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A executiva do Facebook que quer mais chefas

Sheryl Sandberg, número dois do Facebook, combate uma cultura corporativa dominada pelos homens, enquanto faz brilhar as contas da rede social

Jorge Restrepo

Poucas altas executivas confessam publicamente que organizam as reuniões de trabalho do período da tarde em um edifício da empresa diferente do seu para que, na saída, passe despercebido que vão para casa jantar com os filhos em vez de voltar para o escritório. Tampouco é habitual que uma graduada de Harvard, que com 45 anos tem uma fortuna estimada em 1 bilhão de euros (cerca de 3,5 bilhões de reais) dê detalhes sobre as náuseas que sofreu durante a primeira gravidez, os quase 32 quilos que engordou e como um dia foi “andando como um pato” para o escritório de seus chefes de então –os fundadores do Google, Larry Page e Sergey Brin– para pedir-lhes vagas de estacionamento para mulheres grávidas que estivessem perto da entrada. Sheryl Sandberg, a número dois do Facebook, fez o que outras executivas preferem evitar por medo de não serem levadas a sério: falar abertamente sobre o porquê de a cultura corporativa continuar sendo dominada por homens.

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Sua experiência pessoal no competitivo mundo dos negócios, no qual atingiu o topo, foi embalada em algumas palestras que se tornaram virais, um livro best-seller, Lean in [cuja edição brasileira recebeu o título de Debruçar-se], e uma fundação que promove a igualdade por meio de múltiplos círculos de apoio no Facebook, tão bem-sucedidos que atraem milhares de pessoas em todo o mundo. “Quando em 2010 eu comentei com um grupo de pessoas que estava pensando dar uma palestra sobre mulheres, me disseram para não fazer isso, pois não se podia ser uma executiva de prestígio e falar sobre como é ser mulher”, contou. “Pensei na pergunta que meu atual chefe, Mark Zuckerberg, faria: o que você faria se não tivesse medo? E eu o fiz”.

A mensagem que saiu daquela conferência, e que Sandberg poliu nos anos seguintes com o mesmo profissionalismo com que projeta a estratégia operacional do gigante de Silicon Valley, provocou indignação e entusiasmo. Sandberg diz que as mulheres, de alguma forma, se rendem voluntariamente antes de tentar chegar ao topo, acreditando que sua carreira perderá fôlego se tiverem filhos. A diretora de operações do Facebook as encoraja a seguir em frente para conseguir o que querem sem pensar no que vai acontecer quando tiverem família. E, se a têm, que lutem por “postos de trabalho que representem um desafio” e, se possível, que tentem sair em um horário decente para jantar com os filhos, como ela faz (claro, depois de colocá-los na cama, ela volta a se conectar com o trabalho). “As mulheres têm de parar de pensar que não estão preparadas para fazer isso e se convencerem de que querem fazê-lo; logo aprenderão como”, diz em seu livro – como ela descreve, “uma espécie de manifesto feminista”– no qual insiste em como as mulheres têm mais dificuldade para mostrar suas vitórias.

Quando um menino se mostra forte, é chamado de líder; quando é uma menina, é mandona", disse

Os críticos a recriminaram dizendo que sua mensagem é dirigida, de fato, às elites. Que sua confortável posição lhe permite contratar todo o pessoal doméstico que necessite e definir as regras no escritório. Anne-Marie Slaughter, professora de Princeton que deixou seu cargo no Departamento de Estado dos EUA em 2011 por considerá-lo incompatível com sua vida familiar, lamenta que se concentre nos “obstáculos internos” das mulheres, mais do que nos problemas institucionais que a maioria acaba enfrentando. A pergunta, segundo ela, é o que devem fazer as empresas, não apenas suas funcionárias, para que haja mais mulheres no topo.

No entanto, Sandberg é um modelo para muitas profissionais. “Não é nenhum segredo que as mulheres em todo o mundo têm dificuldade para ascender por várias razões. Modelos como Sandberg estão mudando isso. Ela subiu na carreira, mas também defendeu constantemente os direitos das mulheres trabalhadoras no escritório e em casa”, explica uma de suas admiradoras, Miranda Brawn, advogada e banqueira de investimentos em Londres, em um e-mail. “Sandberg fala muitas vezes de como as mulheres líderes são menos apreciadas do que seus colegas do sexo masculino e como a falta de confiança em si mesmas é seu maior obstáculo. Ela acredita que as pessoas têm de se sentir confortáveis com mulheres líderes, inclusive as próprias mulheres. Não é apenas uma executiva em uma grande empresa; é uma verdadeira líder”, acrescenta. “Não acredito que a mensagem seja que é necessário ascender acima de tudo, mas que saibamos que podemos”, diz Brawn.

Ela acredita que as mulheres renunciam a chegar ao topo, acreditando que sua carreira vai perder fôlego ao serem mães

Antes de se tornar uma espécie de guru do feminismo, Sandberg era mais conhecida como gênio das vendas em Silicon Valley, o que já é uma provocação, dado o escasso peso das mulheres no setor tecnológico. Durante sete anos (2001-2008), foi uma das principais responsáveis de que o Google, o motor de busca mais popular, mas que tinha pouco faturamento, se transformasse numa máquina de publicidade. O Facebook a contratou depois para fazer algo parecido. Ela conseguiu em dois anos. “Há pessoas que são grandes gestores e pessoas muito analíticas, muito focadas na estratégia. Essas duas tipologias não costumam coincidir na mesma pessoa”, disse Zuckerberg sobre ela.

Sandberg nasceu em 1969, em Washington, em uma família de classe média. Quando ela tinha dois anos, se mudaram para a Flórida. Seu pai é oftalmologista. A mãe abandonou o doutorado e o emprego como professora de francês para cuidar dela e dos dois irmãos. Estes costumam lembrar como a pequena Sheryl, mais do que brincar, organizava as brincadeiras dos demais. “Fomos seus primeiros funcionários”, brincou o irmão. “Quando um menino se mostra forte, é chamado de líder; quando é uma menina, corre o risco de ser chamada de mandona”, disse Sandberg. A executiva lançou uma campanha em 2014 que propunha a proibição do uso dessa palavra para as meninas que apresentam habilidades de chefes. Foi bastante controversa (para alguns, sua atitude foi, precisamente, um pouco mandona).

Os três irmãos estudaram em escola pública, onde Sandberg era conhecida por tirar as melhores notas. Graduou-se em Economia em Harvard. Larry Summers a contratou em 1999, com 29 anos, para trabalhar no Tesouro. Em seguida, trabalhou na consultora McKinsey e passou pelo Banco Mundial. Sua família sempre a incentivou a se casar jovem e ela o fez, aos 24 anos, mas a relação durou apenas um ano. Em 2004, ela se casou com Dave Goldberg, um executivo de sucesso do Silicon Valley, a quem Sandberg, atribui grande parte de seu próprio sucesso, por apoiá-la durante toda sua carreira e dividir os cuidados com seus dois filhos. Goldberg morreu em maio, em um acidente com uma esteira de correr no México, onde passavam as férias.

Alguns meses antes, a diretoria tinha lançado uma iniciativa por meio da Lean In, sua fundação, com conselhos para que os homens contribuíssem para a igualdade. Junto com as recomendações gerais, mensagens de apoio de Warren Buffett e Hugh Jackman, inclusive uma foto do ator no Instagram em que aparece e jogando o lixo fora, que em poucos dias obteve 57.000 “curtir”.

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