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EDITORIAL
Editoriais
São da responsabilidade do editor e transmitem a visão do diário sobre assuntos atuais – tanto nacionais como internacionais

O que Cuba precisa é de democracia

A revolta contra o regime mostra o esgotamento da população ante a pobreza e a opressão

Policiais prendem manifestantes diante do Capitólio de Cuba, em Havana.
Policiais prendem manifestantes diante do Capitólio de Cuba, em Havana.Ernesto Mastrascusa (EFE)
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A woman shouts pro-government slogans as anti-government protesters march in Havana, Cuba, Sunday, July 11, 2021. Hundreds of demonstrators took to the streets in several cities in Cuba to protest against ongoing food shortages and high prices of foodstuffs. (AP Photo/Ismael Francisco)
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O regime cubano mais uma vez voltou a desperdiçar, como de costume, uma oportunidade histórica. A encenação em abril passado da chegada de um novo tempo com a saída de Raúl Castro do cargo de secretário-geral do Partido Comunista Cubano não poderia ter sido mais frustrante. Nestes meses nada mudou e tudo piorou. É o que ficou evidente nos protestos que neste domingo abalaram a ilha caribenha e cuja extensão e espontaneidade, por mais que o castrismo agora procure inimigos externos, revelam a profundidade do cansaço.

Tudo começou na pequena cidade de San Antonio de Baños, na região de Havana. A falta de eletricidade e de vacinas contra a covid-19 levou algumas centenas de cidadãos a saírem às ruas e exigirem melhorias em suas péssimas condições de vida. Essa manifestação rapidamente se transformou em algo mais. Os gritos de “liberdade” e “abaixo a ditadura” se espalharam como fogo nas redes sociais e acenderam um pavio de esperança em milhares de cubanos. Em Santiago de Cuba, na Havana Velha e em muitos outros cantos do país, os protestos se multiplicaram em uma onda histórica de descontentamento.

A resposta do regime, encabeçada pelo presidente Miguel Díaz-Canel, não foi mais dilacerante porque era previsível. Depois de culpar (outra vez) os Estados Unidos pelo agravamento da situação, convocou as suas hostes para retomar as ruas e procedeu à prisão de centenas de pessoas. Sob o lema “não serão permitidas provocações”, o chefe de Estado agiu como um autômato e deu as costas à realidade cubana.

O Governo cubano pode enganar a si mesmo, mas não a seus cidadãos nem à comunidade internacional. Os protestos ocorridos em 11 de julho são os maiores desde 1994 e talvez marquem um ponto sem volta. A pandemia expôs cruelmente as deficiências do castrismo e exacerbou as penúrias da ilha. Responder com a costumeira “bunkerização ideológica” de nada adianta. Nem sequer a repressão ajudará. Os males de Cuba são excessivos para manter a farsa. E não é enchendo masmorras com oponentes, dissidentes e artistas que eles serão resolvidos.

O eterno desabastecimento, as filas e os danos da covid-19 são parte de um horizonte tétrico onde a fracassada operação de substituição política faz pressagiar à população outra era de dificuldades. São muitas décadas de autoengano. A mudança para a democracia plena é um imperativo moral. E este é um desafio que exige estatura e coesão da comunidade internacional. A Espanha e a UE precisam agir sem demora diante da estratégia imobilista dos Estados Unidos, o grande ator regional.

Não é aumentando o sofrimento dos cidadãos que se abrirá o caminho para a liberdade. Mas tampouco fechando os olhos aos excessos do regime na vã esperança de que tudo mude por si mesmo. É preciso mobilizar-se para acompanhar a democratização que cabe aos cubanos desenvolver; formar uma frente comum que, para além dos interesses geoestratégicos e econômicos, situe no centro da ação um povo devastado pela pobreza e a falta de liberdade. Só pensando em Cuba e na democracia se resolve o problema.

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