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“Os brasileiros do Burger King inspiraram um modelo de gestão global”

Cristiane Correa, autora da obra sobre o 1º, 4º e 8º homens mais ricos do Brasil, diz que o trio de empresários que adquiriu a marca Heinz e a rede Burger King valoriza os talentos internos

A jornalista Cristiane Correa em seu escritório em São Paulo.
A jornalista Cristiane Correa em seu escritório em São Paulo.Divulgação

O suíço-brasileiro Jorge Paulo Lemann sempre foi discreto. Para vencer esse muro e contar a história do homem que liderou a formação de um conglomerado que inclui a AB InBev, maior cervejaria do mundo, a fabricante de alimentos Heinz, a cadeia de fast food Burger King, entre outros empreendimentos, a jornalista Cristiane Correa foi a almoços, frequentou eventos e até aprendeu a jogar tênis para ter assunto com ele e com seus principais sócios, Marcel Telles e Carlos Sicupira. No entanto, a autorização não veio. Decidiu, então, escrevê-lo do mesmo jeito. E ouviu como resposta que poderia ir adiante. Sem ajuda. Em entrevista ao EL PAÍS em seu escritório no bairro de Pinheiros, ela falou sobre a fórmula de negócios do trio. O próximo projeto de Correa é um livro sobre Abilio Diniz, um controvertido empresário brasileiro.

Pergunta. O que chama mais atenção no modelo de negócio adotado por Jorge Paulo Lemann e seus sócios, Marcel Telles e Carlos Sicupira?

Resposta. A agressividade no corte de custos. Não há distribuição de cerveja de graça na AB InBev. E a gente sabe que há algumas empresas de bem de consumo que oferecem desconto para funcionários. Para eles isso não existe. Funciona assim: aqui você vai trabalhar muito e se der resultado vai ganhar bem e poderá fazer o que quiser com o seu dinheiro.

Considero que a gestão de Lemann, Sicupira e Telles é muito inspirada na administração norte-americana, com alguma pitada tropical."

P. Como foi o crescimento dos negócios do trio no exterior?

R. Eles começaram a se internacionalizar comprando outras empresas principalmente na América Latina. Em 2004, fizeram uma associação com os belgas da Interbrew. São raras as empresas brasileiras que crescem no exterior e mais raras ainda aquelas que conseguem levar seu perfil de gestão para fora. Principalmente empresas de bem de consumo.

P. Qual a influência do Banco Garantia, origem dos negócios do trio, no mercado financeiro brasileiro?

R. A meritocracia é o maior legado. Além disso, a sociedade aos funcionários e a busca por gente competente. Isto tudo serviu como inspiração para o sistema financeiro brasileiro como um todo. O banco de investimentos de mais sucesso no Brasil hoje é o BTG Pactual, de André Esteves, que é uma costela do Garantia. O BTG foi fundado pelo ex-sócio do Garantia Luiz Cezar Fernandes com as mesmas premissas. Agora, eles conseguiram superar isso, inspirando também um modelo de gestão de empresas global, já que a AB InBev está no mundo todo, assim como o Burger King e a Heinz.

Se a gente for pensar na gestão brasileira como algo que usa o improviso e o jeitinho, no caso deles é tudo cartesiano e bem planejado."

P. O tipo de gestão das empresas brasileiras começa a se parecer mais com o norte-americano?

R. Sinceramente, acho difícil chamar algum modelo de padrão de gestão brasileira. Pegando o caso de Lemann, Sicupira e Telles, por exemplo, considero que a gestão deles foi muito inspirada na administração norte-americana, com alguma pitada tropical. Se a gente for pensar na gestão brasileira como algo que usa o improviso e o jeitinho, no caso deles é tudo cartesiano e bem planejado. Algumas empresas brasileiras já estão indo para o lado da meritocracia. Mas ainda é pequeno o movimento das que tornam seus funcionários sócios.

P. Como você avalia a transição do trio do mundo financeiro para empresas de bens de consumo?

R. Eles foram para algo completamente diferente. Especialmente se você for pensar que no mercado financeiro brasileiro dos anos 1980, com a hiperinflação, o sujeito só estava preocupado em terminar o dia. Quando eles começaram a comprar empresas, eles precisaram passar a pensar em planejamentos de longo prazo. No caso da Ambev, havia a necessidade de construir fábricas de cerveja e eles não sabiam nada disso. Mas algo único deles é que eles não têm vaidade de dizer que não sabem. E foram buscar em todos os seus negócios os melhores exemplos existentes, como o Wal-Mart e as grandes cervejarias do mundo.

P. Como você resume o tipo de trajetória do trio?

R. A história deles não é meteórica. Eles são sócios há 40 anos e desenvolveram uma visão de longo prazo. A compra da Ab InBev foi um projeto de 20 anos.

P. Dá para fazer uma comparação entre Abilio Diniz, protagonista do seu novo livro, com o trio?

R. Ele tem 76 anos e continua querendo fazer coisas grandes.

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