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Democratas tentam limitar poder militar de Trump na crise com o Irã

Câmara aprova medida que, se avançar no Senado, determinaria autorização explícita no Congresso para qualquer ação do presidente no caso

A presidente da Câmara dos EUA, a democrata Nancy Pelosi.
A presidente da Câmara dos EUA, a democrata Nancy Pelosi.TOM BRENNER (Reuters)
Pablo Guimón

Um suspiro de alívio foi sentido no Capitólio depois do anúncio de Donald Trump na quarta-feira de que evitaria uma resposta militar ao ataque iraniano a duas bases norte-americanas no Iraque, uma agressão aparentemente muito calculada, a mais clara e direta de Teerã em décadas de conflito, que não produziu vítimas. Mas o alívio imediatamente deu lugar a uma ofensiva dos democratas para lutar pelo controle do Congresso sobre os poderes militares do mandatário. A Câmara dos Representantes (deputados) aprovou na quinta-feira à tarde (por 226 votos contra 193) uma iniciativa da maioria democrata para obrigar Trump a reduzir a tensão militar com o Irã, a menos que tenha autorização explícita no Congresso.

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A medida teria a princípio poucos sinais de avançar no Senado, onde os democratas são minoria. Mas, já na quarta-feira à tarde, dois senadores republicanos disseram estar dispostos a votar a favor da medida se ela chegar à Casa. Isso não garantiria a aprovação, mas uma votação extremamente apertada: os republicanos ocupam 53 das 100 cadeiras do Senado. O que implica, em qualquer caso, um duro escrutínio sobre a estratégia de Trump no Irã e um debate sobre a competência do comandante em chefe dos Estados Unidos para entrar em uma guerra.

Nancy Pelosi voltou a criticar na quinta-feira, em uma entrevista coletiva em que anunciou a iniciativa que foi votada à tarde na Câmara, a operação ordenada pelo presidente que levou à execução do general iraniano Qasem Soleimani há uma semana em Bagdá. “Não acredito, com base no que é de domínio público, que tenham tornado nosso país mais seguro com o que fizeram”, disse. A “atitude displicente” de Trump, acrescentou Pelosi, é “assombrosa”.

O presidente respondeu na quinta-feira à iniciativa de Pelosi. “Não tenho por que consultar o Congresso”, afirmou. “Dependerá das circunstâncias. Às vezes você tem de agir muito rápido.” O republicano aproveitou para questionar a oportunidade política das críticas da presidente da Câmara. “Pelosi defendendo esse monstro... É um argumento politicamente perdedor”, disse Trump, referindo-se ao general assassinado responsável pela ação externa do Exército iraniano.

O ataque do Irã a duas bases iraquianas que recebem soldados norte-americanos provocou a clássica divisão partidária no Congresso, desta vez sobre a estratégia de Trump no Oriente Médio. Os secretários de Estado e de Defesa, Mike Pompeo e Mark Esper, informaram depois no Capitólio os legisladores das duas Casas sobre os detalhes das decisões tomadas, e a maioria dos republicanos concordou com o presidente do Senado, Mitch McConnell, em elogiar “a paciência e a prudência” demonstradas por Trump.

Mas houve pelo menos duas vozes críticas. A sessão de informações oferecida aos legisladores foi, na opinião do senador republicano de tendências libertárias Mike Lee, “insultante e humilhante”. “Foi provavelmente a pior sessão de informações que já vi, pelo menos em matéria militar, nos nove anos em que sirvo no Senado dos Estados Unidos”, acrescentou. Outro senador republicano, Rand Paul, se juntou a Lee ao anunciar que apoiará a iniciativa democrata de afirmar a autoridade do Congresso nas decisões bélicas.

Entre os democratas, as críticas às recentes ações do presidente foram generalizadas. “Acho que agora mais do que nunca o Congresso precisa agir para proteger as disposições constitucionais sobre a guerra e a paz”, disse o congressista Gerald Connolly. “Ouvi o mesmo tipo de mentiras que ouvia há 20 anos sobre a guerra do Iraque”, acrescentou o senador Sherrod Brown.

Washington, em resumo, assiste nestes dias a uma mudança no foco da campanha das eleições presidenciais de novembro. No início do ano eleitoral, o debate sobre economia, imigração ou saúde que vinha marcando a agenda política está sendo ofuscado por um debate urgente sobre política externa e militar. A menos de um mês após a primeira grande reunião em Iowa das primárias democratas, o conflito com o Irã irrompeu na agenda dos adversários potenciais a enfrentar Trump nas urnas.

Navegando nas águas do momento de maior perigo em seus três anos de presidência, o próprio Trump também se vê obrigado a enfrentar suas contradições. E a lidar com o delicado equilíbrio de seu partido, entre aqueles que estão celebrando sua campanha de retirada internacional ao grito de “Estados Unidos primeiro” e aqueles que apoiam as ameaças e a mão dura exibida por Trump em relação ao Irã nos últimos dias. Ao menos por enquanto, com seu discurso da quarta-feira, Trump pareceu satisfazer as duas facções. Mas ninguém considera a crise terminada e, para além de uma mensagem à nação milimetricamente calculada, o país vive pendente da evolução do discurso nos próximos dias, pela via mais espontânea dos comícios e dos tuítes.

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