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“A resposta do PCC foi errada. Meu irmão não era de nenhuma quadrilha”

Mais dois corpos são achados em prisão de Roraima, anuncia Governo

Mulher chora a espera da lista de mortos
Mulher chora a espera da lista de mortosMarlene Bergamo (Folhapress)

O Governo de Roraima anunciou neste sábado ter encontrado mais dois corpos esquartejados que foram enterrados na ala da cozinha da penitenciária Agrícola de Monte Cristo, elevando para 33 o número de vítimas da chacina no presídio desde a madrugada da sexta-feira. Até o fim da tarde, peritos ainda apuravam a denúncia de parentes de presos de que mais duas ou três pessoas ainda estavam desaparecidas – nada foi encontrado.

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As autoridades locais também divulgaram uma lista com os 31 detentos alvo do massacre já identificados no Instituto Médico Legal (IML), uma informação ansiada pelos familiares dos presos, que se acumulavam nos arredores da cadeia e na unidade forense. As visitas foram suspensas neste sábado e seguirão assim no domingo. No local, há forte odor, resquício da decomposição dos corpos das vítimas – grande parte foi mutilada.

A nova chacina, a segunda em cinco dias, fez desta semana uma das mais sangrentas da história do sistema penitenciário brasileiro, que teve agravada sua crônica crise, com superlotação, altos índices de violência e ausência de controle efetivo das unidades por parte dos Governos estaduais. O ano começou com um massacre de 56 detidos em uma unidade prisional em Manaus, mortes atribuídas a uma decisão do grupo criminoso Família do Norte para subjugar os rivais do poderoso Primeiro Comando da Capital (PCC), a maior facção do país, com origem paulista.

No caso de Roraima, ainda há divergências sobre o que motivou a nova chacina. O PCC usou redes sociais e os aplicativos de mensagem de celular para anunciar as mortes como represália à matança de Manaus. No presídio, havia "recados" escritos com o sangue dos mortos de que os inimigos do PCC pagariam com a própria vida. As autoridades, no entanto, rejeitam essa tese.  Enquanto o ministro da Justiça, Alexandre de Moraes, fala em "acerto de contas interno do PCC", as autoridades locais em Roraima dizem que os mortos eram detentos "neutros", sem ligação com nenhuma facção.

Familiares das vítimas também afirmaram que elas não tinham ligação com nenhum grupo criminoso. "Essa resposta do PCC ao que aconteceu em Manaus foi dada de um jeito errado. Nem meu irmão nem os outros presos que morreram eram de qualquer quadrilha. Eles só queriam cumprir as penas deles", afirmou o autônomo Élcio Silva, de 34 anos.

Na tarde deste sábado e diante da informação sobre o achado de mais dois corpos na prisão, familiares voltaram às redondezas da penitenciária. "Faz três dias que não tenho qualquer notícia do meu filho. Ele não liga nem me manda mensagens. Quando soube que mais dois morreram, vim correndo ver se ele estava aqui. Daqui de fora a gente só consegue ver carregando sacos com pedaços de corpos, mas não dá para identificar", afirmou a doméstica Maria das Dores Silva, 37. O filho dela não estava entre as 31 vítimas iniciais, porém, não se sabe se era um dos outros dois encontrados no sábado, pois ainda não tinham sido identificados.

Outros familiares diziam que alguns dos presos avisaram estar vivos por meio dos celulares, que ainda estão dentro do presídio, apesar de uma varredura feita por representantes da Secretaria da Justiça e Cidadania. "Meu marido me ligou e fiquei aliviada. Estou aqui [na penitenciária] para dar apoio às colegas", disse a mulher de um homem condenado por contrabandear gasolina.

Na sede do Instituto Médico Legal, o cenário era o seguinte: dezenas de pessoas se aglomeravam debaixo de uma tenda à espera de que o nome de seus familiares fosse anunciado e o corpo liberado para ser velado; nos arredores do órgão havia uma fila com ao menos nove carros de funerárias para transportar as vítimas para os dois cemitérios municipais; e dentro, sem espaço para armazenar todos os corpos, dois caminhões frigoríficos tinham essa função.

O clima de animosidade entre as forças de segurança era tamanha que usualmente se via policiais que faziam a segurança do IML discutindo com as pessoas que haviam ido ao local para procurar recolher os corpos de seus parentes. No PAMC, um fotógrafo chegou a ser detido por cerca de 20 minutos porque se aproximou da penitenciária para registrar a movimentação dos peritos.

Com o aprofundamento da crise, o Governo Michel Temer tenta reagir. Além do lançamento de medidas como parte de um novo plano de segurança, o presidente se reuniu neste sábado com a presidente do Supremo Tribunal Federal, ministra Carmem Lúcia, para discutir a crise. Para especialistas, o anunciado até agora tem pouca chance de dar uma resposta para conter o panorama. Estados temem que a rivalidade entre as facções, alimentada pelas duas chacinas recentes, se espalhem para outras unidades, especialmente no Norte e Nordeste.

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