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Um ato contra prisões de manifestantes acaba com cinco detidos em São Paulo

Dois dos presos eram advogados ativistas que atuam nos protestos. Um deles teria desmaiado dentro da viatura policial após ser agredido

O advogado Daniel Biral ao ser detido.
O advogado Daniel Biral ao ser detido.Marlene Bergamo/Folhapress

Um ato em protesto contra a prisão arbitrária de manifestantes e a repressão policial terminou nesta terça-feira, na Praça Roosevelt, na região central de São Paulo, com cinco novas pessoas detidas, duas delas que pertencem a um grupo de advogados ativistas que, segundo a polícia, teriam cometido desacato à autoridade. Testemunhas afirmam que eles pediram a identificação de Policiais Militares que estavam sem o nome, algo que não é permitido.

O grupo de cerca de 300 pessoas era formado na maioria por estudantes e funcionários da Universidade de São Paulo (USP), onde trabalha Fábio Hideki Harano, de 26 anos, que foi preso com outro ativista após um ato no último dia 23 de junho, em São Paulo. Os manifestantes acusam a Polícia Militar de ter plantado provas contra ele, com o objetivo de intimidar os movimentos sociais que têm protestado desde junho do ano passado, quando os grandes atos começaram a tomar as ruas. A versão foi confirmada pelo padre Júlio Lancelotti, um conhecido ativista pelos direitos humanos, que presenciou a prisão de Harano, em um vídeo divulgado pelo grupo Advogados Ativistas, que têm circulado na internet.

Dois dos presos no ato desta terça, Daniel Biral e Silvia Daskal, faziam parte desse grupo de defensores, que auxilia os detidos nos protestos. Segundo os manifestantes, os dois foram colocados à força em um carro da PM depois de Daskal questionar os motivos de os policiais presentes estarem sem a identificação nas fardas, algo visto por diversas vezes nos protestos do ano passado, muitos deles marcados por desproporcional violência policial.

Os jornalistas relatam que foram intimidados pelos policiais ao gravarem o momento da prisão. Em uma foto que foi divulgada após o episódio, Biral, já na delegacia, aparece com marcas vermelhas no rosto e no pescoço. O padre Júlio, presente no ato desta terça, afirmou que ele apresentava muitas marcas pelo corpo e chegou a desmaiar dentro do carro da polícia. “Bateram nele. Estamos em uma guerra declarada”, afirmou.

Segundo a Polícia, os dois advogados detidos ofenderam e empurraram os policiais militares. Eles foram levados para a delegacia, onde assinaram um termo circunstanciado de desacato e foram liberados. Casos de abuso, segundo a Polícia, devem ser denunciados à Corregedoria.

Outras três pessoas também foram levadas do ato em carros da PM. Um deles é um artesão vendedor de flautas que, de acordo com a Secretaria de Segurança Pública, teria ofendido a Tropa, se afastado e retornado com "uma mochila volumosa e incitado um grupo de cerca de 50 manifestantes contra três policiais". Neste momento, os policiais atiraram gás lacrimogêneo em direção à multidão. Depois, o artesão foi detido e na delegacia assinou um termo circunstanciado de resistência e foi liberado. Os outros dois detidos eram dois irmãos de 29 e 30 anos que, segundo a Secretaria, "xingaram os policiais". Os dois também já foram liberados. Um deles afirma que foi agredido pelos policiais. PMs também lançaram spray de pimenta contra jornalistas que cobriam o protesto, segundo o jornal Folha de S.Paulo.

O ato iniciado por volta das 18h foi permeado por momentos tensos desde o início. A polícia cercou a praça onde ele ocorreu com um forte aparato policial, que incluiu a cavalaria. “Estamos sitiados, é isso que está acontecendo. Tenho medo de sair daqui sozinha”, disse uma das manifestantes identificada como Ana Paula. No início do ato, muitos dos presentes tiveram suas mochilas e bolsas revistadas pelos policiais que faziam a segurança do ato.

Foi justamente após uma dessas revistas que Fábio Harano, o funcionário da USP de 27 anos, foi preso no ato do dia 23 de junho. Segundo o secretário de Segurança Pública de São Paulo, Fernando Grella, ele faz parte dos primeiros adeptos da tática black bloc, grupo de manifestantes que usa máscaras e roupas escuras e quebra “símbolos do capital”, como bancos e lojas, durante os atos. Harano, um sindicalista, ex-estudante da USP, de origem oriental, óculos e cabelos longos presos em um rabo de cavalo, foi colocado pelos PMs dentro da viatura policial e obrigado a ficar sentado sobre as próprias mãos, conforme mostra um vídeo gravado no momento da prisão dele.

“Os policiais não encontraram absolutamente nada com ele que fosse suspeito. Havia um pacote de salgadinho sabor pimenta, uma máscara usada para se proteger do gás e vinagre [tempero usado pelos manifestantes para amenizar os efeitos do gás lacrimogêneo lançado pela polícia]”, disse o padre Júlio nesta terça. Ele estava perto de Harano no momento da prisão. Segundo a polícia, ele levava explosivos em sua mochila.

Depois de detido, Harano foi levado ao Centro de Detenção Provisória (CDP) do Tremembé, por onde já passaram diversos pessoas acusadas por homicídios famosos. De lá, ele mandou um recado, reproduzido em uma página no Facebook que pede a liberdade do rapaz: “Tenho a consciência completamente limpa, pois participar de manifestação de rua está longe de ser crime (...) Passei meu aniversário de 27 anos [nesta terça] em uma cela da qual não saí, alvo de acusações completamente sem fundamento”. No mesmo dia da prisão de Harano, foi detido o professor Rafael Marques Lusvargui, de 29 anos, também por desacato à autoridade.

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