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“O Periscope mostra o lado B de um evento, não concorre com a mídia”

Especialista em computação revela os segredos do fenômeno social do ano

Kayvon Beykpour, fundador e diretor-presidente do Periscope
Kayvon Beykpour, fundador e diretor-presidente do Periscope

Apertar um botão e transmitir ao vivo diretamente do celular: essa é a magia do Periscope, muito simples, mas também com um grande potencial. A fórmula para o sucesso é a completa integração com o Twitter. A rede social comprou o serviço antes de ficar pronto para combater o crescente interesse despertado pelo aplicativo Meerkat. A estratégia funcionou. Tornou-se o meio mais popular para acompanhar eventos, humoristas, manifestações e shows. Não há uma programação, o conteúdo expira após 24 horas e, embora o vídeo seja vertical, a princípio criticado, o aplicativo consagra-se como a opção adequada para transmissões através do celular. Com menos de três meses de vida, tornou-se o meio audiovisual preferido de celebridades, redes de televisão, atletas e usuários que descobrem uma janela direta para mostrar o que os rodeia em tempo real.

Emissão ao vivo através do Periscope.
Emissão ao vivo através do Periscope.

Nos primeiros 10 dias, o Periscope conseguiu um milhão de usuários ativos. Foi concebido em inglês e para o iPhone. Dois meses depois, estreou no Android e em vários idiomas como japonês, espanhol, francês, italiano, alemão, russo, português, turco, polonês, árabe, checo, chinês ou hebraico. Kayvon Beykpour, fundador e diretor-presidente do Periscope, nasceu em 1988, perto de San Francisco. Estudou ciência da computação na Universidade Stanford. Faz parte dessa geração cuja infância foi marcada pela Internet.

Pergunta: Como surgiu a ideia de criar o Periscope?

Resposta: Conheço meu amigo Joe (Joseph Bernstein) desde a quarta série. Desde pequenos compartilhamos a paixão por computadores e programação. A gente se dá muito bem. Durante uma viagem, pensamos em como seria contar a todo mundo o que acontecia ao nosso redor em vídeo, sem complicações. Em vez de deixar aquilo na fantasia, fomos atrás. Seis meses depois, já tínhamos um protótipo.

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P. Antes de finalizar o aplicativo, já tinham vendido o produto ao Twitter, por quê?

R. Porque tínhamos uma visão global, queríamos atingir o maior público possível ao vivo. Isso só se consegue aliando-se ao Twitter. Eles oferecem 140 caracteres, com vídeo e foto, mas não transmitiam ao vivo. Nós sim. Estávamos totalmente alinhados. Agora somos uma startup com recursos . Não somos ricos, mas não temos que nos preocupar com o nosso dia a dia, apenas em tornar o Periscope cada dia melhor.

P. Durante mais de um século nos acostumamos a ver filmes e televisão na horizontal, de forma oblonga. Mesmo na Internet, mesmo sendo um 4:3 ou 16:9, o vídeo era horizontal. Vocês se consideram revolucionários?

R. Não. E também não vemos sentido no debate. Decidimos nos limitar a como se usa o celular. Se queremos fazer algo para o telefone, temos de pensar no usuário. Caso contrário, não teria sentido. Nossa plataforma é naturalmente móvel.

Os meios que se juntaram procuram se aproximar dos apresentadores, das estrelas, para contar de outra maneira”

P. Quais são os usuários mais entusiastas do Periscope?

R. O espectro é muito amplo. De músicos que estreiam canções ao vivo com o Periscope a pessoas que participam de um protesto. Há celebridades que interagem e respondem a perguntas dos fãs, participantes do Google I/O (a conferência anual do buscador). A coisa mais surpreendente foi encontrar a hashtag #scopetalenteshow, uma espécie de concurso improvisado de magia, imitações, piadas, músicas. Agora formam um Festival Periscope, com talentos globais. Às vezes, convidamos alguns dos artistas que descobrimos assim para ir ao escritório.

P. A luta de boxe entre Pacquiao e Mayweather, em Las Vegas, multiplicou a popularidade do seu aplicativo. Despertou muita polêmica porque rompeu a exclusividade da TV paga. Vocês se consideram concorrentes para valer?

R. Absolutamente. No boxe, no basquete, no beisebol, a televisão tem ângulos, replays, definição... O Periscope serve para se ter uma ideia de algo em primeira pessoa. Você pode mostrar o lado B, a parte de trás de um grande evento, mas nunca competir. Os meios que se juntaram procuraram se aproximar dos apresentadores, das estrelas, para contar de outra maneira. É complementar.

P. Quando saíram os óculos do Google, alguns lugares se precipitaram em proibi-los porque atentavam contra a privacidade de seus clientes. Pode acontecer o mesmo com o Periscope?

R. Neste momento, como sociedade, já percorremos um longo caminho juntos. O conceito de privacidade mudou. O fato de que todo mundo tenha um telefone celular com uma câmera de qualidade notável nos tornou mais conscientes do nosso poder, mas também da nossa responsabilidade. Se eu tiver que decidir, estou mais do lado da transparência, eu acho que é bom para o mundo.

P. Quando você lançou seu aplicativo, existia o Bambuser. Na Espanha, ele foi utilizado com muito sucesso durante o movimento 15M...

R. Sim, havia outros concorrentes, mas nenhum com as nossas facilidades e potencial social. Você só precisa dar dois toques e ele entra no ar! No Bambuser, não havia notificações para avisar de uma transmissão. Se você estivesse assistindo, ótimo, caso contrário não tomava conhecimento.

P. E o que acha do Meerkat?

R. Acho que o nosso produto é melhor. Damos mais atenção ao usuário. Por exemplo, nós temos feedback em tempo real com os corações. Eles servem para incentivar a transmissão. Assumimos que ninguém é apresentador profissional, não somos especialistas, mas se você está dando conselhos nos comentários, entende melhor o que o seu público pede. Temos a repetição, eles não. Embora, na verdade, nós não pensamos muito neles, mas em fazer o nosso caminho.

Não esperávamos o entusiasmo do Brasil. Explodiu quando lançamos o aplicativo no Android. Na América Latina, tínhamos poucos usuários, mas bastou sair nos celulares do Google e foi uma loucura absoluta no Chile e na Argentina"

P. Quais países estão mostrando mais interesse no Periscope?

R. Não esperávamos o entusiasmo do Brasil. Explodiu quando lançamos o aplicativo no Android. Na América Latina, tínhamos poucos usuários, mas bastou sair nos celulares do Google e foi uma loucura absoluta no Chile e na Argentina. Na Europa, Itália, Turquia e Reino Unido tiveram alto nível de atividade desde o início.

P. Por quanto tempo uma transmissão fica guardada?

R. Apenas 24 horas, se o usuário quiser. Não é uma questão de dinheiro, de poupar em servidores, agora são baratos, mas de filosofia. A vida do conteúdo social é curta. No Twitter, se uma mensagem não é vista no mesmo dia, ela não será vista, salvo exceções. As pessoas procuram o que é recente.

P. Alguns políticos espanhóis talvez não pensem o mesmo, suas contas são examinadas em detalhes...

R. Essa é uma das exceções, claro, mas não a norma.

P. Vocês seguiram o padrão clássico de sair primeiro no iPhone e depois no Android. Que diferenças vocês notam?

R. A funcionalidade é muito semelhante, mas queríamos fazer assim. No Android você pode editar o nome de usuário e usar o mapa de forma diferente, mas a essência é semelhante. Desde que o Android usa o material design [um desenho claro da interface], não está muito distante do iOS. Não se tratava de fazer uma cópia, mas algo bonito, significativo, em ambas as plataformas.

P. Você falou do feedback mandando corações, não é um pouco ingênuo?

R. É simples, direto. Ou seja, se você gosta ou não. Poderíamos ter colocado sorrisos, ou talvez aplausos, mas achamos que os corações são um bom indicador, que motivam a continuar transmitindo.

P. Será que vamos ver canais oficiais, algo como contas autenticadas?

R. Queremos encontrar a fórmula para descobrir o que você gosta, mas isso talvez não se encaixe na ideia tradicional de canal. Seria algo como “o que você quer ver”, com recomendações sob medida.

Por enquanto não pensamos em monetização. Temos apenas três meses de atividade. Só queremos experimentar”

P. Existe alguma maneira de anunciar que algo vai ser transmitido, de fazer previsões?

R. Não, nós retiramos isso. Não seria algo novo, espontâneo. Se você quiser, pode dizer pelo Twitter, mas não dentro do Periscope.

P. Qual é o seu modelo de negócio?

R. Por enquanto não pensamos em monetização. Temos apenas três meses de atividade. Só queremos experimentar. Depois veremos. A prioridade é fazer um grande produto. Estamos muito orgulhosos da equipe, da ambição. Temos fome em melhorar. Agora temos de fazer ainda melhor. Fiquem atentos, pois haverá surpresas.

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