coisas que sobrevivem a um buraco negro. Essa informação ficaria armazenada em certas partículas. “Nós as chamamos de partículas macias, ou dizemos que os buracos negros têm cabelo macio [soft hair, em Inglês]”, comenta Strominger, referindo-se à citação de John Wheeler, que disse que “os buracos negros não têm cabelo”, o que significa que só as três características previstas pela relatividade podem ser medidas e o resto das informações simplesmente desaparece. Em inglês, soft significa leve e também macio.

“[Hawking] estava convencido de que já tínhamos todas as peças do quebra-cabeça e que poderíamos resolver o problema”

“Em um dos dois estudos anteriores postulamos que as partículas que retêm informação são fótons [uma partícula que não tem massa] e neste último exploramos que sejam grávitons [uma partícula teórica responsável por produzir gravidade no mundo quântico das partículas elementares]”, diz Strominger. “Por enquanto, não sabemos se isso realmente acontece, mas fornecemos importantes provas teóricas de que isso pode acontecer. Esse problema está relacionado com outro muito maior, pois resolvê-lo permitiria unir a gravidade, a mecânica quântica e a termodinâmica, a unificação da física moderna. Se você não resolver esse problema, as leis da física são inconsistentes, é como se tivéssemos um enorme buraco negro no nosso conhecimento do universo”, enfatiza.

Detectar grávitons e outras partículas suaves em buracos negros é muito difícil para os instrumentos existentes, observa o físico norte-americano, mas há outras experiências em andamento que poderiam detectá-las se passarem pelas proximidades da Terra, como, por exemplo, o interferômetro de laser LIGO, nos EUA

Strominger e Haco lembram que Hawking continuou envolvido no trabalho até a semana anterior à sua morte, em março deste ano. “Ele estava convencido de que já tínhamos todas as peças do quebra-cabeça e que poderíamos resolver o problema. Eu sou mais cauteloso, acho que conseguiremos dentro de uma década e ainda vamos publicar mais estudos sobre este assunto, embora este seja o último a ter a assinatura de Stephen”, conclui Strominger.

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