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Direita do Chile obtém a maior representação no Senado desde o retorno à democracia

Oposição diminui sua influência na Câmara dos Deputados e a direita conquista um inédito empate entre senadores

Rocío Montes
Elecciones en Chile 2021
Jornais de segunda-feira mostram os resultados eleitorais da votação de domingo, em Santiago.ERNESTO BENAVIDES (AFP)

O Chile correu em direção à direita nesse fim de semana e não só na eleição presidencial, em que o candidato da extrema-direita foi o mais votado. O líder do Partido Republicano, José Antonio Kast, obteve 27,91% e foi ao segundo turno de 19 de dezembro contra Gabriel Boric, o candidato da Frente Ampla e do Partido Comunista, que recebeu 25,83%. A direita recupera força no Parlamento, onde terá a partir de março de 2022 a metade do Senado, em que a centro-esquerda atualmente tem a maioria. Na Câmara dos Deputados, com 155 membros renovados no domingo, as forças estão bem iguais, em um hemiciclo fortemente pulverizado no qual o futuro presidente não terá maioria, não importando o vencedor em dezembro.

Entre os deputados, se observa um nível de fragmentação que deixa qualquer vantagem dificilmente operacional. Enquanto a centro-esquerda que já foi representada pela extinta Combinação (que governou o Chile entre 1990 e 2010) baixou para 37 cadeiras, a esquerda da Frente Ampla e do Partido Comunista avançou e obteve uma quantidade semelhante, empatando as forças nessa Câmara. Juntos têm 74 deputados, mesmo se tratando de blocos diferentes. A direita obteve 68, praticamente mantendo sua porcentagem atual. É a soma entre o governismo da aliança Chile Podemos Mais de Sebastián Piñera —que desce a 53 cadeiras — e a Frente Social Cristã de Kast, que estreia oficialmente na Câmara baixa com 15 vagas (acima de coletivos históricos da política chilena, como o oposicionista Partido Socialista, que só conseguiu 13). A influência da direita conservadora, portanto, irrompe entre os deputados e em seu próprio setor político.

“A partir de março de 2022 veremos uma direita com um bloco sólido no Parlamento, porque se trata de um setor pragmático que, se precisar se unir, o fará sem problemas”, afirma o analista político René Jofré. “Por outro lado, a oposição atual está dividida em dois blocos rivais”, diz sobre a centro-esquerda da extinta Combinação e a esquerda dos comunistas com a Frente Ampla, de Boric. Para Jofré, “parece possível que a direita chegue a acordos antes do que a atual oposição” e “o realmente chamativo está no Chile, um país onde o Governo de direita de Sebastián Piñera está no chão e as forças da direita aumentam no Congresso, onde seus adversários políticos retrocedem”.

“Na Câmara dos Deputados, as esquerdas estão muito fragmentadas”, opina Daniel Mansuy, pesquisador do Instituto de Estudos da Sociedade (IES). “Os maiores partidos são o Partido Socialista, com 13 cadeiras, e o Partido Comunista com 12, mas lá existem muitos partidos com seis, oito ou nove deputados. Isso é difícil de ordenar e articular para construir maiorias estáveis. É difícil pensar, por exemplo, que essa configuração possa dar um apoio estável ao programa de Boric”, analisa Mansuy com o olhar voltado à eleição presidencial.

Com sete independentes que não pertencem a nenhum dos grandes blocos, estreiam seis deputados do Partido das Pessoas, do candidato antipolítico e populista Franco Parisi, que surpreendeu ao receber 13% da votação para presidente, sem sequer ter pisado no Chile para votar no domingo. O comportamento de sua bancada ainda é uma incógnita e pode se transformar em uma pequena, mas influente força que inclinará a balança legislativa no período 2022-2026.

No Senado, que desde março será composto por 50 membros de acordo com a última reforma, nunca desde o retorno à democracia havia ocorrido um empate entre a direita e a esquerda através das eleições. Se a direita foi maioria circunstancial na década de noventa isso se deveu aos senadores designados, permitido pela Constituição à época e que atualmente não existe mais. Paralelamente, ocorreram pelo menos três surpresas na Casa: o retorno do Partido Comunista, onde não tinham representantes desde o Governo da Unidade Popular de Salvador Allende nos anos setenta, que obteve duas cadeiras; a entrada de um senador do Partido Republicano de Kast, que aparece pela primeira vez no Senado; e a eleição de uma das vítimas de maior simbolismo das revoltas sociais de 2019, Fabiola Campillai, a mulher que ficou cega pela repressão policial de dois anos atrás e que concorreu como independente, mas com um forte discurso de esquerda.

“O empate no Senado é muito chamativo: de qualquer forma, queríamos sair do sistema eleitoral binominal [que foi substituído], porque causava muito empate”, opina Mansuy. “Quem for eleito presidente em 19 de dezembro terá que negociar e ceder muito no Congresso. Ninguém pode levar a bola para casa, e isso custa muito ao mundo de Boric, que sempre jogou com certo maximalismo”, diz o analista do IES sobre a tendência do bloco de esquerda a resistir às negociações.

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