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Um batalhão de advogados por uma mordida

Luis Suárez viaja à Suíça com especialistas contratados pelo Barcelona e pela federação uruguaia para tentar convencer o TAS de que a sanção da FIFA é “desproporcional e sem precedentes”

Jordi Quixano
Luis Suárez, durante sua chegada a Barcelona.
Luis Suárez, durante sua chegada a Barcelona.EFE

Três julgamentos em um. O Barcelona, a federação uruguaia e o atacante Luis Suárez apresentarão de forma independente —"mas com uma estratégia conjunta", explica o clube azul grená — sua causa contra a FIFA, que suspendeu o jogador por nove partidas pela seleção e o proibiu de pisar em estádios até o dia 26 de outubro. O órgão esportivo considerou que a mordida em Chiellini durante a disputa da Copa do Mundo este ano violou o artigo 48 do código disciplinar por agredir outro jogador, além do 57 por conduta antidesportiva em relação a um adversário. "Um castigo desproporcional e sem precedentes", é o que todos os advogados defendem, apesar de Suárez ser reincidente. São dois representantes de defesa por parte do jogador, outro do Uruguai e mais um para o Barcelona, que também pôs os serviços jurídicos do clube à frente do processo. Na manhã desta quinta-feira todos se reuniram na Avenida de Beaumont número 2 em Lausana (Suíça), onde fica a sede do Tribunal Arbitral do Esporte (TAS), que resolverá a confusão.

O Barça tem pressa. Por isso, quando Luis Suárez assinou com o clube, puseram mãos a obra para conseguir um procedimento descomplicado — um julgamento rápido — e não comum, que seria prolongado. Para isso, se chegou a um acordo com o árbitro da FIFA. "Isso foi um êxito porque para eles tanto fazia que o julgamento se estendesse", explica o time catalão; "assim como também foi um triunfo conseguirmos no mesmo dia a sanção cautelar em relação à pena de não contratação nos dois próximos semestres pela denominada contratação irregular de menores".

O motivo da aceleração do Barça é lógico. "Cada dia que o jogador [que veio do Liverpool por 81 milhões de euros – 248 milhões de reais – após o incidente] passa sem conhecer o grupo, sem absorver os conceitos do Barça, sem treinar nem competir, é um dia perdido. É necessário que o jogador exerça sua profissão”, defende o clube. O clube também quer, ao menos assim repetem funcionários de seus escritórios, que Luis Suárez possa ser apresentado no Troféu Joan Gamper (18 de agosto) devido a interesses econômicos e até mesmo para animar a torcida. "Por isso queremos conseguir o quanto antes uma resolução. Se não for nesta sexta-feira, que seja no máximo na próxima segunda-feira. Apesar de que são eles que decidem, claro".

O Barça pretende que Luis Suárez possa ser apresentado no Troféu Joan Gamper

Eles são três juízes porque, assim, o Barcelona solicitou, já que rejeitou ter um único rei Salomão e decidiu exercer seu direito de escolher seu defensor na causa, que é o advogado do TAS Luigi Fumagalli. "Mas o árbitro é independente e não é escolhido porque sabe que vai te dar razão, mas porque se conhece o seu perfil, se é mais moderado, benevolente, agressivo...", explica o clube.

O mesmo privilégio foi outorgado à FIFA, que escolheu um advogado suíço, enquanto o TAS designou o presidente do caso, também suíço, que é quem tem mais influência na decisão final. No entanto, nunca se revela se as resoluções foram unânimes ou por maioria, já que o TAS é tão zeloso em seus ditames, a ponto de não abrir os processos nem sequer para seus funcionários, a não ser que peçam expressamente a informação, justificando-a com um caso que têm em mãos que seja parecido ou esteja relacionado.

O caso Luis Suárez

24 de junho. Luis Suárez morde o zagueiro italiano Chiellini durante partida da fase de grupos da Copa do Mundo do Brasil. É a terceira vez que o jogador toma tal atitude durante jogos, depois de morder Bakkal em 2010, quando jogava pelo Ajax, e Ivanovic, do Chelsea, em 2012, na época em que defendia o Liverpool.

26 de junho. A FIFA sanciona o atacante com nove partidas internacionais e a proibição de exercer qualquer atividade vinculada ao futebol durante quatro meses, ou seja, até o dia 26 de outubro.

27 de junho. Óscar Tabárez, técnico da seleção do Uruguai, deixa a Comissão Estratégica da FIFA depois de saber da sanção imposta a Suárez. "Sinto que devo me afastar deste cargo. Não é prudente concordar com pessoas que pressionaram para promover esta sentença e que manejam critérios e valores muito diferentes dos meus", argumentou. O Uruguai anuncia que recorrerá da punição.

30 de junho. Suárez pede, publicamente, perdão a Chiellini por Twitter e Facebook. "Está tudo esquecido. Espero que a FIFA reduza a sua sanção", responde pouco depois o italiano.

11 de julho. O Barça torna oficial a contratação de Luis Suárez por cerca de 80 milhões de euros (244,9 milhões de reais).

13 de julho. Luis Suárez chega a Barcelona. A FIFA proíbe o clube azul grená de apresentar o jogador.

31 de julho. O Tribunal Arbitral do Esporte (TAS) marca com o jogador uruguaio para o dia 8 de agosto (hoje) para escutar suas alegações sobre o episódio da mordida em Chiellini. Espera-se que o organismo aplique o procedimento expresso, solicitado pela federação uruguaia, no qual a decisão pode ser conhecida em quatro dias. Se o TAS decidir aplicar medidas cautelares, o atacante poderá começar a treinar na semana seguinte até que o caso seja resolvido definitivamente. Se a sanção não for suspensa, ela expirará no dia 25 de outubro, um dia antes da data mais provável para a partida entre Real Madrid e Barcelona, que será disputada no estádio Santiago Bernabéu, em Madri.

Ontem, como costuma ser habitual, já que chegam de diferentes lugares do mundo, os três juízes certamente se reuniram para debater e trocar informações. Entre eles deve estar um conselheiro, uma espécie de secretário do TAS que é o coordenador do processo e que mantém o contato entre os advogados e juízes. Este, no entanto, não tem opinião, só atua como ouvinte. Assim, Luis Suárez — que viajou, ontem à tarde, à Suíça—, e os advogados da federação uruguaia e do Barcelona poderão expor seus argumentos esta manhã durante o tempo que quiserem, do mesmo modo que os juízes poderão perguntar tudo que acharem conveniente. "Este tipo de arbitragem não tem tanta formalidade como um julgamento. Há turnos, mas se pode falar e interromper", explica o Barça.

Cada um fará sua apresentação processual rapidamente. Mas, todos os advogados estão há algum tempo articulando uma estratégia conjunta, por mais que cada um defenda e persiga seus próprios interesses. A federação uruguaia solicitará a retirada da sanção de partidas que ainda restam, oito no total. O Barça pedirá que a pena de não poder entrar em recinto esportivo seja suspensa e, como não entendem que sua atuação no clube deva ser prejudicada quando a infração foi cometida durante partida pela seleção, pedirão que permitam que Suárez volte a competir. E a defesa do jogador juntará todos os argumentos; ele quer jogar, mesmo sabendo que agiu mal e que é reincidente, foi surpreendido pela amplitude da sanção.

"Do ponto de vista jurídico, o tema da suspensão da equipe é mais rebatível em comparação com a suspensão de partidas na seleção", expôs o advogado Alejandro Balbi, que viajou junto com Suárez, embora não seja o único advogado contratado pelo jogador, que conta ainda com José Juan Pintou, que também trabalha no TAS. "Acho que a sanção que afeta seu trabalho no clube vai ser revogada. Não há nenhum precedente na história para justificá-la", acrescentou Daniel Cravo, que representará a federação uruguaia. "Não nos aventuramos a dizer nada", afirmou o Barça, assessorado pelo advogado externo Jordi López Batet, especialista em direito esportivo.

À espera da resolução do TAS, em nenhum caso será dada uma suspensão cautelar porque ninguém a solicitou. "A decisão será definitiva", afirma o Barcelona; "e se o TAS confirmar a sanção em todos os seus extremos, será possível recorrer ao Tribunal Federal da Suíça como última instância. Mas não o queremos e acreditamos que não será necessário".

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