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Corte Interamericana estabelece que reeleição indefinida não é um direito humano

Opinião do órgão regional, solicitada pela quarta disputa eleitoral de Evo Morales, gera polêmica na Bolívia

O presidente do MAS, o ex-mandatário Evo Morales, neste mês em La Paz.
O presidente do MAS, o ex-mandatário Evo Morales, neste mês em La Paz.Martin Alipaz (EFE)
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Dvd 991 3/3/20
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A Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) estabeleceu que “a proibição da reeleição indefinida é compatível com a Convenção Americana sobre Direitos Humanos”. Esta “opinião consultiva” da Corte foi recebida com grande interesse e polêmica na Bolívia, que continua afetada pela grave crise política causada pelo repúdio de certos setores da população à quarta disputa eleitoral de Evo Morales em 2019.

Para conseguir com que Morales concorresse à época, apesar da Constituição proibir, seu partido, o Movimento ao Socialismo (MAS), conseguiu uma sentença do Tribunal Constitucional pela que as reeleições podem ocorrer indefinidamente porque era um “direito humano”. Para isso, o Constitucional boliviano se baseou em sua própria interpretação da Convenção Americana ou Pacto de San José. Agora essa interpretação foi refutada pela Corte Interamericana, que é a encarregada de resolver as controvérsias sobre a Convenção.”

A reeleição presidencial indefinida não constitui um direito autônomo protegido pela Convenção Americana e pelo corpus iuris do direito internacional dos direitos humanos”, diz a Opinião Consultiva 28/21. Ela foi solicitada pelo presidente da Colômbia, Iván Duque, em outubro de 2019, principalmente pelo que à época ocorria na Bolívia. Mas a Nicarágua e Honduras também se apoiaram no Pacto de San José para ampliar a reeleição de seus governantes.

A sentença se justifica pela necessidade democrática de impedir que as maiorias fiquem no poder à custa das minorias. “A habilitação da reeleição presidencial indefinida é contrária aos princípios de uma democracia representativa”, indica. E considera que a proibição “procura evitar que as pessoas que exercem cargos por eleição popular se perpetuem no exercício do poder”.

A decisão da Corte Interamericana foi alvo de elogios e de ataques de três frentes do debate político boliviano. Evo Morales declarou que era “uma opinião genérica (...) em nenhuma parte do documento se menciona Evo e a Bolívia”. Além disso, tuitou que “a opinião consultiva promovida por Duque, o violador de direitos humanos na Colômbia, é um ataque do golpista [Luis] Almagro e seus cúmplices da direita para desestabilizar politicamente a democracia”. “Como nunca puderam ganhar de nós nas urnas, usam a Corte IDH para justificar suas derrotas”, acrescentou.

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A irritação de Morales contra o secretário-geral da Organização dos Estados Americanos (OEA), Luis Almagro, se deve pelo fato da organização ter auditado as eleições de outubro de 2019 (nas quais Evo Morales foi reeleito pela quarta vez) e determinado a existência de graves irregularidades. O relatório da OEA levou à anulação dessas eleições e à convocação de novas, em que Morales não pôde participar.Por isso o ministro da Justiça, Iván Lima, também militante do MAS, afirmou que hoje a Bolívia não tem inconvenientes com a determinação da Corte Interamericana, pois a reeleição indefinida foi anulada pelo país após o ocorrido em 2019. As definições da Corte Interamericana são obrigatórias para todas as nações que assinaram o Pacto de San José.

O MAS acha que a convulsão social gerada pela denúncia de fraude eleitoral e a auditoria da OEA foi parte de um golpe de Estado que por fim derrubou o presidente Morales com a participação das Forças Armadas e a Polícia. A oposição defende a tese de que se tratou de um movimento espontâneo que combateu uma “monumental fraude”.Ainda que Evo Morales tenha afirmado que por enquanto não está pensando nas eleições de 2025, ele é considerado o postulante mais provável do MAS quando acabar a gestão do atual presidente, Luis Arce. A frente da oposição tenta usar a sentença da Corte para impedir essa possibilidade. Um dos mais importantes líderes dessa corrente, Carlos Mesa, comemorou a “reparação histórica da democracia na Bolívia com a sentença vinculante” da Corte e propôs um julgamento contra os magistrados do Tribunal Constitucional que interpretaram a Convenção a favor de Morales e contra o próprio ex-presidente por “não cumprir os deveres e atentar contra a soberania popular”.

Alguns dos principais jornais bolivianos acusaram Morales de ter gastado centenas de milhões de bolivianos nas manobras eleitorais e judiciais orientadas para conseguir sua reeleição. O jornal El Deber, o mais importante de Santa Cruz, se somou à posição de Mesa e pediu um julgamento contra os responsáveis pela habilitação do líder do MAS. Também questionou a idoneidade dos dois juízes da Corte Interamericana que votaram contra a Opinião Consultiva 28/21, o argentino Raúl Zaffaroni e o equatoriano Patricio Pazmiño.

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