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O CEO da Ab InBev cumpre a mesma missão há 20 anos: crescer sem parar

Carlos Brito pode encabeçar a quinta maior empresa de bens de consumo do mundo

Thiago Ferrer Morini
Carlos Brito, em uma conferência.
Carlos Brito, em uma conferência. PETER FOLEY (BLOOMBERG)

No dia 11 de novembro, o conselho de administração da SABMiller deu o seu aval à proposta de compra da rival AB InBev - reforçando a que já é a maior cervejaria do mundo - por 95 bilhões de euros à vista (377 bilhões de reais). Além de seu negócio principal, a SABMiller e a AB InBev têm algo em comum. A SAB (de South African Breweries) é, apesar de sua sede em Londres, originalmente uma empresa sul-africana – entre as condições da oferta existe uma de que as ações da nova empresa conjunta cotizem na Bolsa de Joanesburgo – enquanto que a AB InBev, nominalmente belga, tem sete brasileiros entre os nove membros do seu conselho de administração. O mais importante de todos é seu CEO, Carlos Brito.

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Se a operação for realizada, Brito deve encabeçar a quinta maior empresa de bens de consumo do mundo por receita: 47,6 bilhões de euros (188,8 bilhões de reais) em 2014, quase o mesmo valor que a gigante Unilever. Mas o executivo tem experiência em transformar cerveja em dinheiro. É por isso que foi escolhido pelo trio de ases do fundo de investimento 3G Capital: Jorge Paulo Lemann, Carlos Alberto Sicupira e Marcel Hermann Telles.

Os três conheciam Brito desde os anos 80, quando o jovem formado em engenharia industrial trabalhava no banco de investimento Garantia, fundada por Lemann – que depois o venderia ao Credit Suisse por mais de 600 milhões de dólares – Brito queria fazer um MBA na Universidade de Stanford nos EUA, mas não podia pagar. Lemann decidiu financiá-lo, assim como outros jovens promissores, com uma condição: depois de terminar seu mestrado, voltaria e daria uma mão na empresa.

Em outubro, Brito contaria sua experiência na Califórnia para uma associação de estudantes brasileiros na Universidade de Columbia. “Ser brasileiro estudando fora tinha seus problemas. Naquela época, o Brasil não tinha a imagem que tem agora; era aquele país com inflação alta, que queimava a Amazônia, matava crianças na rua”, disse ele. “Quando cheguei, me sentia um cidadão de segunda classe. Mas no MBA aprendi duas coisas: que não era tão bom quanto acreditava, e que tirando o idioma (porque não consigo eliminar o sotaque), era capaz de competir de igual para igual com os outros estudantes, apesar de que eram altos, bonitos e falavam inglês, e eu era baixinho, careca, meio gordinho”.

O primeiro passo, o sonho: pensar a longo prazo e pensar grande. 'Precisa ser algo que dá frio no estômago, que tira você da cama no meio da noite', diz Brito

Brito manteve sua promessa e voltou ao Brasil. Aprendeu os detalhes do negócio de bebidas na cervejaria Brahma, que o Garantia tinha comprado em 1989. Como tinha feito antes com outras empresas, o banco procurou as melhores práticas de gestão. O estilo do banco Garantia defendia cortar custos e simplificar em todas as áreas: os executivos da AB InBev costumam viajar em classe econômica e nas fotos oficiais do conselho ninguém aparece vestindo terno. Brito costuma trabalhar de camisa, calça jeans e um relógio de pulso simples.

Em 2000, a Brahma comprou a Antártica, sua maior rival no Brasil, para formar a AmBev, a maior cervejaria da América Latina. Quatro anos mais tarde, a belga Interbrew (fabricante de marcas como Stella Artois) trocaria ações com a Ambev para formar a InBev. Embora pelo tamanho da transação tenha sido uma compra (e a sede mudou para Lovaina), logo ficou claro que, mais do que as marcas brasileiras, o que a Interbrew queria era a magia da gestão da Ambev. E, depois de um breve período trabalhando na divisão norte-americana, Brito foi nomeado CEO da nova empresa.

Mas o apetite ainda não tinha acabado. Em 2008, o grupo comprou a venerável Anheuser-Busch. A fabricante da Budweiser, que tinha sobrevivido até à Lei Seca, um verdadeiro símbolo da indústria cervejeira norte-americana. Como CEO da AB InBev, Brito também presidiu a compra do grupo mexicano Modelo.

A cada empresa engolida, Brito levava consigo seu modelo de gestão, simbolizado em três palavras. “Sonho. Pessoas. Cultura”, enumerou, como quase sempre faz, em sua palestra para estudantes da Columbia. “É a única coisa que a empresa deve ter de original; o resto, a concorrência pode copiar”.

O primeiro passo, o sonho: pensar a longo prazo e pensar grande. “Precisa ser algo que dá frio no estômago, que tira você da cama no meio da noite”, explica aos estudantes. “Mas precisa ser viável; você precisa ter claro 60% ou 70% de como vai conseguir. O resto você aprende fazendo, errando, refazendo. Se no dia 1º de janeiro tem 100% claro como vai fazer, não é um sonho, é outra coisa”.

O segundo, criar uma equipe. “Primeiro de tudo, encontre uns 100 Carlos Brito para contratar como subordinados”, diz Fernando Homem de Mello, autor de um livro sobre a cultura corporativa da 3G chamado - como não podia deixar de ser - Sonho, Pessoas, Cultura. “Ele deve considerar que são tão bons ou melhores do que ele. Não faria nada sem isso”. “Quando você se rodeia de pessoas tão brilhantes ou mais do que você mesmo, fica motivado”, observa Brito.

O terceiro (a cultura) é, de acordo com Homem de Mello, a da 3G com um ponto adicional: a experiência. “Lembre-se que está gerenciando a mesma empresa, no mesmo negócio por 15 anos”, explica ele. “Está em uma fase na qual o refinamento de suas técnicas e cultura estão bem avançadas”.

E esse talento tem seus reconhecimentos. Em 2013, a revista Fortune o colocou em sua equipe de diretores do ano como melhor CEO. Mas na cultura da 3G, que defende a permissão para que os mais brilhantes cresçam, Brito sabe – reconheceu em 2013 em uma rara entrevista à revista brasileira Exame – que pode perder o posto a qualquer momento para outro executivo mais jovem.

A batalha das cervejas

O mercado global de cerveja não para de crescer. Em 2013, o planeta bebeu 188,81 bilhões de litros de cerveja, quase 27 litros por habitante, de acordo com a empresa japonesa Kirin. Ásia e África são os mercados que cresceram mais rápido e, com a América Latina, as áreas onde a empresa (ainda sem nome) decorrente da incorporação da InBev e da SABMiller pretende se concentrar.

No entanto, não vai ser fácil. Por um lado, a concorrência de outras bebidas alcoólicas, como vinho, que se soma à luta pela classe média nos países emergentes, especialmente a China, o maior consumidor de cerveja do mundo. Por outro, o paladar mais ousado dos consumidores nos países desenvolvidos, que abandonam progressivamente cervejas básicas Brahma ou Budweiser em busca de outras variedades, mais fortes ou mais exóticas. As cervejas artesanais tiveram forte crescimento, especialmente nos Estados Unidos; uma tendência que não passou despercebida entre os leviatãs do setor.

Este desejo por cervejas menos industrializadas contrasta com a luta implacável pela rentabilidade de Brito. Há uma década, a então Inbev foi forçada a cancelar um projeto para transferir a produção da cerveja branca de trigo Hoegaarden da cidade flamenga de mesmo nome por causa do protestos dos consumidores.

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