Dilma pode ter o mandato impugnado?
Processo para substituir a presidenta brasileira não é simples Maior risco que a mandatária enfrenta é o de encobrir delitos
O Impeachment (a impugnação do mandato) é, nas últimas semanas, a palavra da moda no Brasil. É usada por alguns políticos da oposição e, sobretudo, pelos organizadores de uma marcha anti-Dilma Rousseff convocada por meio das redes sociais em várias cidades do país para o dia 15 de março, tendo como motivação o gigantesco escândalo de corrupção da Petrobras. Mas um processo para impugnar o mandato da presidenta brasileira – pressionada pela Operação Lava Jato, que investiga o desvio de dinheiro da estatal, um mau momento econômico e uma brusca queda de popularidade – não é tão simples.
O nome real do impeachment na Constituição brasileira é “crime de responsabilidade”. O texto diz: “O presidente da República, na vigência de seu mandato, não pode ser responsabilizado por atos estranhos ao exercício de suas funções”. A chave está na definição desses “atos estranhos”. Dilma presidiu o Conselho de Administração da Petrobras entre os anos 2003 e 2010 (a Operação Lava Jato investiga supostas irregularidades cometidas na petroleira estatal entre 2004 e 2012). Se o Congresso aceitasse as acusações dessa época como um motivo para destituir Dilma, o Supremo Tribunal Federal provavelmente as derrubaria com base nesse artigo, opina Carlos Ari Sundfeld, professor de Direito da Fundação Getúlio Vargas.
Por outro lado, este é o segundo mandato de Dilma, reeleita em outubro por uma estreita margem. E algumas vozes sugerem que ela não poderia ser julgada por algo ocorrido em sua etapa anterior como presidenta do Brasil, de acordo com o mesmo artigo da Constituição. Nada está claro porque não existem precedentes. “Essa dúvida nunca foi discutida em processos parecidos no Brasil. Nem tampouco existe uma doutrina jurídica que debata esse problema, já que a reeleição é algo recente [entrou em vigor em 1998].” Até agora, Fernando Collor de Mello (1990-1992) é o único presidente que foi impugnado na história deste país, embora Fernando Henrique Cardoso tivesse de acostumar-se com as manifestações e os gritos de “Fora FHC” durante seu segundo período no poder (1999-2002).
O maior risco ao qual Dilma se expõe não é o de ser acusada de cometer delitos, mas de encobri-los ou ignorá-los durante seu mandato, acredita o advogado Ari Sundfeld. Um exemplo: o tesoureiro nacional do Partido dos Trabalhadores, João Vaccari Neto, foi um dos últimos pesos pesados do partido governista acusados de participar do desvio de fundos da Petrobras durante nada mais e nada menos do que uma década.
Falar tanto de um impeachment que parece pouco factível não é uma manobra inocente, acredita Aragão
Se a impugnação do mandato de Dilma seguisse em frente, ainda teria de conseguir dois terços dos votos da Câmara dos Deputados. Apesar de os aliados da base do Governo ocuparem 60% das cadeiras da Câmara e do Senado, esse é o apoio mais frágil de um partido no poder desde a volta da democracia, em 1989. Do ponto de vista político, a possibilidade real de um impeachment da Dilma é “quase zero”, garante Thiago Aragão, sócio da consultoria de análise política Arko Advice. “Um impeachment nasce de uma elevada insatisfação popular, mas não dessa que vemos hoje, senão de uma muito mais forte. Para isso, o protesto do próximo dia 15 teria que repetir-se todos os fins de semana durante meses.”
Falar tanto de um impeachment que parece pouco factível não é uma manobra inocente, acredita Aragão: “É como quando se comenta que certo banco vai quebrar e o rumor afeta as ações e a confiança dos clientes. Cada vez que alguém menciona o impeachment, põe a presidente mais na defensiva”.
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