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Mandetta confirma compra de milhões de testes de coronavírus na China, mas levanta suspeitas sobre Pequim

Em meio à tensão diplomática provocada por Eduardo Bolsonaro, ministro insinua que Governo chinês pode ter omitido dados. Mortes no Brasil chegam a 25

Vendedor de rua em São comercializa álcool em gel.
Vendedor de rua em São comercializa álcool em gel.NELSON ALMEIDA (AFP)
Marina Rossi

O Ministério da Saúde anunciou neste domingo contabilizar 25 óbitos e 1.546 casos confirmados do coronavírus até o momento no Brasil. Foi um aumento de 418 notificações entre sábado e domingo, ou 37% de crescimento. As autoridades de saúde admitem que estamos chegando perto de um cenário “crítico” por causa da velocidade de aumentos de casos, mas confiam na capacidade de reação do SUS e na compra de 10 milhões de testes rápidos da doença —que serão adquiridas de um fornecedor chinês e ainda não têm data para chegar ao país— para atravessar o pior.

O panorama foi descrito pelo ministro Luiz Henrique Mandetta de maneira cordata durante a maior parte do tempo no encontro diário que a pasta da Saúde promove com os jornalistas. Aproveitando a transmissão direta e ao vivo pelas TVs, Mandetta deu dicas diretas à população. Recomendou, por exemplo, por motivos de segurança, o uso preferencial de água sanitária a álcool líquido para a limpeza dos ambientes.

O ministro só mudou de tom ao falar da China. Mesmo tendo elogiado o Governo chinês dias atrás pela parceria no combate à pandemia, neste domingo Mandetta lançou dúvidas a respeito do manejo que Pequim deu ao coronavírus, insinuando que a ditadura que comanda o país pode ter omitido dados. As declarações têm potencial para aprofundar a tensão diplomática Brasília-Pequim provocada pelo deputado Eduardo Bolsonaro, que também acusou a China de esconder o problema.

“Parece que o que nos mostraram é bem diferente do que nós estamos vendo acontecer aí nos Estados norte-americanos e nós estamos observando isso no mundo ocidental. Ou temos um organismo que se comporta bem diferente, ou é um vírus bem diferente ou é uma história que será narrada pela ciência ocidental”, lançou o ministro, que disse também que só agora, “no mundo livre”, as informações circulam aos “borbotões”.

Há, de fato, um debate sobre transparência nos números da pandemia na China, mas também há amplos elogios à estratégia asiática —não apenas de Pequim, mas também da Coreia do Sul e Japão— ao combater a Covid-19. Seja como for, o posicionamento de Mandetta se chocou com sua defesa, feita minutos, da qualidade dos testes rápidos chineses que o Governo pretende adquirir —como doação da mineradora Vale do Rio Doce, como ele fez questão de ressaltar.

Os 10 milhões de testes rápidos, anunciados no sábado, estão sendo descritos como parte chave da estratégia de combate à doença. Mandetta disse, no entanto, que ainda não sabe quando os kits chegarão. Segundo o ministro, a prioridade é testar primeiro os profissionais de saúde, mas ele não explicou quantos serão destinados a eles e quantos serão para a população em geral.

O cenário também exige, anunciou o ministro, a expansão da produção de respiradores mecânicos —equipamentos que médicos já falam que faltarão nas próximas semanas nos hospitais. Esses respiradores serão essenciais para os casos mais graves da doença, já que ela acomete o pulmão. De acordo com Mandetta, além das duas grandes fabricantes desses aparelhos no Brasil, outras empresas passarão a produzi-los também, além de universidades. Mas o ministro não entrou em mais detalhes.

Favela e projeção populacional

No balanço deste domingo, São Paulo ainda é o Estado com o maior número de casos (631) e óbitos (22), seguido pelo Rio de Janeiro, com 186 doentes notificados e três óbitos. Até então, somente Roraima não tinha nenhuma notificação da doença. Hoje, já são dois os confirmados ali, fazendo com que todos os Estados tenham ao menos um caso de coronavírus confirmado.

Segundo as projeções feitas pelo ministro neste domingo, metade da população brasileira vai entrar em contato com o vírus. Ou seja, cerca de 104 milhões de brasileiros. Desses, ainda segundo Mandetta, 85% não apresentarão sintomas, 15% apresentarão sintomas leves e 5%, sintomas fortes. Isso pode significar 5,2 milhões de pessoas com sintomas graves do coronavírus no Brasil, precisando de atenção médica. “Quando passa de 50% [de infectados], o vírus não consegue se multiplicar mais, porque metade já tem imunidade”, afirmou. “O problema”, diz Mandetta, “é que a doença acometerá muita gente ao mesmo tempo, de maneira abrupta", disse. "Mas o SUS está aumentando a sua capilaridade. O número de leitos vão aparecendo”. No fim de semana, começaram os trabalhos de adaptação do estádio do Pacaembu, por exemplo, em São Paulo, para receber leitos para tratar casos leves. Clubes de futebol também ofereceram sua estrutura.

O ministro também deixou claro que compartilha com os especialistas o temor dos efeitos de uma pandemia como a de Covid-19 em favelas e áreas de habitação precária no Brasil. Em muitas dessas áreas, seguir as medidas de higiene ou cumprir as regras de distanciamento social é apenas impossível. “Sabemos que temos um problema histórico de habitação e por isso pagaremos um preço por termos tolerado favelas, construções... Depois desse episódio acho que esse vai ser um dos pontos de discussão”, disse.

O ministro também defendeu que as eleições municipais, previstas para outubro, sejam adiadas. Sem mencionar nomes, ele disse que municípios e Estados estão tomando “medidas isoladas”, suspendendo os serviços não essenciais, mas sem especificar que serviços são esses e defendendo que as indústrias não podem parar. Neste sábado, o governador de São Paulo João Doria (PSDB) decretou quarentena em todo o Estado a partir de terça-feira. Na sequência, o presidente Jair Bolsonaro assinou um decreto com todos os serviços que não podem ser suspensos e, em entrevista ao canal CNN Brasil neste domingo, chamou Doria de “lunático”.


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