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Casos de coronavírus na Europa sobem 150% em 20 dias

“Segunda onda não é uma abstração. Está aqui e é violenta”, diz o ministro francês da Saúde

O primeiro-ministro da França, Jean Castex, conversa com funcionários de um pronto-socorro em Saint-Etienne (sudeste).
O primeiro-ministro da França, Jean Castex, conversa com funcionários de um pronto-socorro em Saint-Etienne (sudeste).JEAN-PHILIPPE KSIAZEK / POOL (EFE)
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Milan (Italy), 28/10/2020.- Protesters wearing stained Hamza Suits gather for a flashmob demonstration organized by the social center Cantiere, to demand for emergency income and financing, amid the coronavirus pandemic and restrictive measures, in front of the Milan branch of the Bank of Italy in Cordusio street, in Milan, Italy, 28 October 2020. Italian Prime Minister Giuseppe Conte announced new nationwide Covid-19 restrictions that come into effect on 26 October, and include the closure of restaurants and bars by 6pm and shutting down gyms, cinemas and swimming pools. (Cine, Protestas, Italia) EFE/EPA/ANDREA FASANI
França retoma confinamento, Alemanha fecha bares e Itália tenta aplacar protestos contra restrições

Entre em 11 de outubro e 1º de novembro, os casos de coronavírus medidos pelo acumulado em sete dias cresceram 149,6% na Europa, segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS). Desde 27 de setembro, esse aumento é de 313,9%. O pique da pandemia no continente faz que sejam europeus 7 dos 10 países mais afetados nos últimos 14 dias (França, Itália, Reino Unido, Espanha, Polônia, Rússia e Alemanha, nesta ordem). Só Estados Unidos (primeiro), Índia (segundo) e Brasil (sétimo) não pertencem ao continente. Completando a lista dos 20 países mais afetados, outros 6 são europeus (Bélgica, Holanda, Ucrânia, República Tcheca, Ucrânia e Romênia).

O crescimento da pandemia tem sido muito rápido. Em 27 de setembro, levando-se em conta os casos dos sete dias anteriores, o continente era a terceira região mais preocupante do mundo, após a América e do Sul e Sudeste da Ásia. Àquela altura, os casos na Europa chegavam a 21% do total; em 11 de outubro, já eram 31%; em 1º de novembro, superavam 50%, sendo que os europeus são 10% da população mundial. “A Europa é outra vez o epicentro da pandemia”, disse então Hans Kluge, diretor do escritório europeu da OMS. Naquelas declarações, advertia de que “as hospitalizações alcançaram níveis que não se viam desde a primavera [durante a primeira onda], com 10 por 100.000 pessoas internadas em um terço dos países”. Também avisou que “a mortalidade cresceu 32% na região em uma semana” e que, como os “sistemas de testes não conseguiram manter o ritmo, a positividade supera 5% na maioria dos países”. Este último indicador mostra a percentagem de análises que detectam um caso positivo. Quanto mais baixo (estima-se que seu limite aceitável seja 5%), significa que há um maior controle epidemiológico do vírus.

O continente cruza os dedos à espera de algum efeito das drásticas medidas adotadas recentemente. “A pergunta-chave que muitos países estão se fazendo é se deverão ou não decretar um confinamento total”, admite Kluge, embora tanto a OMS como o Centro Europeu de Controle de Doenças acreditem que este deve ser o último recurso, pois, além de danos psicológicos, econômicos e sociais, pode-se agravar a chamada fadiga pandêmica da população, com a decorrente perda da sua cooperação. Além disso, a palavra confinamento (lockdown, em inglês) é interpretada de maneira distinta em cada país. Na Espanha, o diretor do Centro de Coordenação de Alertas e Emergências Sanitárias, Fernando Simón, observa que muitos países europeus que dizem estar decretando confinamentos estão, na prática, adotando medidas inclusive menos rigorosas que algumas regiões espanholas, com limitações à mobilidade e fechamento de estabelecimentos, embora as escolas permaneçam abertas, por exemplo.

Na França, segunda onda “violenta”

Nem todos os países europeus ―e dentro deles as suas regiões― estão na mesma situação. Na Espanha, o aumento da taxa de incidência, que mede os casos novos, estabilizou-se na média, mas em territórios que estavam em melhores condições no princípio da escalada da segunda onda (como Astúrias e Cantábria) a cifra está disparada, enquanto parece haver dados positivos para as que já estiveram piores (como Madri e Navarra). Em termos europeus acontece algo similar. A França é um claro exemplo. O país passou de 306.000 casos registrados entre 6 e 21 de outubro para 670.000 nos 15 dias seguintes. “A segunda onda não é uma abstração: está aqui e é violenta”, advertiu nesta semana o ministro francês da Saúde, Olivier Véran. A taxa de ocupação das UTIs já se eleva a 87,2%, um total de 4.331 pacientes, informa Marc Bassets.

A possibilidade de uma superlotação dos hospitais na França levou à transferência de pacientes de regiões fronteiriças para clínicas alemãs e reabriu o debate sobre a possibilidade de, num futuro próximo, ser preciso discriminar entre doentes. “Haverá pacientes que não serão admitidos em reanimação. Estamos nos preparando para isso”, declarou Bertrand Guidet, chefe da UTI do hospital Saint-Antoine de Paris, ao jornal Le Monde. O número de casos também disparou: 60.486 nas 24 horas precedentes à última atualização dos dados publicada na sexta-feira à tarde. Naquele dia, o balanço de mortes ―algumas ocorridas em dias anteriores e registradas mais tarde― aumentou em 828, chegando a 39.865 desde o início da pandemia. A França vive sob um regime de confinamento nacional desde 30 de outubro, mais leve, porém, que o confinamento do primeiro semestre, já que as escolas, as indústrias e a administração pública continuam funcionando.

A pandemia, descontrolada na Itália

A Itália é um caso de país que primeiro pareceu resistir ao vírus, mas onde depois a epidemia se descontrolou, informa Daniel Verdú. É o quarto país do mundo com mais casos nos últimos 14 dias segundo os dados da OMS, 359.153, e o sexto em mortes notificadas, mais de 40.000. As cifras de contágios já superam diariamente os 30.000, e os óbitos se situaram na sexta-feira em 446 (na Espanha, estavam na sexta-feira em 22.516 positivos e 347 falecidos). Os diagnósticos quase quadruplicaram nos últimos 15 dias (390.000) frente à quinzena anterior (106.863).

O Executivo, depois de tomar medidas suaves durante todo o mês de setembro e outubro, decidiu dividir o país em três níveis de incidência para evitar prejudicar a economia onde não isso não for absolutamente necessário: amarelo, laranja e vermelho. As mais afetadas (Piemonte, Calábria, Vale d’Aosta e Lombardia) estão desde sexta-feira em regime de confinamento domiciliar. O ministério da Saúde determinará a cada 15 dias quais regiões devem subir ou descer de nível. Além das restrições de cada área, todo país já está submetido a um toque de recolher entre 22h e 5h, e toda a educação a partir dos 14 anos é à distância. Museus e exposições, como já acontece com os teatros e cinemas, estarão fechados. O mesmo se aplica aos shoppings nos fins de semana, e a capacidade do transporte público será reduzida pela metade.

Estabilização na Irlanda, Reino Unido e Alemanha

Entre os países que começam a ver tênues raios de luz está a Irlanda, onde a incidência em 14 dias caiu duas semanas depois de ser decretado um confinamento muito similar ao do primeiro semestre, enquanto na Inglaterra, que entrou em um segundo confinamento severo na quinta-feira passada, o vírus continua se espalhando e o número de infectados dobra a cada semana, informa Rafa de Miguel. Entretanto, o Escritório Nacional de Estatística (ONS) incorporou um pouco de otimismo à situação, com uma estabilização no número de novos casos em torno de 50.000 por dia na última semana, quando já se aplicava uma estratégia regional de restrições que era especialmente dura em algumas zonas do norte da Inglaterra. Com o novo confinamento nacional, o ONS espera que esta estabilização do vírus se consolide.

Outro país que poderia se aproximar de uma estabilização é a Alemanha. A segunda onda chegou tarde ao país, mas continua golpeando com força, informa Ana Carbajosa. Neste sábado, voltou a ser registrado um recorde de contágios diários, seis dias depois de entrarem em vigor as novas restrições definidas entre o Governo federal e os Estados. Ao todo, o Instituto Robert Koch cifra em 23.399 os casos positivos e em 130 os mortos nas últimas 24 horas. Desde o início da epidemia, foram registrados 642.488 contágios de covid-19 e 11.226 mortes. A incidência de casos por 100.000 habitantes nos últimos sete dias soma 133.

Na Alemanha, preocupa o rápido crescimento da ocupação de leitos nas UTIs, assim como a escassez de profissionais para atender os pacientes nessas alas. Mesmo assim, devido à gravidade de situação em países vizinhos, a Alemanha acolhe nos últimos dias pacientes de outros sócios europeus que têm seus serviços sanitários saturados, como a Bélgica. Desde segunda-feira passada, os bares estão fechados e os restaurantes só funcionam oferecendo comida para viagem. Academias de ginástica, cinemas, museus e qualquer outra atividade cultural fecharam as portas durante o mês de restrições definido pelas autoridades. A primeira resposta positiva veio da chamada taxa de reprodução do vírus (R), que no sábado caiu a 0,9 (ou seja, menos de um contágio por afetado), o que poderia apontar para uma possível desaceleração do crescimento dos contágios nos próximos dias.

Dados não confiáveis na Rússia, 100.000 casos diários nos EUA

Entre os grandes afetados, a Rússia, quarto país do mundo em casos, tem como primeiro problema a confiabilidade dos dados, informa María R. Sahuquillo. Oficialmente teve mais de 20.000 infectados, a um ritmo de 364 por dia, mas os casos reais podem ser muitos mais. Os 30.251 mortos do cadastro oficial de coronavírus russo não batem com os mais de 55.000 mortos com covid-19 contabilizados pelo Rosstat (órgão público de estatísticas) entre abril e maio. Além disso, nesta semana os especialistas do Ministério de Saúde admitiram que entre 30% e 40% dos exames feitos dão negativo porque as amostras não são colhidas corretamente. O incremento de casos já saturou o hospital moscovita construído expressamente para abrigar doentes de covid-19, inaugurado há poucos meses, e está tendo um efeito grave nas regiões ―onde se concentram dois terços dos novos casos, e que enfrentam o vírus com recursos escassos e um sistema sanitário muito prejudicado. O Governo, porém, descarta por enquanto medidas de confinamento como as do primeiro semestre. Dos outros grandes afetados, os Estados Unidos estão há dois dias notificando mais de 100.000 casos diários (117.988 na quinta-feira) para um total de mais de 9,5 milhões. Dos 10 países mais afetados, a Índia é o único que parece ter claramente passado do pico, segundo os dados da Universidade Johns Hopkins.

Freio no Brasil e no México

O Brasil é o terceiro país do mundo em casos, mas o sétimo na classificação dos últimos 14 dias. Isto indica certo retrocesso da pandemia. De todo modo, o impacto do coronavírus está subestimado porque o país faz poucos exames, informa Naiara Galarraga. Outubro foi o primeiro mês com menos de 20.000 mortos pelo vírus, o que consolida uma queda iniciada três meses antes. O Brasil, com 210 milhões de habitantes, soma mais de 160.000 mortos ―com uma média de 400 por dia nesta semana― e quase 5,6 milhões de contágios. O ministro da Saúde, general Eduardo Palazuello, o terceiro titular na pasta na atual crise, teve que ser recentemente hospitalizado por covid-19.

A vida retorna à normalidade como reflete a volta dos congestionamentos de sempre. Bares, restaurantes, discotecas, museus e shows foram retomados com restrições de público, as praias exigem distanciamento interpessoal, e os alunos voltam às aulas presenciais de forma gradual e voluntária. Da mesma maneira que cada um dos 26 Estados decidiu as normas do confinamento, as condições e o ritmo da liberalização também variam, porque a doença se desloca a velocidades diferentes por seu território de dimensões continentais. No final de outubro, um terço das capitais, sobretudo no Nordeste, mostrava sinais de aumento das hospitalizações. Mas, neste momento, os casos caem na maior parte do país e se mantêm estável no resto. A última polêmica política foi a rejeição do presidente Jair Bolsonaro a incorporar a vacina do laboratório chinês Sinovac, testada aqui, ao calendário nacional de imunização.

O México, outro dos grandes, parece ter freado na última semana a ascensão de casos, segundo o diretor-geral de Epidemiologia, José Luis Alomía. As últimas cifras deste país, 10º mundial no total de casos e 20º do mundo nos últimos 14 dias, são de 551 óbitos e 5.931 contágios, para um total de um milhão de afetados. Diante desta situação, a chefa de Governo da Cidade do México, Claudia Sheinbaum, anunciou na sexta-feira que serão abreviados os horários de funcionamento de restaurantes, cassinos e academias e que os eventos em hotéis terão público reduzido, para tentar reverter a alta de hospitalizações por covid-19 na capital, informa Micaela Varela.

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