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Fernández aposta em superministro jovem e heterodoxo para negociar dívida da Argentina

Martín Guzmán, de 37 anos e discípulo do Nobel Joseph Stiglitz, será o ministro da Economia. Novo presidente diz que conversava “silenciosamente” com FMI havia semanas

Martín Guzmán, novo ministro da Economia argentino.
Martín Guzmán, novo ministro da Economia argentino.JUAN MABROMATA (AFP)

A volta de um “superministro da Economia”, como foram Domingo Cavallo durante o governo de Carlos Menem e a crise de 2001, ou Roberto Lavagna na primeira fase do kirchnerismo, é o traço mais notável do gabinete que acompanhará Alberto Fernández a partir da sua posse, na próxima terça-feira. Quem encabeça a lista de nomes é Martín Guzmán, um acadêmico de 37 anos que o novo presidente trouxe da Universidade Columbia (EUA). Guzmán trabalha com o Nobel Joseph Stiglitz e é especialista em renegociações de dívidas externas, o lastro que atrapalhará qualquer tentativa de recuperação econômica se a Argentina não conseguir pelo menos adiar os vencimentos.

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O nome de Guzmán foi apresentado na sexta, assim como todo o primeiro escalão do futuro Governo. Segundo Fernandéz, a equipe foi escolhida para “enfrentar um enorme desafio”, pois herdará um país em “situação financeira penosa”. O presidente eleito não quis antecipar seu programa de Governo, mas revelou que negociava “silenciosamente” com o Fundo Monetário Internacional (FMI) havia semanas e garantiu que sua prioridade será lutar contra a fome e melhorar as condições de vida dos cerca de 40% dos argentinos que vivem na pobreza.

A escolha do novo ministro da Economia era discretamente comentada nos corredores do poder e cresceu à medida que se aproximava o dia D. Fernández foi convencido pela leitura da crise da dívida feita por Guzmán e deixou em suas mãos que ponha em prática as ideias heterodoxas que o professor apresenta em sala de aula. Críticos advertem que ele nunca ocupou um cargo público e não tem experiência em gestão.

Guzmán é doutor em Economia pela Universidade Brown (EUA) e dirige o programa de Reestruturação da Dívida da Universidade Columbia. Seu desembarque em Buenos Aires foi mediado pelo próprio Stiglitz, o preferido da nova vice-presidente, Cristina Kirchner, entre os economistas estrangeiros. O Nobel foi um férreo defensor da gestão econômica do kirchnerismo e sempre criticou as recomendações do FMI aos países necessitados de financiamento, como a Argentina.

Em novembro passado, Guzmán apresentou às Nações Unidas em Genebra um possível plano para a Argentina. Disse na época que Buenos Aires não deveria pagar nem o principal nem os juros até 2022, nem pedir mais dinheiro ao FMI para pagar rentistas privados, além de evitar qualquer hipótese de moratória. Durante esse período de graça, a Argentina teria que reordenar suas contas para tornar a dívida mais “sustentável” em médio prazo.

Junto a Guzmán trabalhará Matías Kulfas, um economista de 47 anos que ocupará a pasta da Produção –depois de ter seu nome cogitado durante semanas para o Ministério da Economia. Fernández afinal optou pelo acadêmico de Columbia, mas a relação que mantém com Kulfas é muito próxima.

O novo ministro da Produção tem experiência política e está há anos na administração pública: foi gerente-geral do Banco Central durante o kirchnerismo e já passou como funcionário pelo ministério da Economia. Formado pela Universidade de Buenos Aires, Kulfas tem perfil heterodoxo e é especialista em processos nacionais de industrialização. Em várias ocasiões acusou Macri de ter liderado um “industricídio” na Argentina. Terá agora a oportunidade de recuperar o setor mais afetado pela herança macrista.

O tripé econômico de Fernández será completado por Miguel Pesce como presidente do Banco Central. Será um timoneiro com experiência: foi vice-presidente da instituição monetária entre 2004 e 2015, um recorde histórico que lhe permitiu acompanhar os quatro presidentes do BC nas gestões kirchneristas. Formado pela Universidade de Buenos Aires, seu berço político está na União Cívica Radical, centenário partido dos ex-presidentes Raúl Alfonsín e Fernando de la Rúa.

Seus contatos com Fernández datam de 2003, quando o então chefe de gabinete de Néstor Kirchner lhe encomendou a tarefa de representar o ministério da Economia junto à direção do Banco Central. Um dado pode ser revelador do perfil que dará a seu novo cargo: em 2010, defendeu o uso das reservas internacionais para pagar a dívida pública, algo a que se opunha com veemência o presidente da instituição, Martín Redrado. Redrado perdeu seu cargo, e Pesce o substituiu durante duas semanas como interino.



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