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Coluna
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A lição de Scolari

Assumir responsabilidades, sem adiar indefinidamente a resolução de nossos problemas, é a única saída possível da atual tragédia futebolística

Que lição podemos tirar da tragédia ocorrida no Mineirão na última terça-feira? Sim, porque, embora não quiséssemos, estávamos até prontos para acatar uma derrota para os alemães – tínhamos mesmo uma boa desculpa, a ausência do craque Neymar e do imprescindível zagueiro Thiago Silva – mas ninguém nunca está preparado para aceitar uma tragédia. Uma tragédia, nos moldes clássicos, se constrói com heróis conduzindo suas histórias rumo à destruição, sem que o saibam. E foi isso que presenciamos em Belo Horizonte.

Os deuses são caprichosos. Armaram o espetáculo, deixaram que algumas batalhas, de menos importância, fossem vencidas, e ainda, de quebra, afastaram dos palcos um dos protagonistas para deixar as testemunhas confusas. E empurraram para o campo da batalha final um exército abalado, mas confiante, que contava na retaguarda com uma torcida fanática, alicerçada em um passado de feitos gloriosos. Além do mais, ampliando o enredo, transformaram a simples luta por um troféu num combate que poderia definir os rumos de toda uma nação.

Uma tragédia não pode ser explicada. Seus delineamentos fogem da compreensão humana – são arquitetados naquela zona de sombra que uns chamam destino, outros, acaso. São singulares, inigualáveis, incomparáveis. Uma tragédia serve apenas como ponto de inflexão, a partir do qual podemos construir uma nova narrativa. Ela ilumina nossa fragilidade, nossa limitação e, até por isso, nos ajuda a trilhar novos e melhores caminhos. A tragédia é catártica, porque purifica nossos sentimentos.

Então, que lição devemos tirar da humilhante goleada sofrida pelo Brasil contra a Alemanha? Ao fim da partida, as cenas mostraram alguns jogadores brasileiros atônitos, chorando inconsoláveis sem conseguir deixar o palco. Poucos perceberam que, nesse momento, o técnico Luiz Felipe Scolari reuniu o time inteiro e disse, com todas as palavras, que a responsabilidade por aquela derrota era única e exclusivamente dele. Seu discurso não mudou o resultado do jogo, não amainou em nada o constrangimento de seus comandados, nem diminuiu a decepção dos milhões de brasileiros que acompanharam o vexame histórico. Mas sua atitude foi, certamente, uma louvável demonstração de dignidade.

Uma das características que mais irritam os estrangeiros quando lidam com os brasileiros é a incapacidade que temos de assumir responsabilidades frente aos nossos erros. Misto de covardia e vergonha, arrumamos desculpas as mais diversas para tentar justificar nossas falhas – a culpa é sempre imputada ao outro, seja o outro uma pessoa ou uma conjuntura desfavorável. Dificilmente, quando confrontados com nossa imperícia para realizar determinadas ações, admitimos nossa inépcia. E, se comportando assim, evitamos ver nossa imagem no espelho, ao mesmo tempo, e por isso mesmo, adiamos indefinidamente a resolução de nossos problemas.

A Copa do Mundo terminou para nós. Pouca diferença faz se acabamos em terceiro ou quarto lugar. O trauma dessa tragédia futebolística perdurará por gerações. Mas devemos acordar do pesadelo e olhar de frente para a complexa realidade existente para além dos estádios de futebol. Temos problemas estruturais graves, que se não forem atacados logo, carcomerão todo e qualquer esforço no sentido de transformar o Brasil num país decente, que ainda não somos. Portanto, a lição que podemos e devemos tirar do abismo em que se refugiou nossa autoestima é: somos sim, cada de um nós, em maior ou menor grau, responsáveis pela atual situação do Brasil. E o que temos feito para mudar isso?

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