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México oferece asilo político a Julian Assange

López Obrador comemora a recusa da Justiça britânica em extraditar o cofundador do Wikileaks e pede seu indulto

O presidente Andrés Manuel López Obrador, em coletiva de imprensa nesta segunda-feira.
O presidente Andrés Manuel López Obrador, em coletiva de imprensa nesta segunda-feira.MEXICO PRESIDENCY / HANDOUT (EFE)

O Governo do México oferecerá asilo político ao cofundador do Wikileaks, Julian Assange, anunciou o presidente Andrés Manuel López Obrador nesta segunda-feira. “Pedirei ao ministro de Relações Exteriores que efetue os trâmites pertinentes para que se solicite ao Governo do Reino Unido a possibilidade de que o senhor Assange seja libertado e que o México lhe ofereça asilo político”, declarou durante a coletiva de imprensa matutina, depois que a Justiça britânica rejeitou a extradição do hacker para os Estados Unidos, onde poderia ser condenado a penas de até 175 anos de prisão.

López Obrador comemorou a decisão da magistrada britânica do Tribunal Penal Central de Londres Vanessa Baraitser, que concluiu nesta segunda-feira que o cofundador do Wikileaks não pode ser extraditado para os Estados Unidos e que o risco de Assange se suicidar, caso a extradição fosse permitida, “seria alto”. O presidente garantiu que seu Governo se comprometerá a dar “proteção” a Assange e a assumir a responsabilidade de que “não intervenha nos assuntos políticos de nenhum país”. “Acho que é um triunfo da justiça. Fico feliz que a Inglaterra aja dessa forma, porque Assange é um jornalista e merece uma oportunidade. Sou a favor de que seja indultado”, afirmou.

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O presidente mexicano já havia deixado clara sua posição nos dias anteriores: “Desejo que ele seja perdoado e libertado”. “Não sei se ele reconheceu que agiu contra normas e um sistema político, mas na época esses telegramas mostraram como o sistema mundial funciona em sua natureza autoritária”, havia dito na sexta-feira.

López Obrador continua firme em sua defesa de Assange em grande parte porque o Governo dos Estados Unidos o esteve investigando desde 2006, segundo o Wikileaks. O presidente mexicano considera que a maioria desses telegramas, datados na época em que ele fazia parte da oposição, “violava a soberania, as liberdades e a democracia”.

Uma das primeiras comunicações que a agência de segurança dos Estados Unidos envia sobre López Obrador é uma revisão exaustiva dos nomes que o político avaliava então para formar seu gabinete: Rogelio Ramírez de la O, Juan Ramón de la Fuente e José María Pérez Gay. “Nenhum dos três é radical”, termina o comentário.

Posteriormente, o Governo dos Estados Unidos se manteve muito atento à enorme manifestação de protesto que López Obrador convocou em meados de julho de 2006 na capital mexicana, depois de perder as eleições para Felipe Calderón, para denunciar uma suposta fraude eleitoral. “Segundo uma fonte, López Obrador planeja continuar os protestos até que o Tribunal Eleitoral do Poder Judiciário faça uma recontagem completa em nível nacional. Ela acrescenta que se o TEPJF não ordenar tal recontagem, o país corre o risco de se tornar ingovernável”, podia ser lido no telegrama que vazou, datado de 18 de julho de 2006″. A verdadeira questão é qual será o próximo passo de AMLO [como López Obrador] é conhecido, porque parece claro que não ficará satisfeito com nenhum resultado que deixe Calderón como vencedor”, assina o agente Alan Metlzer. Os Estados Unidos expressam sua preocupação de que os protestos dos seguidores de López Obrador se radicalizem e se ampliem, por isso naquele período prepararam um perfil do líder político, com base em entrevistas com a historiadora Alejandra Lajous.

“AMLO é extremamente manipulador e disposto a trair aliados e apoiadores de longa data para promover sua causa”, “não se pode subestimar seu carisma para manter o movimento vivo”, “ele está convencido de que está certo e reluta em se expor a potenciais críticas”, são algumas das descrições que podem ser lidas no documento, intitulado A Criação do Presidente na Sombra. Na avaliação, o Governo dos Estados Unidos também reconhece que os protestos de López Obrador dificilmente resultarão em violência, já que ele sempre a evitou no passado.

Com Barack Obama na presidência e Hillary Clinton como secretária de Estado, a investigação sobre López Obrador e seu entorno prossegue. A agência norte-americana quer saber, então, qual é a relação entre o presidente, Marcelo Ebrard —atual chanceler do Governo mexicano, que na época era chefe do Governo da Cidade do México—, Jesús Ortega, Alejandro Encinas e, novamente, Juan Ramón de la Fuente, reitor da UNAM (“uma das instituições de esquerda mais proeminentes no México”).  “Até que ponto esses indivíduos estão trabalhando juntos ou estão prejudicando uns aos outros? Quanto apoio eles têm dentro do Partido da Revolução Democrática (PRD) e entre os partidos menores de esquerda?”, perguntava o texto, escrito pela diretora de operações do Escritório de Inteligência do Departamento de Estado, Elissa G. Pitterle.

Além disso, a informação sobre López Obrador se enquadra na preocupação dos Estados Unidos com o fortalecimento que a esquerda estava tendo na América Latina sob Fidel Castro, em Cuba; Hugo Chávez, na Venezuela; Evo Morales, na Bolívia; Néstor Kirchner, da Argentina; Michelle Bachelet, no Chile, e López Obrador, no México.

Longa tradição de asilo no México

A oferta de López Obrador a Assange faz parte de uma longa tradição de asilo no México. No final de novembro de 2019, o país recebeu o ex-presidente boliviano Evo Morales, mas a lista inclui, desde o exílio a republicanos espanhóis, o ideólogo soviético León Trotsky, o cineasta espanhol Luis Buñuel, o ex-presidente argentino Héctor Cámpora e a guatemalteca ganhadora do Prêmio Nobel Rigoberta Menchu. O Governo mexicano, condicionado pela proximidade com os Estados Unidos e por um poder militar limitado, tem se caracterizado por uma diplomacia legalista, ou seja, aderente ao direito internacional, aos princípios de não intervenção e de solidariedade com as vítimas de regimes autoritários e de guerra.

Assange está em uma prisão de Londres e é acusado pela justiça dos Estados Unidos de 18 crimes de espionagem e invasão de computadores. Washington o acusa de vários crimes contra a Segurança Nacional pela publicação de documentos confidenciais sobre a intervenção militar dos Estados Unidos e seus aliados no Iraque e no Afeganistão. As autoridades suecas exigiram a entrega do fugitivo, acusado de vários crimes de estupro e abuso sexual contra duas mulheres que haviam colaborado em um evento do Wikileaks em Estocolmo dois anos antes. O hacker havia obtido proteção diplomática do Governo do Equador, então presidido por Rafael Correa, e permaneceu sob proteção por sete anos nas instalações da Embaixada do Equador em Londres.

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