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Massacre em presídio de Manaus deixa 56 detentos mortos

Autoridades afirmam que trata-se de enfrentamento entre presos do Primeiro Comando da Capital e da Família do Norte

Gil Alessi

Uma rebelião no Complexo Penitenciária Anísio Jobim (Compaj), em Manaus, deixou 56 detentos mortos — a primeira informação dava conta de 60 mortos. O levante na unidade começou na tarde de domingo, e a situação foi controlada apenas durante a manhã desta segunda-feira, após pouco mais de 17 horas. O secretário de Segurança Pública, Sérgio Fontes, falou que se trata de um “massacre” provocado pela briga entre as facções criminosas Primeiro Comando da Capital (PCC), originária de São Paulo, e a Família do Norte, do Amazonas. A maioria dos mortos pertence ao PCC. “Esse é mais um capítulo da guerra silenciosa que o narcotráfico mergulhou o país”, afirmou. Ao menos 12 guardas prisionais foram feitos reféns e posteriormente liberados sem ferimentos. O secretário de Administração Penitenciária do Estado, Pedro Florêncio, afirmou que alguns presos agredidos foram encaminhados para hospitais da região.

Esta é a segunda rebelião mais letal da história do sistema prisional brasileiro, ficando atrás apenas do Massacre do Carandiru, ocorrido em São Paulo em 1992, no qual 111 presos foram assassinados pelas tropas da Polícia. O juiz Luís Carlos Valois, que esteve no Compaj para negociar o fim da crise disse que viu muitos corpos e que era difícil precisar o número de mortos "pois muitos estavam esquartejados". “Nunca vi nada igual na minha vida, aqueles corpos, o sangue”, afirmou. No domingo seis detentos foram decapitados e tiveram seus corpos arremessados para fora da unidade. Para as autoridades, o grau de crueldade com que os presos foram mortos são um sinal de que a intenção foi mandar um recado para os rivais. Vídeos com pilhas de corpos esquartejados e carbonizados empilhados dentro do Compaj circularam na Internet. Uma das imagens era a de uma cabeça decapitada ao lado de um coração. De acordo com a Umanizzare, empresa responsável pela gestão do Compaj, a unidade abriga 1072 internos, e é o maior presídio do Amazonas.

Reprodução

Desde outubro do ano passado o rompimento entre o Primeiro Comando da Capital a o Comando Vermelho, facção criminosa fundada no Rio de Janeiro e aliada da Família do Norte, elevou a tensão nos presídios do Norte e Nordeste do país. A facção amazonense, inclusive, foi pivô deste rompimento: três lideranças do PCC foram brutalmente degoladas entre junho e julho de 2015 dentro de presídios de Manaus a mando das lideranças da FDN.

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O secretário também afirmou que foram ouvidos disparos de arma de fogo no início da rebelião, por volta das 15h de domingo. “Precisamos averiguar se eles usaram armas”, disse Fontes. De acordo com ele, antes do levante houve uma fuga no Instituto Penal Antônio Trindade (Ipat), também em Manaus, que teria sido uma "cortina de fumaça" para a rebelião. Um dos presos que fugiu do Ipat chegou a postar no Facebook uma foto de sua fuga da unidade com a legenda "Fulga (sic) da cadeia".

O Compaj, onde ocorreu a rebelião, é um presídio dominado pela Família do Norte. Na unidade os detentos do PCC são minoria e ficam confinados em dois pavilhões e uma área conhecida como o "seguro", onde ficam separados do restante da população carcerária. Documentos obtidos pelo EL PAÍS apontam que uma das lideranças do grupo José Roberto Fernandes Barbosa, conhecido dentro do sistema carcerário como Messi, chegou a negociar com as autoridades para acabar com a área reservada aos presos do PCC. De acordo com informações da PF, em meio a uma onda de violência na capital em 2015, Barbosa foi convocado para uma reunião no Compaj, com o então secretário de Administração Penitenciária do Estado, o coronel reformado Louisimar Bonates. Durante o encontro ele fez a solicitação de acabar com a área destinada aos presos paulistas em troca da pacificação das ruas e presídios. O acordo acabou não se concretizando.

Pichação com as iniciais do Comando Vermelho e da Família no Norte dentro de presídio em Manaus.
Pichação com as iniciais do Comando Vermelho e da Família no Norte dentro de presídio em Manaus.

A região Norte é fundamental para o tráfico internacional: as principais rotas de droga passam por suas fronteiras, uma vez que estes Estados fazem divisa com grandes países produtores de cocaína, como Peru, Bolívia e Colômbia – além da Venezuela, famosa pela permissividade em suas fronteiras. O controle das cadeias locais estabelece o poder sobre essa atividade. Já no Nordeste ficam alguns dos pontos de escoamento da droga que vai até a África e Europa.

Nos últimos anos, o PCC fortaleceu sua presença em algumas das mais importantes rotas do tráfico internacional de drogas e armas. A facção é responsável pelos principais carregamentos de cocaína vindos da Colômbia e Bolívia e maconha do Paraguai. O Comando Vermelho, por sua vez, perdeu preponderância nestas rotas após a prisão de Luiz Fernando Costa, o Fernandinho Beira-Mar, em 2001 na Colômbia. À época, ele negociava com as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia para a compra de cocaína.

Rastro de violência

O fim da aliança entre as facções já deixou um rastro de sangue no sistema prisional. Em outubro, na penitenciária agrícola de Monte Cristo, em Boa Vista, ao menos 10 presos do CV foram mortos quando detentos ligados ao PCC arrebentaram os cadeados que separam as alas e invadiram o setor da facção fluminense. Segundo o Sindicato dos Agentes Penitenciários de Roraima, pelo menos seis presos foram decapitados e queimados, o que dificultou a identificação dos corpos. O conflito ocorreu durante o horário de visita, o obviamente mais importante e pretensamente protegido no código não escrito dos detentos, o que foi lido como mais um indicativo da divisão profunda entre as facções. Horas depois, numa prisão de Porto Velho, um motim semelhante deixou oito presos mortos.

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