_
_
_
_
TRANSPORTE URBANO
Tribuna
São da responsabilidade do editor e transmitem a visão do diário sobre assuntos atuais – tanto nacionais como internacionais

Os ônibus e a poluição em São Paulo

Quando discutimos modelo de concessão, não podemos impor tecnologias específicas

Trânsito em São Paulo.
Trânsito em São Paulo. Dado Galdieri/Bloomberg

A Prefeitura de São Paulo apresentou em junho último os modelos de ônibus que se integrarão ao novo sistema de transporte coletivo da cidade. A frota de veículos articulados crescerá e estes virão equipados com Wi-Fi, ar-condicionado, câmeras de monitoramento e tomadas para o carregamento de celulares. Esta frota estará vinculada ao novo modelo de concessão para o transporte por ônibus apresentado pelo prefeito Fernando Haddad para os próximos 20 anos. O prazo para consulta pública do edital expirou no último dia 31 de agosto.

As novidades compõem um aprimoramento importante no conforto dos veículos. Contudo, esta é uma oportunidade igualmente preciosa para se repensar a qualidade do sistema de transporte coletivo levando em conta a inserção mais sustentável desses veículos no meio urbano, reduzindo seus impactos ambientais locais.

Mais informações
“Carro mata mais que arma de fogo em São Paulo, e não é notícia”
Fim do assédio sexual e outros dez pontos para o “busão dos sonhos”
Por que você deveria prestar atenção na licitação de ônibus de SP
“Ciclovias na periferia são tão importantes quanto saúde e escola”

No ano de 2010, a Prefeitura iniciou o Programa Ecofrota. Seu objetivo primordial consistia em atender a Lei Municipal nº 14.933, de 2009, usualmente chamada de Lei das Mudanças Climáticas. Essa legislação estabelece que todo o sistema de transporte público da cidade de São Paulo deverá operar com combustíveis “renováveis”, até 2018, reduzindo em 10% o uso de combustíveis fósseis a cada ano. A estratégia adotada no programa Ecofrota procurou promover diversas tecnologias como biocombustíveis (biodiesel, etanol e diesel de cana-de-açúcar) e veículos elétricos (trólebus, célula combustível de hidrogênio, híbrido e bateria). Desse modo, buscava-se obter benefícios sinérgicos, com a redução tanto de poluentes quanto de gases de efeito estufa.

No entanto, passado mais da metade do prazo, a proposta, apesar da sua aparente atratividade ambiental e tecnológica, falhou ao se equivocar na estimativa dos tempos necessários para que essas opções tecnológicas se revelassem viáveis técnica e financeiramente. As metas anuais não foram cumpridas e, em abril de 2014, o Programa Ecofrota foi paralisado.

Há de se questionar a falta de continuidade das políticas a serem adotadas pela cidade. Não há razão para os novos ônibus da frota municipal, além de trazer maior comodidade e qualidade do serviço ao usuário, não possam também contribuir para a redução da poluição local e a mitigação das mudanças climáticas. A imposição de critérios ambientais mais estritos para os veículos, principalmente para aqueles que circularão nos corredores de maior densidade, pode induzir uma substituição dos atuais motores a óleo diesel de maneira gradual e factível, tanto nos aspectos ambientais quanto tecnológicos e econômicos. Este momento de substituição da frota e de proposição de um novo modelo de concessão é o ideal para “casar” a qualidade do transporte com a qualidade do ar.

Devemos evitar erros do passado de tentar impor tecnologias específicas. O foco da política pública deve se concentrar na definição dos critérios (internos e externos) a serem atendidos pelos veículos que poderão circular na cidade. Além disso, devemos evitar soluções simplistas e pouco justificáveis. Por exemplo, a Lei de 2009 exclui a possibilidade da utilização do gás natural em ônibus, pois fala, explicitamente, de promover “a substituição gradual dos combustíveis fósseis”.

Se levarmos em conta sua viabilidade técnica e econômica, o gás natural é, sem dúvida, a melhor solução para uso imediato nas grandes cidades brasileiras

Mas é importante notar que o gás natural tem sido utilizado em diversas cidades do mundo, contribuindo muito para a promoção do transporte sustentável, com significativas reduções nas emissões de poluentes. Se levarmos em conta sua viabilidade técnica e econômica, o gás natural é, sem dúvida, a melhor solução para uso imediato nas grandes cidades brasileiras, incluindo São Paulo e os demais municípios da região metropolitana.

Proibir o seu uso por lei, lamentavelmente, significa trocar o “sonho de ter tudo” pela “realidade de ficar com nada” no que diz respeito às urgentes questões ambientais que afligem as grandes cidades. A existência da Lei das Mudanças Climáticas de São Paulo é importante. Porém, suas atuais apostas tecnológicas inviabilizam o cumprimento das metas. Esse quadro precisa ser repensado. Não há mais tempo para transformar a metrópole em um grande laboratório de tecnologias nem sempre comprovadas. O uso do gás natural em veículos pesados atende a muitos critérios de sustentabilidade e suas vantagens ambientais podem ser usufruídas pela cidade no curtíssimo prazo.

Edmilson Moutinho dos Santos é professor e pesquisador do Instituto de Energia e Ambiente da Universidade de São Paulo – IEE-USP. Thiago Luis Felipe Brito e Rodrigo Galbieri são pesquisadores do mesmo instituto.

Tu suscripción se está usando en otro dispositivo

¿Quieres añadir otro usuario a tu suscripción?

Si continúas leyendo en este dispositivo, no se podrá leer en el otro.

¿Por qué estás viendo esto?

Flecha

Tu suscripción se está usando en otro dispositivo y solo puedes acceder a EL PAÍS desde un dispositivo a la vez.

Si quieres compartir tu cuenta, cambia tu suscripción a la modalidad Premium, así podrás añadir otro usuario. Cada uno accederá con su propia cuenta de email, lo que os permitirá personalizar vuestra experiencia en EL PAÍS.

En el caso de no saber quién está usando tu cuenta, te recomendamos cambiar tu contraseña aquí.

Si decides continuar compartiendo tu cuenta, este mensaje se mostrará en tu dispositivo y en el de la otra persona que está usando tu cuenta de forma indefinida, afectando a tu experiencia de lectura. Puedes consultar aquí los términos y condiciones de la suscripción digital.

Mais informações

Arquivado Em

Recomendaciones EL PAÍS
Recomendaciones EL PAÍS
_
_