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Pequenas empresas são as primeiras a sentirem o impacto da crise da água

Mais de 15.000 são afetadas em Minas; lavanderias já estão demitindo funcionários Produção do setor industrial enfrentou no ano passado o pior resultado em cinco anos

Funcionária de lavanderia busca água para ajudar a abastecer local.
Funcionária de lavanderia busca água para ajudar a abastecer local.SEBASTIÃO MOREIRA (EFE)

O agravamento da crise hídrica na região Sudeste e a possibilidade do país de enfrentar novamente um racionamento de energia preocupa empresas e indústrias de diversos setores, que sentem os impactos da escassez da água. A situação também pode piorar o cenário de pífio crescimento econômico esperado para este ano que não deve passar de 0,3%, de acordo com o Fundo Monetário Internacional (FMI). Economistas já projetam uma queda no PIB de 0,6 pontos porcentuais para 2015 caso o quadro de escassez de água e energia se concretize.

As pequenas empresas são as primeiras a sentirem o impacto da seca. Na Região Metropolitana de Belo Horizonte, cerca de 15.000 já são afetadas com regras de restrição de utilização da água. Depois de anunciar o risco de racionamento hídrico no Estado, a Companhia de Saneamento de Minas Gerais (Copasa) determinou que além da população, os empresários reduzam também o consumo de água em 30% nos próximos 90 dias. De acordo com o gerente de Meio Ambiente da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg), Wagner Soares Costa, a medida afetará milhares de pequenas indústrias e empresas que não têm captação própria do recurso hídrico.

"Apesar da restrição de 30% ser ruim para os empresários, ela ainda é melhor que um possível racionamento, pois as empresas possuem condições de se programarem. Mesmo assim, a medida provocará efeitos colaterais: reduzirá a produção e o faturamento que, consequentemente, resultarão na adequação de pessoal", explica Costa. Ainda segundo o gerente da Fiemg, há relatos de empresas do setor de lavanderias que já estão demitindo funcionários.

A crise hídrica se agrava em um momento em que a produção do setor industrial enfrenta um dos piores resultados dos últimos anos. De acordo com dados do IBGE, divulgados nesta terça-feira, a produção do setor encerrou o ano passado com queda de 3,2%, o pior resultado desde 2009. Com a desaceleração da economia e da demanda doméstica, a indústria acumulou estoques e, consequentemente, baixou a produção. 

Queda de produção de laticínios

A indústria dos laticínios, um dos segmentos mais dependentes de água no processo de pasteurização e resfriamento de leite, também enfrenta um cenário difícil. A estiagem de mais de 60 dias no norte do Estado já provocou um déficit de produção de 25% nos laticínios da região, de acordo com o vice-presidente do Sindicato da Indústria de Laticínios do Estado de Minas Gerais (Silemg), Guilherme Olinto.

"Uma das regiões mais afetadas é a do Vale do Rio Doce. As fábricas estão enfrentando dificuldade de abastecimento, mas os produtores rurais são realmente os mais afetados. O panorama do Estado é muito complexo, o recurso hídrico está abaixo dos 50%", explica. O setor conta com cerca de 956 indústrias e 237 mil produtores de leite, responsáveis por uma produção de quase 9 bilhões de litros de leite.

Por enquanto, as grandes empresas não estão em situação crítica, pois podem contar com a captação de poços e cursos d'água e, também, possuem tecnologias de reúso hídrico, segundo o gerente de Meio Ambiente da Fiemg. Porém, o especialista alerta que, se seca continuar, essas companhias vão se deparar com uma crise provavelmente em setembro ou outubro. "A indústria começou a sentir os efeitos da deficiência hídrica de maneira diferenciada, depende muito do porte da companhia e da região. As grandes empresas estão buscando alternativas, mas já estão em processo de contingência também. Relatórios mostram que no setor de mineração, o índice de reúso da água chegou a 80% em 2014 e no da siderurgia reaproveitaram 90%. Os números são bons, mas, sem a chuva, essas empresas também entrarão em estado de alerta", afirma Costa.

Racionamentos teriam efeito sobre o PIB de -0,6 p.p

Apesar do impacto de um possível racionamento de água e também de energia para a economia ser um cenário novo para traçar projeções, especialistas já apostam na queda do Produto Interno Bruto (PIB) deste ano. O Itaú Unibanco prevê que a fraqueza das chuvas durante janeiro pode levar à necessidade de cortes adicionais no uso de água em importantes centros do Sudeste. Se as restrições de água chegarem a 25% ( a partir de abril) para os 50 municípios paulistas de grande importância econômica que são abastecidos pelo sistema Cantarera e pelo Alto Tietê, o banco estima que o impacto negativo seria de 0,1 pontos percentuais do PIB.

“O efeito pode parecer pequeno, mas em tempos de pouco crescimento econômico é um valor representativo. Além disso, há o risco de racionamento de energia elétrica. Estimamos que um racionamento conjunto de água e energia elétrica teria um efeito adicional sobre o crescimento do PIB de -0,6 pontos percentuais”, explica o economista do Itaú Unibanco Irineu Carvalho.

De acordo com o especialista, de todas as atividades econômicas, a agricultura será a mais afetada. Outro setor bastante prejudicado é o de serviços. “Muitos bares e restaurantes já estão sentindo o efeito da falta de água e a maioria não tem condições de abrir agora um poço artesiano. Se o cenário continuar assim vai ter estabelecimento fechando as portas”, afirma.

Na opinião do especialista, vários fatores contribuíram para a escassez de água e não apenas a falta de chuva. "Realmente faltou planejamento para enfrentar uma falta de recurso hídrico que já vinha sendo sentida há alguns anos. Não se investiu, por exemplo, em uma infraestrutura de retenção de água. Mas quem imaginaria uma seca violenta como essa?", indagou.

Rio e São Paulo

A situação do abastecimento de água também tornou complexo o panorama do setor industrial no Rio de Janeiro e em São Paulo. No Rio, o Governo exigiu que indústrias de grande porte, como a Companhia Siderúrgica do Atlântico (CSA), Gerdau e Furnas, passem a empregar resíduo da Companhia Estadual de Águas e Esgotos (Cedae) em sua produção para liberar mais água do Rio Guandu para a população. A mesma exigência será feita à Refinaria Duque de Caxias (Reduc), que absorve até dois metros cúbicos por segundo.

Em São Paulo, a indústria intensificou o reúso da água no processo de produção, além de economizar e reduzir o volume anteriormente utilizado. Além disso, a Fiesp está estudando o potencial das águas subterrâneas para o setor. Nas áreas de maior concentração de empresas, a ideia é que haja investimentos para se obter um volume adicional de água, fazendo perfuração de poços artesianos.

Em entrevista à Agência Brasil, o diretor do Meio Ambiente da Federação da Indústrias do Estado de São Paulo (FIESP), Nelson Pereira dos Reis, afirmou que 60 mil estabelecimentos do setor, da Grande São Paulo e da região de Campinas, devem ser afetados pela falta de água. Eles representam quase 60% do PIB industrial do Estado. "Não é difícil imaginar o que a escassez de água pode representar para a atividade econômica da indústria na região" afirmou Reis.

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