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Julgamento do impeachment de Trump se aproxima em meio à divisão política

Republicanos articulam estratégia com a Casa Branca e blindam presidente, enquanto a Câmara tenta impulsionar as acusações que podem levar a sua destituição

Amanda Mars
Simpatizantes de Trump protestam contra o impeachment na frente do Capitólio, em outubro.
Simpatizantes de Trump protestam contra o impeachment na frente do Capitólio, em outubro.Carlos Jasso (REUTERS)

O processo de impeachment de Donald Trump está prestes a se transformar em um fato. A Câmara convocou para quarta-feira a votação das acusações contra o presidente dos Estados Unidos, que devem ir adiante com a maioria democrata na Casa e chegar ao Senado para um julgamento político. Os senadores devem avaliar se Trump cometeu abuso de poder e obstrução ao Congresso no escândalo da Ucrânia, mas o procedimento nasce marcado pelo tribalismo: os republicanos já adiantaram que articulam o assunto com a Casa Branca e pensam em absolver Trump, enquanto os democratas acusam o magnata de traição.

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A discussão, por enquanto, está tirando do sério um presidente já naturalmente histriônico. Na quinta-feira, dia do debate no Comitê Judicial para aprovar as duas acusações, Trump bateu seu recorde de mensagens no Twitter: antes das 10h, já havia tuitado e retuitado 87 vezes e, ao final do dia, o fez 123. No domingo, com a sombra do impeachment já mais próxima, lançou um grosseiro ataque contra a presidente da Câmara dos Representantes, a democrata Nancy Pelosi, exagerado até mesmo aos padrões de Trump. Um jornalista publicou um vídeo da democrata, dando explicações de por que não havia acusação formal de suborno contra Trump, quando ela havia assinalado tal fato sem rodeios dias atrás, e Trump o reproduziu com um “Porque os dentes de Nancy estavam caindo e ela não tinha tempo para pensar!”.

A grosseria, espontânea ou calculada, dá uma ideia da exasperação com a qual o julgamento político contra Trump irá acontecer, já que o desenlace da votação prévia já é conhecido —a Câmara dos Representantes, de maioria democrata, levará adiante as duas acusações— e o veredito parece escrito: o Senado, controlado pelos republicanos e onde se realiza o julgamento propriamente dito, absolverá o presidente.

Os democratas acusam Trump de abuso de poder por pressionar o presidente ucraniano, Volodimir Zelenski, para que anunciasse duas investigações que lhe beneficiariam eleitoralmente: uma, sobre seu rival político, o democrata Joe Biden, e seu filho, Hunter; e outra, sobre uma teoria desacreditada segundo a qual uma trama ucraniana interferiu nas eleições presidenciais de 2016 para tentar favorecer os democratas. A acusação sustenta, além disso, que Trump utilizou militares e um convite à Casa Branca como moeda de troca.

Esse processo de impeachment, o terceiro da história norte-americana, pode ser o mais partidário de todos. Os senadores republicanos já deram mostras de sua inabalável fidelidade a Donald Trump. O líder republicano do Senado, Mitch McConnell, admitiu no final de semana que está discutindo com a Casa Branca o formato do julgamento, um procedimento tão extraordinário que só está regulamentado em linhas gerais e cujo ritmo e conteúdo serão muito determinados pela maioria conservadora. “Tudo o que eu fizer, coordenarei com o advogado da Casa Branca”, disse McConnell, que além disso chamou as duas acusações contra Trump de “frágeis”.

Durante o julgamento na Câmara, os cem políticos sentados nas cadeiras são teoricamente membros de um júri que deve escutar a defesa e a acusação contra o presidente, revisar as provas, os argumentos e levar em consideração os depoimentos de testemunhas novas e já conhecidas. Depois, votam o veredito, mas alguns pesos pesados do partido adiantaram que não irão tentar manter as aparências. O veterano Lindsey Graham, presidente do Comitê Judicial na Câmara, afirmou na rede de televisão CNN que já havia “tomado uma decisão” e que não pretendia fingir que seria “um jurado justo”.

Graham, muito lembrado nesses dias como o grande flagelo de Bill Clinton durante seu impeachment, iniciado em 1998, agora faz parte da guarda pretoriana do presidente republicano e é esta que tem a faca e o queijo na mão no último estágio do processo, uma vez concluído na quarta-feira o trabalho na Câmara.

A votação prévia no Comitê Judicial nessa câmara já se ajustou perfeitamente às fileiras de cada partido: os 23 democratas presentes a favor das acusações contra Trump e os 17 republicanos, contra. Agora, um congressista democrata afirmou publicamente que votará contra o impeachment na quarta-feira. É Jeff Van Drew, de 66 anos, representante por Nova Jersey, que chegou ao Capitólio nas últimas eleições e decidiu se juntar ao Partido Republicano nos próximos dias, de acordo com fontes próximas ao político citadas pela imprensa norte-americana.

O chefe dos democratas no Senado, Chuck Schumer, enviou a McConnell uma carta em que propõe alguns elementos para o julgamento, como que comece em 7 de janeiro e sejam chamados para depor membros do alto escalão da Administração de Trump, como o chefe de Gabinete, Mick Mulvaney, além do ex-conselheiro de Segurança Nacional, John Bolton. Nenhum deles concordou em falar voluntariamente na Câmara, em que Trump impediu qualquer colaboração da Casa Branca. Esse é o motivo pelo qual um dos artigos do impeachment o acusa de obstrução ao Congresso.

O Comitê Judicial da Câmara baixa, presidido pelo democrata Jerrold Nadler, tornou público na segunda-feira seu relatório final com os argumentos para levar Donald Trump a julgamento político, um documento de 658 páginas que se aprofunda no escândalo da Ucrânia e acusou o mandatário de “trair a nação ao abusar do poder se seu cargo”.

A confirmação de culpa e a consequente destituição do mandatário só iriam adiante com o apoio de dois terços dos senadores (67 dos 100), de modo que a maioria de 53 republicanos garante a absolvição de Trump, já que nenhum deu mostras de deserção.

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