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Partidos pró-independência conquistam maioria absoluta nas eleições da Catalunha

Eleição deste domingo terá consequências para a estabilidade do Governo central e para o equilíbrio de forças da direita

Uma mulher vota no Centro Cívico de Sant Julià de Ramis, em Girona, neste domingo.
Uma mulher vota no Centro Cívico de Sant Julià de Ramis, em Girona, neste domingo.©Toni Ferragut (EL PAÍS)
Miquel Noguer

A Catalunha celebrou neste domingo as suas quartas eleições regionais após 10 anos de o então presidente da Generalitat (Governo catalão), Artur Mas, proclamar o início do que chamou de “processo de transição nacional”, conhecido como procés no jargão popular. Com 85% das urnas apuradas, os partidos pró-independência têm maioria absoluta, apesar de o partido com mais votos neste momento ser o Partit dels Socialistes (PSC) com 33 assentos. Ele é seguido de perto pelos independentistas Esquerra Republicana (ERC) com 33 assentos e Junts por Catalunya com 32. O partido de extrema direita Vox entra no Parlamento com força (11 cadeiras) derrotando o liberal Partido Popular (PP), que conta com 3 posições (perde 1).

Inicialmente, as pesquisas não deixavam claro se o empate eterno que desde então se registrou entre independentistas e não-independentistas cairia desta vez claramente de um lado ou de outro, mas a polarização da sociedade catalã continua, agora preocupada com as cicatrizes que a crise do coronavírus deixou. Se as pesquisas não esclarecem qual partido pode governar a Generalitat, elas mostram que o debate territorial não é mais a prioridade. O que está longe de melhorar é a avaliação da situação política: até 84% dos cidadãos a consideram ruim ou muito ruim, de acordo com a última pesquisa do Governo catalão. A participação nas eleições regionais na Catalunha caiu 22,5 pontos às 18h00 em comparação com as eleições de 2017. Uma participação de 45,73% ante 68,26% há quatro anos. No entanto, os votos pelo correio triplicaram.

Quem ganhar neste domingo, no entanto, não necessariamente governará, devido aos meandros de pactos que terão de ser tecidos para se obter a maioria, acordos que estão em quarentena por causa de vetos acordados entre as partes, e também pelo muro intransponível que continua a ser o tema da independência. Daí o risco de que a Catalunha continue atolada no que alguns observadores descreveram como uma “década perdida” com o bloqueio institucional associado aos processos separatistas, a falta de progresso no autogoverno e a perda de ímpeto econômico diante de outras comunidades mais dinâmicas na Espanha.

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Nesse sentido, foi decisivo o fato de Madri ter ultrapassado a Catalunha em termos do Produto Interno Bruto (PIB) nos últimos anos. Enquanto presidentes iam e vinham, formavam-se coalizões governamentais instáveis, havia uma declaração fracassada de independência, prisão e fuga dos responsáveis, e até mesmo uma intervenção sobre a autonomia, a sociedade catalã se petrificava em dois blocos. A socióloga Marina Subirats sintetiza assim a situação: “Para muitos, a independência é a aposta contra o mundo, algo que defendem teimosamente, apesar de não ser alcançável a curto prazo, enquanto outros apostam em virar a página sem conseguir resolver um projeto alternativo”. Subirats, ex-presidente do Instituto da Mulher e ex-vereadora de Barcelona pelo PSC, prevê que é muito provável que surja outro governo de independência dessas eleições e considera que isso nada mais faz do que “continuar a enfraquecer a Catalunha”, especialmente porque vai insistir em ideias não viáveis. “Um alto dirigente do ERC uma vez me disse que a independência não viria por pelo menos duas gerações”, lembra.

É justamente a gestão desse por enquanto que se desenha como o principal cavalo de batalha da política catalã nos próximos anos. Para alguns, será administrar enquanto a independência não chega; Para outros, o como sair da situação enquanto a confusão política não se acalma, ainda marcada pela situação dos dirigentes do procés, alguns presos, outros fugidos da Justiça espanhola para a Bélgica. O medo dos agentes sociais e econômicos não é tanto que a Catalunha continue sob um governo pró-independência —muitos consideram isso como um fato, embora descartem outra declaração de independência— mas que o clima de bloqueio continue. “A Catalunha já perdeu uma década e agora, com a crise do coronavírus, é urgente não perder mais tempo, por isso pedimos que a prioridade do novo Governo seja chegar a acordo sobre um orçamento com amplo apoio que lhe permita enfrentar a emergência social e a reconstrução do tecido produtivo”, resume Josep Sánchez Llibre, presidente da Foment, principal associação patronal catalã.

Não será fácil chegar a esses acordos. Algumas pesquisas colocam o PSC de Salvador Illa com fortes chances de vitória, mas seu acordo com o referente catalão do Unidos Podemos não seria suficiente para governar. E os partidos da independência encerraram a campanha colocando por escrito que não negociarão com os socialistas a formação de nenhum governo. O outro problema é que também não é garantido que o bloco pró-independência constitua um Executivo, por não saber se os puigdemontistas dos Junt o fariam, ou se desta vez os números dariam o oportunidade para que o ERC tentasse. A força que a CUP pode ter —em 2016 já obrigou a substituição de Artur Mas— e a irrupção ou não do movimento pragmático de independência do PDeCAT fecham o círculo das incógnitas.

Muito mais remota é a possibilidade de um governo socialista com apoio da direita, envolvido em uma luta acirrada entre o Partido Popular e o ultradireitista Vox para liderar seu respectivo segmento na Catalunha. O problema é que os vetos políticos ao procés afetam também a renovação dos órgãos públicos, começando pela direção da televisão catalã até o estabelecimento de prioridades do Governo. O secretário-geral da UGT da Catalunha, Camil Ros, considera que esta polarização está na origem de problemas como o fato de a Generalitat ter passado três dos últimos quatro anos sem orçamentos correntes. “É por isso que precisamos urgentemente de orçamentos para 2021 se não quisermos perder tudo este ano, que já sabemos que será uma grave crise econômica.”

Um pouco mais otimista é Aurora Catà, presidente da associação de incentivos econômicos BCN Global. Ela afirma que o mais urgente agora é um acordo partidário em favor da recuperação econômica, mas considera que o ponto de partida de Barcelona e Catalunha não é ruim se a crise econômica global for deixada de lado. “O compromisso que precisamos para o crescimento tem uma boa base com empresas de tecnologia e polos de inovação e saúde que funcionam, como o BCN Health Hub”, explica. Nesse sentido, considera que a nova Administração deve acompanhar essas iniciativas apostando na geração de talentos. “Mais do que capital, precisamos é gerar talentos e, para isso, precisamos ter um compromisso com a educação e a pesquisa”, acrescenta Catà. Uma lista de anseios grande para um Governo, do qual dificilmente haverá um esboço nesta noite de domingo.

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