Por que os jovens brasileiros querem se tornar ‘youtubers’?
Produtores de vídeos contam com milhões de fãs e disputam espaço com a TV
Era fim de tarde de uma quarta-feira e após participar de um encontro com fãs em uma livraria, ela precisou sair escoltada por seguranças de um shopping de São Paulo. O evento tomou proporções muito maiores que as esperadas. A curitibana de 22 anos não é uma estrela global, nem cantora famosa, mas já está se acostumando a reunir centenas de admiradores por onde passa ou se apresenta. Kéfara Buchmann é hoje uma das principais estrelas brasileiras no YouTube e possui cerca de 4,5 milhões de seguidores em seu canal 5inco Minutos - o quarto mais visto no país - que é febre na internet com um humor dirigido ao público feminino.
Kéfera não grava suas histórias dentro de um estúdio, faz quase tudo a partir de uma estrutura básica, dentro de sua casa há quase cinco anos. Simplesmente liga a câmera e começa a falar com humor sobre algum tema que lhe interesse e adiciona alguns toques de edição. Apesar disso, possui uma audiência digna de um programa de TV. Ela faz parte do fenômeno dos youtubers, uma geração de jovens que gosta de se comunicar através de vídeos na internet, seja para falar sobre música, para mostrar como se joga um game, ensinar uma receita ou fazer um tutorial de maquiagem. "Antes éramos apenas chamados de vlogueiros. Vlog veio de blog, blog de vídeos. Mas não somos só isso, somos produtores de conteúdo no geral", explica Kéfera.
Alguns acreditam que essa é uma moda passageira, mas na opinião do doutor em comunicação Dado Scneider é uma tendência irreversível de um canal de comunicação que já disputa com a TV a audiência do público. "É um novo canal que veio para ficar, é o concorrente direto da televisão para jovens abaixo dos 20 anos. Alguns adolescentes não sabem o que é novela das 8, Jornal Nacional, horário nobre", explica. Para o especialista, é um novo meio que se instalou na geração mais nova, mas que já tem conquistado os mais velhos também. "Os canais de YouTube estão para a TV, como os shoppings estão para o comércio do centro da cidade. Deslocou-se o público", explica.
Hoje, já há centenas de canais no país, mas os mais populares do Brasil no YouTube são: Porta dos Fundos (com quase 10 milhões de inscritos), Parafernalha, Programa Galo Frito, 5inco Minutos, Venon Extreme, Não Faz Sentido (Felipe Neto), Cauê Moura, Manual do Mundo, Canal Nostalgia e Galinha Pintadinha, a grande maioria, com temáticas de humor. Os dez são os que possuem mais inscritos nas páginas, de acordo com o VidStatsX, que ranqueia os canais brasileiros. Muitos são humorísticos, mas outros formatos como os de gameplay, por exemplo o Venon Extreme, também fazem muito sucesso. O segundo do ranking, o Parafernalha, possui o vídeo mais visto em 2014, com o título Dilma - Copa do Mundo, com mais de 9 milhões de visualizações.
Para o diretor de conteúdo do YouTube Brasil, Alvaro Paes de Barros, o sucesso dos canais brasileiros se deve aos espectadores brasileiros, que são engajados em plataformas sociais. Barros também ressalta que os próprios telespectadores de TV já procuram novas opções. "Hoje, o telespectador tem uma posição muito diferente daquele telespectador de alguns anos atrás, muito mais proativa. Ele não se contenta em ficar sentado no sofá assistindo a alguma coisa. Ele quer participar, saber mais, opinar, dizer se gostou ou não do conteúdo", explica.
Negócio rentável?
Além de ser um hobby para os jovens e uma maneira de se expressarem, a produção de vídeos no YouTube vem se tornando um negócio rentável para muitos deles em um país que vê a audiência da internet crescer a cada ano. Atualmente, o site conta com um bilhão de visitantes únicos por mês no mundo e o Brasil é o segundo país em tempo de vídeos assistidos, atrás somente dos Estados Unidos.
Uma pesquisa encomendada pelo Google, no segundo semestre de 2014, revelou que somos 70 milhões de espectadores de vídeo online no Brasil, consumindo, em média, oito horas semanais de vídeos na Web, o que pode representar um bom negócio para os canais mais populares. Os vídeos são monetizados de acordo com as visualizações das publicidades que aparecem. Porém, o dono de um canal só ganha se um usuário realmente assistir a publicidade - que geralmente é evitada por muitos, quando aparece no início de um vídeo como opção -, o que torna difícil o cálculo. Uma pessoa que possui entre 500.000 e um milhão de inscritos, por exemplo, pode chegar a ganhar de 6.000 reais a 50.000 por mês.
No entanto, a youtuber Kéfera ressalta que começar um canal com a intenção de ficar rico não é o mais aconselhável. "Você precisa de muitas visualizações e certa popularidade, de números, porque o YouTube se baseia nisso para te pagar. Acho que é um risco que você toma sabendo que há muita chance de dar errado", diz. Ela afirma que em um canal como o dela se consegue uma boa renda com as visualizações, mas que é ainda mais rentável com as publicidades que faz fora dos vídeos. "As marcas estão acreditando mais no poder dos nossos vídeos, nos procuram mais pedindo para fazer publicidade. Estamos conseguindo fazer um pé de meia", afirma.
Para a youtuber, o seu sucesso é fruto de uma postura irreverente. "Falo o que penso, os internautas se sentem identificados com as minhas histórias. E acho que quem pretende começar do zero precisa procurar fórmulas novas ou adaptar algo que existe com um toque novo. Para mim, também foi uma maneira de mostrar meu trabalho como atriz", explica.
Ajudinha profissional
Mas destacar-se da massa não é fácil. Por isso mesmo, para ajudar nessa tarefa de ascensão na web, algumas empresas começam a apostar nessa missão de tornar sustentável a carreira desses jovens. São as chamadas networks, que agenciam e orientam produtores de conteúdo, dão suporte e ajudam que os canais a terem desempenho e rendimentos melhores.
Uma das primeiras empresas a auxiliar nessa profissionalização dos youtubers no Brasil foi a produtora Paramaker, que pertence a um dos brasileiros mais populares no YouTube: Felipe Neto. Ele criou Não faz sentido (primeiro canal brasileiro do YouTube) e posteriormente a Parafernalha. Sua empresa gerencia hoje mais de 4.000 canais.
"Temos uma gama enorme de canais e eles nos procuram para qualquer tipo de dúvida. Explicamos temas de direitos autorais e da forma de monetização. Facilitamos o pagamento dos anúncios veiculados nos vídeos e, em troca, ficamos com uma porcentagem. Também trabalhamos com três estúdios", afirma Marcelo Sebá diretor da Paramaker.
Mas o intuito, explica, não é descaracterizar o estilo dos vídeos do YouTube. "Eles precisam continuar com a cara deles de caseiros, dentro de casa, do quarto. Um dos charmes é essa proximidade com o internauta, não queremos colocar uma barreira entre eles", completa.
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