Somos todos ‘especialistas’: a era de ouro dos palpiteiros olímpicos
Comediante mexicano faz sucesso parodiando a forma como falamos sobre esportes
Segue uma crítica do estilo esportivo de Michael Phelps: "Um dos segredos da natação está no ombro. Por isso eu nunca me arrisquei muito, com minhas costas não dá… Tenho mais corpo de ginasta. Mas esse Phelps é um torpedo, hein?". Dos saltos ornamentais: "O lance é cair sem espirrar muita água. Tá vendo? Esse aí espirrou muito, 300 ou 400 ml, é uma espirrada média. Acho que vão dar um 6. Bom, deram 8. Quase, errei por só dois pontos". Da esgrima: "É um esporte muito legal. Eu gostava muito e até fiz umas aulas, mas não conseguia lidar com isso de usar máscara. Eu me sentia preso. Não conseguia respirar bem". Dos 100 metros rasos: "São a mãe de todas as provas". Do tênis de mesa: "E isso, o que é?". De ginástica de trampolim: "Caiu mal. O importante é cair bem. Com os pés". Levantamento de peso: "Você lembra que outro dia estávamos carregando a geladeira e eu disse 'com os joelhos, com os joelhos?' Pois é, pra ele faltou fazer isso".
Após nove dias de Olimpíada, você certamente já viveu esta situação. “Todo mundo adora opinar, e nos tornamos eruditos do esporte”, diz o comediante mexicano Álex Fernández por telefone ao EL PAÍS. Uma dessas situações inspirou um vídeo dele no qual representa o típico telespectador de Olimpíada e seus palpites de aspirante a comentarista esportivo. O esquete, divulgado por ele no Facebook, já soma mais de 500.000 reproduções em uma semana.
Fernández, de 30 anos, largou sete anos de uma carreira em marketing para se dedicar à comédia. Garante que, nesse vídeo, ri de si mesmo. “Quando eu estava vendo a final de saltos sincronizados de 10 metros dava opiniões sobre os respingos e a inclinação do mergulho”, diz. “Eu me achava um dos juízes, mas estava era dizendo um monte de idiotices.”
Entretanto, o comediante notou que não era o único. “Mais tarde nesse dia, quando saí para almoçar, as pessoas ao meu redor estavam comentando sobre os saltos de trampolim, com opiniões muito parecidas. Mas onde mais se dá palpite é nas redes sociais. Esta Olimpíada é a primeira que acontece após a verdadeira explosão das redes, e isso significa que há mais opiniões. É isso que eu gosto nelas, que todos têm um espaço para opinar, e vira um galinheiro.”
Às vezes, entretanto, as opiniões podem passar do limite, segundo ele. “Para mim, não vale criticar os atletas mexicanos, é como ir a outro país e cuspir na embaixada do México”, diz Fernández. “É uma honra representar o seu país nos Jogos Olímpicos, e são 125 milhões de mexicanos que estão competindo. Também não é legal insultar as pessoas. Uma coisa é usar o humor, que é uma forma de refletir a realidade, mas não vale que alguém, que certamente é um gordo com barriga de cerveja, recrimine uma atleta por seu peso.”
Embora as redes sociais tornem isso mais evidente, os mexicanos sempre gostaram de dar palpites sobre tudo, diz o comediante. “Não só sobre esportes. Lembre-se da última reunião familiar à qual você compareceu: todo mundo dá sua opinião sobre qualquer assunto, é uma coisa cultural. Sempre fazemos juízos de valor, então gostamos de chamar a atenção”, comenta. “Certamente alguém no Twitter acredita que alguém no Comitê Olímpico Mexicano lerá o seu tuíte o convidará para ser juiz.”