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Protagonismo das famílias e lembrança das vítimas marcam o vigésimo aniversário do 11/9

Biden opta por não fazer discursos nos três locais do ataque: o Marco Zero de Nova York, o Pentágono e o memorial da Pensilvânia

Uma mulher chora neste sábado no memorial pelas vítimas do 11 de Setembro. Em vídeo, a cerimônia completa da homenagem em Nova York, 230 anos depois dos atentados (legendas em espanhol).Foto: EFE | VIDEO: REUTERS
María Antonia Sánchez-Vallejo
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Os erros de inteligência que impediram a previsão da tragédia do 11/9
New York (Usa), 10/09/2021.- A member of the public reacts at the 9/11 Memorial in New York, New York, USA, 10 September 2021. The 20th anniversary of the worst terrorist attack on US soil will be observed on 11 September 2021. (Atentado, Terrorista, Estados Unidos, Nueva York) EFE/EPA/WILL OLIVER
11/9, o ataque que ainda ressoa 20 anos depois

Cedendo todo o protagonismo à memória das vítimas e à emoção de seus familiares, o presidente Joe Biden homenageou neste sábado os quase 3.000 mortos nos atentados cometidos em 11 de setembro de 2001 nos EUA pela organização terrorista Al Qaeda. Biden fez isso visitando os lugares que os jihadistas transformaram em alvo: o Marco Zero de Nova York, onde se erguiam as Torres Gêmeas contra as quais se chocaram os dois primeiros aviões; o Memorial Nacional de Shanksville (Pensilvânia), onde os sequestradores derrubaram o voo 93 depois que os passageiros tentaram retomar o controle do avião, e finalmente o Pentágono, em Arlington (Virgínia), onde se unirá a ele a vice-presidenta Kamala Harris. A primeira cerimônia do dia, no Memorial do Marco Zero, também contou com a presença dos ex-presidentes Bill Clinton e Barack Obama, entre um grande grupo de autoridades, todos eles em um voluntário segundo plano. Em um aniversário tão marcante ―ainda mais destacado devido à tumultuada retirada dos EUA do Afeganistão, no final de agosto―, não houve lugar para brilho político, nem mesmo para demonstrações de patriotismo exaltado: apenas honra, dignidade, luto e memória.

Depois do desfile de representantes das equipes de resgate, policiais e bombeiros e da execução do hino nacional por um coro de jovens, a badalada de um sino marcou 8h46 (9h46 de Brasília), horário em que o primeiro avião sequestrado se chocou contra a Torre Norte do World Trade Center. Foi o primeiro momento de silêncio e recolhimento do dia. Em seguida, tomou a palavra Mike Low, pai de Sara, uma aeromoça desse voo, o número 11. “No primeiro aniversário, ao qual sua mãe e eu comparecemos, este era um lugar de escuridão; hoje é um agradável lugar de memória”, disse Low. Depois de seu breve discurso, pares de familiares das vítimas começaram a ler seus nomes, em ordem alfabética e, muitas vezes, entre soluços. “Vinte anos que vivemos como uma eternidade”, disse uma das participantes da recitação, que durou quatro horas. Às 9h03, outra badalada lembrou o impacto do segundo avião assassino, na Torre Sul. Um engravatado Bruce Springsteen, em rigoroso luto, interpretou ao violão a canção I’ll see you in my dreams (Eu te verei em meus sonhos). Aplausos tímidos, de cortesia, celebraram sua sóbria apresentação. Nada de gritos ou assobios, apenas emoção contida.

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Biden e seus acompanhantes abandonaram o Marco Zero pouco depois das 9h37, quando a terceira badalada lembrou o impacto do terceiro avião contra o Pentágono. A comitiva presidencial foi para o aeroporto, rumo ao memorial da Pensilvânia, ao qual também compareceram o ex-presidente George W. Bush ―que estava no cargo em 2001― e sua esposa, Laura Bush. Bush fez um breve discurso sobre “o dia que mudou nossas vidas para sempre” e suas consequências para o país. Falou em tom muito comedido, sobre os sentimentos coletivos e a grandeza dos EUA, criticando o paroxismo de alguns enquanto equiparava a “natureza infame” do terrorismo externo e do doméstico. Seu apelo à unidade e à rejeição das políticas do medo parecia uma mensagem dirigida ao único ex-presidente que não participou de nenhum dos atos, Donald Trump. O republicano postou neste sábado um vídeo na internet prometendo uma “América grande de novo” e rubricou sua breve mensagem com um ataque a Joe Biden, acusando o presidente de “incompetência” e sua Administração de inépcia pela “triste” forma como realizou a retirada do Afeganistão. Foi precisamente Trump que forçou a saída das tropas dos EUA, devido ao acordo que fez em 2020 com os talibãs.

Em uma manhã fresca, com um sol tão radiante como o que brilhava há 20 anos antes que os ataques escurecessem o céu de Nova York, Biden chegou ao Memorial do 11 de Setembro com a primeira-dama, Jill Biden, pouco depois das 8h30, após uma procissão de familiares e sobreviventes ―na maioria, membros das equipes de resgate, uniformizados― entrar no recinto, entre um mar de fotografias das vítimas erguidas como pendões. Paralelamente à cerimônia de Nova York, foram realizadas as do Pentágono e da Pensilvânia, “em solo sagrado, neste lugar que foi santificado pelo sacrifício”, disse Kamala Harris, que fez um breve discurso, em referência ao campo de Shanksville onde caiu o avião do voo 93. No lugar isolado, longe das câmaras, o casal Biden depositou uma coroa de flores brancas e conversou com familiares de algumas das vítimas.

Respeitando o recolhimento dos entes queridos e com a lembrança ainda bem viva do Afeganistão, Biden decidiu não fazer discursos, confirmou a Casa Branca. Em vez disso, por meio de um vídeo publicado na sexta-feira no Twitter, dirigiu uma breve mensagem à nação pedindo união e superação do medo. “Para mim, a principal lição do 11 de Setembro é que quando estamos mais vulneráveis, nos avanços e recuos de tudo que nos torna humanos, na batalha pela alma dos Estados Unidos, a unidade é nossa maior força”, afirmou.

Pouco antes, ele havia ordenado que a bandeira tremulasse a meio pau neste sábado em todos os edifícios oficiais e pedido que seus compatriotas participassem das cerimônias de recordação organizadas em suas comunidades. O presidente quis evitar também a polêmica protagonizada por um grupo de 1.800 familiares e amigos de vítimas, que repudiaram sua presença e exigiram maior transparência em relação aos resultados de uma investigação sobre a conexão saudita do 11/9.

À habitual solenidade deste tipo de cerimônia ―o 11 de Setembro é lembrado nos EUA como Dia do Patriota, desde 2001, e Dia Nacional de Serviço e Memória desde 2009―, soma-se neste ano outra dimensão: a retirada das tropas dos EUA do Afeganistão depois de 20 anos de guerra. O último episódio da série de consequências desencadeada pelo 11/9 se tingiu de luto pela morte de 13 militares em Cabul devido a um atentado suicida, poucos dias antes da conclusão da saída das tropas. O caos que cercou a retirada foi um momento especialmente sensível para Biden, alvo de críticas tanto da oposição como também de numerosos correligionários democratas. No entanto, no perfil quase invisível que o democrata adotou neste sábado, o respeito e a honra devidos aos mortos pareceram pesar mais do que qualquer cálculo político.

Um impressionante dispositivo policial cercou as imediações do Marco Zero de Manhattan. Milhares de agentes, unidades especiais de detecção de explosivos e cães farejadores já estavam bem visíveis a vários quarteirões do local desde sexta-feira. Em torno dos dois lagos ao lado do museu, curiosos e delegações oficiais, de representantes diplomáticos a associações de pilotos, depositavam coroas em memória dos mortos. Durante a cerimônia, só era perceptível o som da água dos lagos e, como em surdina, um delicado acompanhamento musical: acordes de violoncelo, breves duetos de piano e violino e a discreta atuação do Boss. Um exercício de sobriedade e emoção contida para lembrar uma ferida que ainda está aberta.

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