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Banco Mundial projeta uma queda no PIB de 4,6% na América Latina, a maior desde que há registros

México e Equador serão os mais atingidos em 2020, um ano em que o órgão não descarta resgates de empresas e em que pede o aumento da proteção

A avenida General Paz de Buenos Aires, praticamente deserta em pleno confinamento.
A avenida General Paz de Buenos Aires, praticamente deserta em pleno confinamento.Jam Media (EL PAÍS)
Ignacio Fariza

O coronavírus é a estocada final ao crescimento econômico da América Latina e o Caribe, que já estava prejudicado pela explosão social do final de 2019 – principalmente no Chile – e a queda no preço dos produtos básicos – dos quais muitos países da área continuam dependendo em grande medida –. A região fechará 2020 com uma queda do PIB de 4,6%, de acordo com a projeção publicada neste domingo pelo Banco Mundial. O número está na parte alta da posição prevista na mesma semana pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), que prevê uma queda de 1,8% a 5,5%, e significaria o maior baque econômico da região até onde chegam (1961) os registros históricos do próprio órgão com sede em Washington: deixaria para trás, bem para trás, o retrocesso de 2,5% de 1983 – em plena crise da dívida da América Latina, detonante da primeira década perdida – e o da Grande Recessão: em 2009 o PIB regional caiu apenas 1,9%. Entre os grandes países da área, o maior golpe seria no México e Equador (ambos com um retrocesso de 6%), seguidos da Argentina (-5,2%), Brasil (-5%) e Peru (-4,7%). A mordida será notavelmente menor no Chile (-3%) e na Colômbia (-2%).

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O desafio de congelar a economia
BRA104. BRASILIA (BRASIL), 09/04/2020.- Una persona limpia la placa del Banco da Caixa Economica Federal este jueves, en Brasilia (Brasil). Trabajadores informales y autónomos de Brasil comenzaron a recibir este jueves un subsidio de 600 reales (unos 120 dólares) aprobado por el Gobierno del presidente Jair Bolsonaro para paliar los efectos económicos de la crisis del coronavirus. EFE/ Joédson Alves
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People wearing facemasks as a precautionary measure against the COVID-19 coronavirus, queue up for free meal boxes given out by Gingko House restaurant workers (R) and volunteers from the basement of their Yau Ma Tei branch in Hong Kong on March 27, 2020. - Gingko House is a social enterprise devoted to promoting elderly employment in catering services. It has been giving away free meal boxes for lunch and supper at one of its branches in Yau Ma Tei for more than two years. In the past half year, registered meal box recipients doubled to nearly 1,000, according to project manager and social worker Joyce Mak. (Photo by Anthony WALLACE / AFP)
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A boa notícia virá no ano que vem em forma de ricochete: para 2021 o Banco Mundial espera um crescimento de 2,6%, o número mais alto desde 2013. Com toda a precaução possível – o tabuleiro está repleto de incertezas, talvez mais do que nunca –, todos os países da região, com exceção da Venezuela, do qual não mostra dados, voltarão a terreno positivo. Também a Argentina, que sairá, dessa forma, de uma já prolongada recessão com um crescimento de 2,2%. O ressurgimento mais rápido, entretanto, ocorrerá nos Estados andinos: o Peru crescerá 6,6%, a Colômbia 3,4% e o Equador 3,2%. Se a projeção do Banco Mundial se cumprir, todos eles serão capazes de suturar em somente 12 meses a brecha aberta neste nefasto 2020. A recuperação nas duas grandes potências latino-americanas será mais lenta: o México crescerá 2,5% e o Brasil apenas 1,5%. Os dois países precisarão de mais de dois anos (2021, 2022 e parte de 2023) para fechar o abismo aberto pelo coronavírus.

A margem de manobra é, em todo o mundo, menor à da crise financeira de 2008: há muito mais dívida acumulada, tanto pública como privada. Na América Latina, ainda que o espaço fiscal seja ainda mais estreito, o Banco Mundial pede para que os Executivos utilizem toda as ferramentas ao seu alcance para “evitar uma crise financeira” e proteger os elos mais frágeis da sociedade: não é o momento da austeridade. Nesse sentido, o multilateral urge à região que aumente sua aposta em políticas públicas que apoiem os muitos coletivos vulneráveis, aqueles que pelo confinamento veem definhar – e, nos casos mais extremos, diretamente evaporar – seus já por si baixos rendimentos. “Para ajudá-los a enfrentar a perda de ganhos derivada do isolamento social, os atuais programas de proteção e assistência social deverão ser ampliados rapidamente, assim como também sua cobertura”, diz o economista chefe do órgão, Martín Rama.

Com a informalidade como um dos grandes problemas irresolúveis, a região tem um desafio adicional no momento de tentar levar as ajudas a todos os lares: enquanto os países europeus e os Estados Unidos possuem bases de dados completas de atividades e fontes de rendimento de suas populações, de modo que podem agir diretamente onde o apoio é mais necessário, as autoridades latino-americanas enfrentam o problema adicional de fazer com que as ajudas cheguem aos seus beneficiários.

Os países latino-americanos e caribenhos têm, como diz Rama, uma história repleta de choques adversos – quedas abruptas nas matérias primas, crises financeiras e desastres naturais de todos os tipos – com os quais podem aprender no momento de elaborar uma estratégia de saída. “É uma experiência valiosa, mas a Covid-19 traz uma nova dimensão: as medidas necessárias para conter o surto produzem, também, um grande choque de oferta”, afirma Rama. Além desse fator há o problema da repartição da região, a mais desigual do mundo apesar da melhora nas últimas décadas. “Muitos lares vivem um dia após o outro e não têm recursos para enfrentar os isolamentos e muitos dependem, também, de remessas em rápida queda. Os Governos enfrentam o enorme desafio de proteger vidas e ao mesmo tempo limitar os impactos econômicos e precisarão de políticas dirigidas e coerentes em uma escala raras vezes vista antes”.

Socialização das perdas e resgates à vista

O vírus deixará cicatrizes profundas na economia e uma divisão das perdas (e das maiores cargas fiscais futuras) ainda no ar. “De um ponto de vista econômico, a resposta à pergunta de quem deveria suportar as perdas em última instância é simples: deveriam centralizar-se no Governo o máximo possível”, opinam os economistas do Banco Mundial. Diante de um choque “não assegurável” como o do coronavírus, “somente os Governos podem ser um garantidor de último recurso”. Um processo que, acrescentam, deve ser acompanhado de “uma comunicação clara sobre a maneira como essas perdas serão geridas”.

Essa socialização em grande escala poderia, de acordo com o órgão com sede em Washington, exigir a entrada do Estado no capital de “instituições financeiras e empregadores estratégicos” em programas que permitam uma recapitalização delas. Em outras palavras: tomada de posições no capital de bancos e grandes empresas para, através de injeções de liquidez, evitar sua quebra. “Esse apoio será fundamental tanto na preservação dos postos de trabalho como na futura recuperação”. Os técnicos do órgão veem o setor financeiro latino-americano, em linhas gerais, em uma posição de partida “forte”. “Mas a magnitude do choque é extraordinária”, alertam. “No plano externo, a região está sofrendo uma saída de capitais maior até mesmo do que durante a crise financeira global. E no doméstico, muitos devedores não poderão cumprir com suas obrigações e serão levados à renegociação e, simplesmente, ao calote”. O naufrágio da atividade deixa os Estados como único recurso para evitar que a recessão de 2020 se transforme em algo muito mais grave: uma depressão econômica em grande escala. Com maior ou menor margem fiscal, são a última proteção possível.

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