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Equador decide se recupera o legado de Rafael Correa

Andrés Arauz, apoiado pelo ex-presidente, e Guillermo Lasso, que tenta pela terceira vez chegar ao poder, são os favoritos para chegar ao segundo turno das eleições presidenciais neste domingo

O candidato à presidência do Equador Andrés Arauz, durante um encontro com seguidores em 4 de fevereiro.
O candidato à presidência do Equador Andrés Arauz, durante um encontro com seguidores em 4 de fevereiro.STRINGER (Reuters)
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Ecuadorean presidential candidate Andres Arauz participates in a televised debate, in Guayaquil, Ecuador January 16, 2021. Picture taken January 16, 2021. Ecuador National Electoral Council/Handout via REUTERS   ATTENTION EDITORS - THIS IMAGE HAS BEEN SUPPLIED BY A THIRD PARTY. NO RESALES. NO ARCHIVES.
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As eleições presidenciais deste domingo no Equador encenam uma batalha entre dois modelos já conhecidos no país andino e, em boa medida, em toda a América Latina. De um lado, a esquerda herdeira do ex-presidente Rafael Correa, representada por Andrés Arauz, que busca retomar o poder. Do outro, Guillermo Lasso, um político conservador e liberal no campo econômico, que tenta pela terceira vez chegar ao palácio de Carondelet. Embora as pesquisas indiquem que haverá segundo turno entre esses dois políticos em abril, a desmobilização e a fragmentação do voto, com 16 candidatos nas cédulas, trazem incerteza à jornada. O dirigente indígena Yaku Pérez e o empresário Xavier Hervas, cuja popularidade aumentou graças às redes sociais, podem reduzir a vantagem dos favoritos.

Andrés Arauz

Arauz terminou a campanha eleitoral anunciando que, neste domingo, “chega a Revolução Cidadã 2.0.” Em suma, a nova versão do movimento fundado por Correa e que, na esteira dos projetos enquadrados no chamado socialismo do século XXI, manteve-o na presidência durante uma década, entre 2007 e 2017. O ex-mandatário ganhou também as últimas eleições, mas seu candidato, Lenín Moreno, rompeu com ele e seguiu um caminho radicalmente diferente. Arauz é um político jovem (fez 36 anos neste sábado) e se transformou numa esperança da esquerda não apenas na América Latina, mas também na Europa. Plataformas e líderes progressistas, com o Grupo de Puebla no topo da lista, apoiaram sua candidatura e esperam que este economista, que foi ministro de Conhecimento e Talento Humano na última etapa de Correa, repita a façanha de Luis Arce, que em outubro, contra as previsões das pesquisas, devolveu o poder ao Movimento ao Socialismo de Evo Morales sem precisar de segundo turno.

Assim como seu mentor, Arauz formou-se nos Estados Unidos. Antes de disputar estas eleições morava no México, onde fez doutorado. A proposta de sua frente, a União pela Esperança (UNES), inclui “recuperar o ensino gratuito e de altíssima qualidade”, “retomar uma verdadeira justiça social” em matéria de política sanitária, fortalecer a soberania econômica e promover a pesquisa e a tecnologia. Grosso modo, Arauz se mantém fiel aos postulados da Revolução Cidadã, que aplicou receitas de economia expansiva e multiplicou os investimentos em infraestrutura. Se finalmente vencer as eleições, no entanto, deverá lidar com a herança de Moreno.

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O próximo presidente terá certa margem na primeira etapa, já que os compromissos assumidos pelo atual Governo têm cinco anos de carência. Mas a renegociação da dívida soberana com o Fundo Monetário Internacional (FMI) ficou sujeita a uma série de reformas estruturais destinadas à redução do gasto público. Essa filosofia vai de encontro aos planos de Arauz, que, por exemplo, prometeu 1.000 dólares (5.370 reais) a um milhão de famílias para fomentar o empreendimento e tentar evitar o agravamento da crise econômica em plena pandemia.

O candidato esquerdista se define “como um economista pós-keynesiano, social e solidário”. Recebeu o apoio de ex-presidentes ibero-americanos como o uruguaio José Mujica, o espanhol José Luis Rodríguez Zapatero, o boliviano Evo Morales, o colombiano Ernesto Samper e o atual mandatário argentino, Alberto Fernández, além de ter o apoio do Movimento Regeneração Nacional (Morena) do presidente mexicano, Andrés Manuel López Obrador. “Independentemente dos resultados deste domingo, triunfamos”, disse Correa no encerramento da campanha, rechaçando o que chama de “perseguição” contra si e contra o grupo político que hoje o representa. A votação é a oportunidade que o correísmo tem agora de superar o mandato de Lenín Moreno e levar mais oxigênio à esquerda latino-americana. Tanto Arauz como seu principal adversário não atenderam ao EL PAÍS na reta final da campanha.

Guillermo Lasso

Lasso tenta pela terceira vez chegar ao poder no Equador. É o candidato a presidente que representa o antagonismo frontal ao modelo econômico do socialismo do século XXI, e se vende como o porta-voz da mudança e do emprego. Garante saber como criar postos de trabalho, por sua experiência como empresário no Banco de Guayaquil, um dos três maiores do país. E promete recuperar dois milhões de empregos para os equatorianos.

O candidato à presidência do Equador Guillermo Lasso lidera uma caravana pelas ruas de Quito.
O candidato à presidência do Equador Guillermo Lasso lidera uma caravana pelas ruas de Quito. Jose Jacome (EFE)

O líder do movimento CREO, conservador e liberal no campo econômico, aposta na redução de impostos para dinamizar a economia nacional, mas sem ajustes radicais no gasto público. Suas promessas não são novas. Na eleição de 2013, ele assinou perante um tabelião a lista de tributos e taxas que sairiam do cronograma de arrecadação caso chegasse à presidência. Nesta campanha, voltou a registrar a proposta em cartório.

Sua evolução política seguiu o compasso da evolução de Correa e do correísmo. Em sua primeira candidatura presidencial, Correa o derrotou com 57% no primeiro turno. Na segunda tentativa, contra Lenín Moreno, Lasso chegou ao segundo turno, mas uma disputada apuração dos votos, que durou três dias, deixou-o de fora por pouco mais de dois pontos percentuais. Moreno ganhou com 51,16% dos votos, e ele obteve 48,84%. O correísmo vem caindo. Chegou a ter 70% de intenção de voto, passou para 50%, depois para 40% e agora está beirando os 20%. Eu já tenho a experiência de duas [eleições]”, disse Lasso numa entrevista.

Desta vez, ao contrário da última disputa eleitoral, Lasso se aliou desde o início ao principal rival do correísmo, Jaime Nebot, o prefeito social-cristão que governou Guayaquil por 20 anos e selou uma aliança para a presidência que, no entanto, mantém seus próprios planos para a Assembleia. O movimento CREO e o Partido Social Cristão tentam chegar ao Carondolet com um candidato único, mas permanecerão como dois blocos no Legislativo —onde, nos últimos quatro anos, votaram em polos opostos em temas tão importantes quanto a descriminalização do aborto por motivo de estupro.

Lasso, de 65 anos, conta com um núcleo duro de seguidores, que lhe garantem pelo menos 20% dos votos conforme as últimas pesquisas, mas também de detratores. A sombra do “feriado bancário” ressuscitou a cada campanha eleitoral. Esse aspecto é justamente o que tem sido sempre explorado por seus oponentes. Como é que o Equador —um país que viu milhões de compatriotas emigrarem para a Espanha e a Itália por causa da crise bancária, que congelou e esmaeceu as poupanças de seus clientes— terá um banqueiro na presidência?

Lasso foi ministro da Economia durante um mês do Governo de Jamil Mahuad, após este ter ordenado congelar os depósitos bancários para evitar uma intensa fuga de capitais, mas a comissão criada por Correa para investigar a crise financeira de 1999 concluiu que nem o Banco de Guayaquil (do qual Lasso foi presidente em 1989) nem o próprio Guillermo Lasso se beneficiaram do episódio mais duro da história recente equatoriana. Apesar das constantes acusações, nos últimos 10 anos da administração de Correa ele nunca pôde ser diretamente vinculado à crise.

Com um tratamento pessoal afável e uma imagem pública apática, é sua faceta mais familiar a que mostra um Guillermo Lasso de valores conservadores e origens humildes. Ele mesmo conta que começou a trabalhar aos 14 anos para contribuir com o sustento da família, sendo o caçula de 11 irmãos. Agora, com uma vida abastada, sua esposa e seus três filhos mais velhos caracterizam o modelo idílico da elite empresarial de Guayaquil. Ainda assim, ele teve que gastar “muita sola” nas duas campanhas anteriores para se aproximar do povo, percorrendo as ruas e escutando em primeira mão as necessidades das zonas rurais, embora a pandemia o tenha levado às redes sociais nesta terceira disputa. Lasso apareceu brindando com uma cerveja para mostrar que também leva uma vida comum.

Ainda assim, ele é o candidato presidencial que mais paga impostos —quase 700.000 dólares (3,76 milhões de reais) para o fisco em 2019 e 4,5 milhões de dólares (cerca de 24 milhões de reais) nos últimos cinco exercícios— mas também é o prega a total transparência que os altos funcionários do Estado deveriam ter. Mora em Samborondón, uma das áreas de maior poder aquisitivo de Guayaquil. Possui uma segunda casa que acaba de ser remodelada na praia e circula num Toyota Land Cruiser blindado.

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