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A América Latina precisa dobrar seu investimento em infraestrutura

Para acompanhar o crescimento econômico, a região deveria investir 6% do PIB regional, mas só investe 3%

Carmen Sánchez-Silva
A capital peruana inaugura sua primeira linha de metrô (na foto). Lima já concedeu as duas seguintes a duas empresas espanholas, a FCC e a ACS.
A capital peruana inaugura sua primeira linha de metrô (na foto). Lima já concedeu as duas seguintes a duas empresas espanholas, a FCC e a ACS.Apf

A América Latina precisa investir em infraestrutura em torno de 6% do PIB regional para acompanhar o crescimento econômico que está registrando nos últimos anos. “Investimos muito pouco”, afirma Antonio Juan Sosa, vice-presidente de Infraestrutura do Banco de Desenvolvimento da América Latina (CAF), em torno de 145 bilhões de dólares (325 bilhões de reais) por ano. A região mal chega a destinar 3% de sua riqueza para a construção de estradas, redes de metrô, logística, água potável, eletricidade, telecomunicações, etc, um porcentual que quase não variou nos últimos anos.

“A América Latina está diante de uma oportunidade única para desenvolver-se agora e dar um salto de qualidade nas próximas décadas. Sem infraestrutura não se pode prover qualidade de vida, já que ela apoia o crescimento da economia e a competitividade das empresas. Se não há competitividade, esse crescimento não se sustentará ao longo do tempo”, vaticina o vice-presidente do CAF, entidade que direciona 54% de sua carteira de empréstimos ao desenvolvimento desse tipo de equipamentos básicos. Mais de 50 bilhões de dólares entre 2000 e 2013.

José Manuel Moral, membro do conselho assessor da Abertis, concorda com o diagnóstico. “O problema da América Latina, cuja economia cresce em média 4,5%, é que destina menos de 3% do PIB à infraestrutura, em comparação com 9% da China, que cresce 7% ao ano, 7% da Índia, que o faz a 5,7%. Somente se a região gerar infraestrutura tomará parte do desenvolvimento mundial”, diz Moral, na crença de que esse tipo de obras não tem de ser feito “a serviço dos Governos, mas das empresas e dos cidadãos”.

E ocorre que, segundo Sosa, “o avanço da infraestrutura latino-americana nos últimos três anos é pouco satisfatório”. A áreas mais debilitadas, onde o progresso tem sido mais limitado, são as das estradas (“parece mentira que as primeiras estradas para conectar a região tenham sido feitas no século XX”, se queixa), das ferrovias e das redes de água e saneamento. “São as que precisam de uma atenção prioritária”, argumenta. Em portos e aeroportos o avanço é moderado, tal como revela o relatório A Infraestrutura no Desenvolvimento Integral da América Latina (IDeAL2013) do CAF, que avalia que a melhora mais relevante ocorreu nas áreas de energia e telecomunicações.

A fragilidade institucional e a corrupção estão no fundo desse escasso desenvolvimento, admite o CAF. Uma fraqueza que afeta o pouco planejamento a longo prazo do Governo sobre as necessidades de infraestrutura; a sua má execução e manutenção (Colômbia, Peru e Brasil selecionam de forma rigorosa os projetos que empreendem); a pouco estruturada parceria público-privado (dois terços da infraestrutura da América Latina são públicos e o restante, privado, sendo o Chile, México, Brasil, Colômbia, Panamá e Peru os principais artífices das concessões a longo prazo, e o Paraguai, que quer iniciá-las); e a avaliação, que é rara, dos critérios de sustentabilidade e participação dos cidadãos em torno do desenvolvimento.

A região deve duplicar os US$ 145 bilhões investidos em obras a cada ano

“Na América Latina a deficiência está na falta de projetos. Há muitas ideias, mas poucos projetos planificados”, indica Miguel Jurado, diretor de construção da FCC. Todos esses problemas repercutem nos desdobramentos, que acumulam importantes atrasos e sobrecustos. Em uma amostra de 258 projetos, cujo volume de investimento previsto era de 90 bilhões de dólares, a CAF comprovou que o aumento do investimento oscilou entre 20% registrado nas estradas e 45% nas ferrovias. “É muito difícil estimar o valor preciso das perdas por baixa produtividade no investimento em infraestrutura (...), mas é claro que se trata de valores muito altos”, avalia o banco de desenvolvimento em seu relatório.

Por isso, para empresas espanholas como a Iridium, “os pontos-chave para o andamento de grandes estruturas básicas na América Latina são: estabilidade econômica e social, confiança dos mercados de capitais para financiá-las, criação de um marco legal para atrair investimento estrangeiro (como estão fazendo no Uruguai, Colômbia e Paraguai) e a transparência na licitação das obras”, explica Salvador Myro, diretor de desenvolvimento da empresa do Grupo ACS.

E existem claras diferenças entre os países. Entre os membros do Mercosul e os da Aliança do Pacífico, segundo Miguel Jurado. “México, Peru, Panamá e Paraguai precisam de regulamentos que façam avançar suas leis de infraestrutura. O marco regulatório é fundamental para que as trocas de governo não afetem os projetos de infraestrutura. A Aliança do Pacífico (Chile, Colômbia, Peru e México) dá garantias às empresas para poder investir com estabilidade. E também o Panamá, cujo novo presidente vai dar continuidade ao plano de infraestrutura”, diz.

O Peru é um exemplo de país que está apostando com força no investimento em infraestrutura e na abertura à iniciativa privada, em muitos casos, espanhola, pois como dizem os responsáveis do CAF, o conhecimento e a tecnologia espanhola são formidáveis, por isso participa em uma infinidade de projetos da região e assessora muitos outros – de fato, a Sacyr acaba de entrar esta semana no país. Vêm depois a Colômbia, na opinião de Sosa; Equador (onde os projetos de desenvolvimento são públicos) e o Paraguai, “que estava um pouco adormecido e está despertando com o novo Governo”, observa.

“O desejo é que o investimento em infraestrutura chegue a 5%-6% do PIB da América Latina. Terá de ser conseguido a longo prazo. Mas o que de fato é possível é que dentro de pouco nos aproximemos dos 4%”, afirma o vice-presidente de Infraestrutura no CAF, que considera que o peso relativo da classe média na região e a crescente abertura comercial que alguns países estão adotando impactam na demanda de equipamentos básicos e alertam para a necessidade de acelerar o ritmo de ampliação das melhorias.

Em 2011 o transporte representava 48% dos investimentos na região; o setor de energia, 25%; as telecomunicações, 20%; e o setor de água, 7%.

Grandes projetos em andamento

A ampliação do canal do Panamá é uma das maiores obras em andamento na América Latina, com um orçamento superior a 5 bilhões de dólares sem levar em conta o custo dos atrasos decorrentes do conflito com a Sacyr e “que provocaram muito alvoroço contra as empresas espanholas, mas não resultaram em prejuízo para a marca Espanha”, segundo a FCC e a ACS. Estas são outras grandes obras de infraestrutura que estão em construção ou licitação:

* Ampliação da estrada Interoceânica, com um investimento de 1,5 milhão de dólares.

* Linhas de metrô do Panamá, Lima e Quito (para a qual será licitada a FCC, segundo declara, depois de tomar parte nas duas anteriores).

* Estradas de quarta geração 4G da Colômbia, além de rodovias, “estão sendo licitadas agora, mas poucas empresas se apresentam porque estão previstas expropriações, que na Espanha levaram ao fracasso de projetos”, segundo a FCC.

* Portos, em razão da ampliação do canal do Panamá. Chile, Nicarágua, México, Guatemala e Honduras.

* Sistemas de ônibus articulados são programados na maioria das cidades, onde se concentra 80% da população da região, com base na antiga experiência da cidade de Curitiba, no Brasil, segundo o CAF. Bogotá e Lima são algumas delas.

* O México vai construir linhas ferroviárias e estradas.

* O Panamá licitará infraestrutura para abastecimento de água.

* O Chile prevê ampliar o aeroporto (como Bogotá) e anéis viários.

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