_
_
_
_
_
Opinião
Texto em que o autor defende ideias e chega a conclusões basadas na sua interpretação dos fatos e dados ao seu dispor

“A decisão do juiz abre um perigoso precedente de privação da liberdade”

Quatro deputados denunciam as "arbitrariedades cometidas" nas prisões preventivas no Rio

Em que pese nossa posição clara a respeito da defesa da legalidade e das garantias constitucionais, alguns parecem não ter entendido muito bem as questões que nos levaram, enquanto defensores dos Direitos Humanos, a denunciar arbitrariedades cometidas pelo juiz fluminense e fazer Reclamação a respeito na Corregedoria do Conselho Nacional de Justiça.

A matéria veiculada domingo, durante o programa da TV Globo e replicada em outros telejornais, da própria emissora e também de terceiros, traz à tona – de maneira equivocada, mas não despretensiosa – atos passados de violência contra o patrimônio público e privado e ações irresponsáveis nas ruas que redundaram, inclusive, na morte do cinegrafista Santiago Andrade. Tudo devidamente condenado por nós, à época. A questão atual e questionada não pode ser misturada a essas e se refere à prisão de ativistas cuja participação violenta em manifestações ainda era mera suposição, carente de provas e de fatos determinados e especificados caso a caso.

Mais informações
“Meu filho não é um black bloc nem líder de nada, só um idealista”
O Uruguai nega asilo para uma ativista refugiada no consulado
Elisa Quadros, a ‘Sininho’ revolucionária
O PT condena a prisão de ativistas no Rio
A polícia prende 19 ativistas anti-Copa

A Reclamação não é, não pretendeu ser e está longe de ser uma defesa da violência ou da depredação, como insinuou a matéria da revista semanal eletrônica da Globo, por meio de uma edição e uma dramatização tendenciosa que almejava claramente jogar a opinião pública contra nós, parlamentares que defendemos - também neste caso - o Estado Democrático de Direito e as garantias jurídicas desrespeitadas pelo juiz e pela polícia do Rio de Janeiro.

Além de repudiar a associação entre nossa ação e a violência ocorrida em manifestações passadas, esclarecemos o que devia ser óbvio: nossa iniciativa se deve às violações das garantias constitucionais como a ampla defesa e o devido processo legal, resguardando, sempre, a máxima da presunção de inocência até que reste comprovada a culpa. A decisão do magistrado de primeira instância abre um perigosíssimo precedente de privação da liberdade individual fundamentado em previsões.

Portanto, repetimos que a Reclamação Disciplinar contra o juiz não defende a prática de atos de violência, muito menos agressão a pessoas ou a depredação de bens públicos e privados, mas sim o posicionamento já explicitado pelo Supremo Tribunal Federal de que não cabe à autoridade judiciária o poder de definir padrões de conduta cuja observância implique restrição aos meios de divulgação do pensamento. Garantir este entendimento é garantir que a própria população não seja tolhida do seu direito à manifestação de pensamento ou do direito legítimo de ir às ruas e fazer ouvir sua voz. Na nossa compreensão - e de muitos juristas - não se deve militar por suas concepções políticas através da função jurisdicional. Este seria um desvio de função, que foi corrigido, em parte, pelo desembargador Siro Darlan, ao deferir os pedidos de habeas corpus de todos aqueles que não haviam sido presos em flagrante, iniciando uma disputa de decisões judiciais que tem repercutido internacionalmente.

Já não bastassem as arbitrariedades cometidas até aqui, aos advogados das pessoas presas foi criada uma série de dificuldades para acesso ao teor das denúncias, o que viola também o princípio do acesso à Justiça. Todavia, a TV e o jornal O Globo tiveram acesso ao Inquérito Policial que faz parte de uma denúncia do Ministério Público que tramita em segredo de justiça.

Cobramos, então, a verdade dos fatos e nos posicionamos contra qualquer decisão arbitrária por parte de qualquer "autoridade competente". A ação de grupos organizados que empreguem qualquer tática que transborde o direito à manifestação pacífica, sejam estes de ativistas ou da polícia, não encontra a mínima forma de apoio da nossa parte. Se há comprovação de atos por parte de qualquer um dos acusados, que o devido processo legal observe todas as garantias constituídas e o direito à ampla defesa.

Fiscalizar os atos do Judiciário jamais poderá ser confundido com "irresponsabilidade democrática", ou mesmo "dificuldades de convivência com o Estado Democrático de Direito", como alegaram, em nota, o Tribunal de Justiça do estado do Rio de Janeiro e a Associação de Magistrados do estado. Argumentar que o questionamento é uma mera tentativa de 'politizar a questão' é desqualificação da função constitucionalmente atribuída aos membros do Parlamento, inerente ao processo democrático com o qual não temos nenhuma dificuldade de convivência. Antes, primamos pela observância aos seus princípios.

Convidamos a Associação de Magistrados do Estado do Rio de Janeiro para debater o que seria a "irresponsabilidade democrática" e por qual razão uma denúncia a um Conselho formalmente constituído deva ser entendida como ataque a um magistrado.

Assinam a nota os deputados Jean Wyllys (PSOL/RJ), Ivan Valente (PSOL/SP), Chico Alencar (PSOL/RJ) e a deputada Jandira Feghali (PC do B/RJ)

Arquivado Em

Recomendaciones EL PAÍS
Recomendaciones EL PAÍS
_
_