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Presidentes de México e Argentina selam aliança “contra a desigualdade” na América Latina

Alberto Fernández encerra visita oficial em um tenso evento por ocasião dos 200 anos de um documento que levou à independência mexicana

Georgina Zerega
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O presidente da Argentina, Alberto Fernández, durante uma cerimônia pelo Dia da Bandeira, em Iguala (Estado de Guerrero, México).HENRY ROMERO (Reuters)
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CIUDAD DE MÉXICO, 16FEBRERO2021.- Andrés Manuel López Obrador, presidente de México acompañado de Jorge Alcocer Varela, secretario de Salud; Luis Cresencio Sandoval González, secretario de la Defensa Nacional; Marcelo Ebrard Casaubon, secretario de Relaciones Exteriores y Hugo López-Gatell Ramírez, subsecretario de Prevención y Promoción de la Salud, durante la conferencia de prensa que se lleva a cabo en Palacio Nacional. Se destacó el tema del inicio de vacunación en adulto mayores.
FOTO: ANDREA MURCIA /CUARTOSCURO.COM
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Alberto Fernández e Andrés Manuel López Obrador estão em sintonia. No momento de maior aproximação entre México e Argentina na história recente, os dois presidentes selaram nesta quarta-feira uma aliança “contra a desigualdade” na América Latina, ao final da primeira visita oficial do peronista ao país. Fernández participou de um tenso evento no Estado de Guerrero (sul do México) em homenagem aos 200 anos da assinatura do chamado Plano de Iguala, o documento que estabeleceu as bases para a independência mexicana. “Talvez seja agora que nasça em Iguala um novo plano para tirar milhões de latino-americanos da pobreza”, declarou Fernández. Os festejos foram marcados pela sombra do desaparecimento de 43 estudantes nesta cidade, em setembro de 2014, e por protestos feministas contra o mandatário mexicano.

Ao longo dos três quilômetros de ladeira que levam ao topo do morro de Tehuehue, dezenas de pessoas aguardavam os dois políticos agitando bandeiras mexicanas e argentinas. No topo, um mastro nu esperava a chegada deles com as respectivas primeiras-damas. Nesse momento, a cerimônia enveredou por um tom francamente nacionalista, quando uma enorme bandeira mexicana foi içada e aviões militares pintaram o céu de verde, branco e vermelho, as cores nacionais.

Numa cerimônia marcada por simbolismos, cerca de 50 pessoas relembraram a assinatura do Plano de Iguala, o fato que estabeleceu as bases para que o México consumasse sua independência em relação à coroa espanhola, ao unir as Forças Realistas e Insurgentes para que formassem o Exército Trigarante, ou seja, responsável por garantir três valores fundamentais: independência, união e religião. Esta aliança significou a busca de um acordo entre espanhóis e mexicanos.

A bandeira tricolor mexicana foi hasteada pela primeira vez justamente quando da assinatura do Pacto de Iguala, simbolizando esses três princípios. Em homenagem àquele estandarte e a outros que foram usados na época, López Obrador lançou nesta quarta-feira, Dia da Bandeira Mexicana, uma caravana de bandeiras que percorrerá 15 pontos geográficos do país até chegar à Cidade do México, seguindo o caminho trilhado pelo Exército Trigarante até a declaração da independência, em 27 de setembro de 1821.

Os dois presidentes exaltaram a figura de Vicente Guerrero, líder daquela insurgência, como o personagem que procurou um futuro melhor, em contraposição à de Agustín de Iturbide, líder dos realistas, visto como alguém que pretendia defender a coroa espanhola. “Iturbide foi extremamente cruel, desumano, corrupto. Não me parece que seja um herói, mas é inevitável que tenha sido o homem que fez a independência, que a negociou, adaptou-a, e a conseguiu em setembro desse mesmo ano”, comenta o historiador Alfredo Ávila. Tanto López Obrador como Fernández, entretanto, identificaram a figura de líder do exército realista com a ideia de “se aferrar ao passado” ―algo com que eles próprios de alguma maneira procuram romper neste momento.

Fernández resgatou os valores do pacto na quarta-feira e chegou a comparar aquele documento com a aliança bilateral selada na sua viagem. “É muito importante recordar a história neste momento. A história se repete uma e outra vez. Continuamos discutindo entre os que querem sustentar a ordem estabelecida e os que queremos algo diferente”, declarou o argentino, fazendo um paralelismo com a atualidade. A celebração do Plano de Iguala serve de cenário para coroar no continente um novo eixo de esquerda que passou meses sendo gestado. Os três dias da visita da comitiva argentina ao México mostraram as coincidências ideológicas e a sintonia dos dois políticos, culminando com a publicação, na noite de quarta, de um documento conjunto de sete pontos que inclui posicionamentos comuns sobre acordos comerciais, a estratégia para enfrentar a pandemia e como reestruturar a economia regional depois da crise sanitária.

“México e Argentina são nações irmãs”, respondeu López Obrador, tendo ao fundo a serra de Guerrero. O presidente mexicano se mostrou grato com a presença de Fernández na cerimônia. O local escolhido não passou despercebido. Iguala arrasta nos últimos anos o peso de ser uma cidade conhecida internacionalmente como o lugar onde 43 estudantes normalistas de uma escola rural desapareceram em 26 de setembro de 2014. O evento desta quarta-feira, parte das 15 celebrações de Independência que o Governo mexicano programou para 2021, foi organizado pelo 27º Batalhão do Exército, cujo papel no ataque aos jovens naquela noite ainda não foi totalmente esclarecido.

Na terça-feira, prevendo protestos dos familiares dos estudantes, López Obrador definiu com eles que seria feita uma menção especial e sugeriu um suposto “pacto de silêncio” dos envolvidos que ainda estaria em vigor. “Falar deste caso aqui e nesta data significa continuar chamando todo o povo a participar e dizer o que souber sobre estes fatos. Devo referendar nosso compromisso de não claudicar, encontrar os jovens e condenar os culpados”, disse. “É um espinho que trazemos na alma. Como disse Alberto, a verdade e a justiça podem demorar, mas finalmente chegam”, acrescentou, numa alusão ao discurso de seu homólogo.

A visita ocorre também em meio a uma campanha eleitoral marcada pela pré-candidatura de Félix Salgado Macedonio a governador de Guerrero. O veterano político, que fez carreira junto ao presidente mexicano no Partido da Revolução Democrática (PRD) e agora integra o governista Morena, foi acusado por três mulheres de estupro e abuso sexual. A presença de López Obrador no Estado nesta quarta-feira gerou também protestos de grupos feministas que desde a manhã exigiam do mandatário que “rompa o pacto patriarcal” e retire seu apoio ao candidato. “Um estuprador não será governador”, gritaram cerca de 10 manifestantes vestidas de preto, a poucos metros do presidente mexicano, numa segunda parte da cerimônia ocorrida no centro da cidade.

A defesa de Salgado Macedonio por parte de López Obrador, que alegou ver acusações típicas dos processos eleitorais, gerou mal-estar dentro do Governo com vistas ao pleito de junho, quando serão eleitos novos deputados federais, 15 governadores e centenas de prefeitos. “É preciso priorizar as vítimas”, comentou a este jornal o subsecretário federal de Direitos Humanos, Alejandro Encinas, que se encontrava nos festejos da independência. A celebração, que começou com uma aliança regional para combater a pobreza, terminou assim em distúrbios entre manifestantes feministas e grupos que apoiam o presidente.

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