
16 fotógrafos sírios recordam uma década de guerra no seu país
Retrato de uma nação ferida onde a vida e o desejo de um futuro melhor abrem caminho entre as sombras do conflito armado


“Fomos embora e ainda não chegamos; não temos destino. O migrante forçado só tem uma bússola que sempre aponta para trás e um mapa que só indica o destino que deixou à força. Olhando pela janela do ônibus que nos tirava de lá, virei o rosto para o céu, procurando um destino que me aceitasse sem passaporte, sem identidade, sem família, sem pátria nem seres queridos.”
Mohammed Badra (EPA)
“Eu tinha 12 anos em 2011. Vivia em Damasco e sonhava em ser médico. Em 2013 prenderam a meu pai e voltei com minha família para Idlib. Larguei os estudos e comecei a trabalhar para ajudar a minha família. Quando tirei esta foto, tinha sentimentos contraditórios de alegria e tristeza. Alegria porque vi as pessoas voltarem para suas casas, estavam felizes, mas ao mesmo tempo senti tristeza porque eu mesmo não podia retornar ao meu povoado nem à minha casa.”
Ali Haj Suleiman
“Quando no final de 2017 comecei a fotografar a destruição da minha cidade, Raqqa, fiquei impactado. Destruíram tudo o que tinha a ver com nosso passado e nossa memória. Foi doloroso demais. Cada imagem que mostrava a destruição me feriu de morte. Cada imagem contava uma história. Apesar do trauma, tratei de documentar a destruição reunindo as contradições da vida e contando a destruição com belas imagens que contêm nossa dor.”
Abood Hamam
“Em 2011, eu trabalhava como professor primário. Comprei uma câmera pequena porque senti que era meu dever fotografar o que presenciei na minha cidade, Daraa, e transmitir ao mundo. Comecei a fotografar as manifestações pacíficas, depois os bombardeios, as batalhas, a morte..."
Mohamad Abazeed
“Às vezes me imagino no fundo de um oceano escuro procurando luz no vazio silencioso que me cerca. Esta guerra atribuiu a este silêncio a cor vermelha, que distorce minha memória. Retalhos de luz nos meus olhos empapados com os gritos de crianças famintas, de mulheres chorando, de vagabundos... É difícil reter todos os detalhes dilacerantes. Ser parte de tudo. Olhar nossos filhos e ver milhares de olhos sem brilho.”
Delil Souleiman
“O medo dominava a situação. Ninguém podia saber quando um edifício iria desmoronar ou quando alguém seria incluído na lista dos mortos. Não sei o que aconteceu com estas famílias. Continuam vivas ou foram deslocadas de seus lares? O único que sei ao certo é que esta imagem é a prova que documenta sua tragédia.”
Anas Alkharboutli (DPA)
“Quando publiquei esta foto em 2013, através da agência de notícias Reuters, como parte de minha cobertura da vida em Aleppo durante a guerra, algumas pessoas escreveram comentários criticando a irrealidade da imagem. Diziam que o fotógrafo deveria ter oferecido água limpa ao menino em lugar de explorar sua imagem. Acho que qualquer mudança da realidade começa por ver essa realidade tal como é, e não como nós gostaríamos que fosse.”
Muzaffar Salman
“Adoro fotografar as pessoas, seus rostos, seus olhos, detalhes de sua vida diária, e contar suas histórias através de minhas imagens. Sempre procuro o lado positivo porque acredito que a esperança sempre está presente.”
Ashraf Zeinah

“A guerra não mudou apenas a Síria, mas também nossa forma de ver e fotografar. Meu sonho é que algum dia, talvez em 50 anos, minhas filhas Asli e Zoya compartilhem minhas imagens com o mundo e com as próximas gerações sírias para lhes mostrar o que a guerra fez com o nosso país, evitando assim que a história se repita.”
Omar Sanadiki
“Apesar de toda a destruição, do estresse e da falta de recursos em plena guerra, os moradores de Aleppo sempre demonstraram profundo amor por sua cidade. Inclusive nos momentos mais sombrios, compartilharam e procuraram soluções para sobreviver. Ver os sorrisos desses comerciantes faz a gente sentir que nada é capaz de parar a roda da vida.”
Adeeb Alsayed
“O que aconteceu? Minha memória está imprecisa... Sinto que perdi todos os momentos bonitos que vivi na minha terra natal. O aroma da morte está por toda parte. Quando fecho os olhos... vejo os rostos das pessoas cheios de cansaço, opressão e orgulho. Perdemos tudo... Viramos números... De mortos, feridos, viúvas, órfãos, deslocados, desaparecidos... Não identificados. Perdemos tudo... Os lugares já não são nossos lugares; os rostos já não são nossos rostos. Inclusive nossos pertences e nossas lembranças estão distorcidos. Nós nos tornamos estranhos em nossa terra e estranhos em toda parte. Perdemos tudo... O único que resta são nossas almas nuas. Nossas tumbas abertas. Nossas lágrimas secas. Nossas cidades em ruínas. Nossos corações sedentos de paz. E parte da lembrança em imagens que ficarão gravadas na memória como prova da vergonha da humanidade em nossa amada e devastada Pátria.”
Carole Alfarah
“Cada vez que tinha que cobrir um ataque aéreo, recordava do dia em que meu irmão Amer foi assassinado pelos mísseis que bombardearam nossa cidade. Quando fui cobrir o bombardeio aéreo da localidade de Sarmin, vi uma cena que se repete sempre. Edifícios transformados em escombros, gente chorando pelo horror do ocorrido. O mesmo sentimento que experimentei quando Amer foi assassinado. A mesma cena continua se repetindo e não sabemos quando terminará.”
Ghaith Alsayed
“Fazia uma década que não observava o céu noturno. Em uma noite de verão do ano passado, surpreendeu-me ver as estrelas por cima da destruição e dos acampamentos. A cena dividiu o mundo em dois diante dos meus olhos: uma metade mostrava o que foi feito pela mão de Deus, e a outra, o que foi criado pelo homem.”
Omar Haj Kadour (AFP)
“Nos últimos anos pude transmitir muitas histórias humanitárias, e é o que me dá motivação e força para seguir com meu trabalho. Acredito que uma imagem seja capaz de acabar com uma guerra. Foi o que aconteceu no Vietnã. Quero que nossas fotografias viajem por todo o mundo para falar da nossa história e que possam inspirar milhões. Talvez contribuam algum dia para parar a guerra na Síria.”
Mohannad Zayat (UNOCHA)
“Umm Mohammed foi uma das pessoas mais especiais que conheci. Ela ficou gravemente ferida e, justamente quando se recuperava, seu marido foi atingido por um ataque aéreo e perdeu a capacidade de caminhar. O cerco a impediu de ver seus filhos, que vivem fora da região de Ghouta, a leste da capital. Tinha que cuidar do seu marido ferido, da sua casa, e não se rendeu. Seu amor por seu marido era evidente e maior que qualquer outra coisa. Acredito que sua resistência, sua sinceridade, sua determinação e seu desejo de viver apesar das difíceis e as duras condições represente o verdadeiro rosto dos sírios. Encarna seu amor pela vida e sua sólida vontade de superar as dificuldades apesar de toda a morte e destruição que lhes cerca.”
Sameer Al-Doumy (AFP)