_
_
_
_
_

Avanço do coronavírus provoca a maior queda do mercado de ações desde o referendo do Brexit

Bolsa de Milão despenca cerca de 6%, enquanto o restante cede mais de 3%; ações do setor turístico são as mais afetadas

Javier Salvatierra
Painéis na Bolsa de Madri.
Painéis na Bolsa de Madri.EFE
Mais informações
Masked carnival reveller wears protective face mask at Venice Carnival, which the last two days of, as well as Sunday night's festivities, have been cancelled because of an outbreak of coronavirus, in Venice, Italy February 23, 2020.  REUTERS/Manuel Silvestri
Milão fecha escolas e Veneza cancela o Carnaval para conter o coronavírus
Iraqi medical staff check passengers' temperature, amid the new coronavirus outbreak, upon their arrival at Najaf airport, Iraq February 20, 2020. REUTERS/Alaa al-Marjani.
Luta contra o coronavírus entra em estágio inédito com rápida dispersão da doença
Ministro da Defesa, Fernando Azevedo, para redes
Brasil suspende quarentena de 58 pessoas após não registrar infecção pelo coronavírus

O avanço do coronavírus durante o fim de semana em países como Coreia do Sul ou Itália, com a ameaça à economia que implica, provocou na segunda-feira uma queda inédita no mercado de ações desde o referendo de saída do Reino Unido da União Europeia. Na Espanha, o Ibex registrou queda de 4,07%, a maior desde os históricos 12,35% em junho de 2016. Pior foi na Itália, onde a Bolsa de Milão perdeu 5,43%, enquanto Londres, Paris e Frankfurt caíram entre 3% e 4% ―o mercado brasileiro não abriu, por conta do Carnaval. O medo do impacto do vírus na economia mundial também fez despencar a cotação do petróleo em quase 5%, até 55,6 dólares (cerca de 244 reais) o barril, enquanto o ouro, valor de refúgio por excelência, subiu mais de 1,5%.

“Os investidores em renda variável abriram os olhos para o risco representado pelo coronavírus”, explicou a este jornal Nuria Álvarez, analista do banco Renta 4. “Os mercados de dívida, que estavam caindo havia dias, diziam uma coisa, e a Bolsa, em alta, dizia outra”, resumiu. Até o domingo. No fim de semana, notícias sobre o avanço da doença do Covid-19 vindas da Coreia do Sul (sete mortos, mais de 800 contagiados), do Irã (meia centena de mortos em uma cidade) e, principalmente, da Itália, com seis mortos, fechamento de escolas e restrições de deslocamentos em várias regiões do norte do país acabaram ampliando o medo de que a epidemia represente um risco importante para a economia mundial.

“Hoje, depois da primeira fase do acordo entre os EUA e a China sobre a guerra comercial, o coronavírus é a maior ameaça no curto prazo”, disse Álvarez, que assume que sua evolução e o impacto real que pode ter são muito difíceis de prever, especialmente quando ainda não foram publicados dados macroeconômicos que possam fornecer pistas. No domingo, a diretora administrativa do FMI, Kristalina Georgieva, alertou que o crescimento da economia mundial poderia cair um décimo de ponto percentual, ficando em 3,2% este ano. Gilles Moëc, economista da AXA Investment, lembrou em uma análise que “a Lombardia, o Vêneto e a Emilia-Romana [as regiões italianas mais afetadas] representam 40% do PIB na Itália e 6% do PIB total da zona do euro”.

Assim, as bolsas de valores europeias entraram em pânico na segunda-feira. Embora Xangai tenha limitado a queda a 0,28%, com um feriado em Tóquio, o Hang Seng de Hong Kong caiu 1,8% e o índice Kospi de Seul afundou 3,87%, antecipando o desastre na Europa. Finalmente, as bolsas europeias perderam entre 3,3%, no caso de Londres, e 5,4%, do índice da Bolsa de Milão.

Enquanto isso, o Ibex da Espanha caiu 4,07%, com as ações relacionadas ao setor do turismo entre as mais atingidas. Assim, o consórcio de companhias aéreas IAG e Meliá registraram as piores performances, com quedas de 9,3% e 7,5%, respectivamente, enquanto a Aena perdeu 5% e a Amadeus 5,2%. Entre as maiores baixas também estão as siderúrgicas ArcelorMittal e Acerinox, com quedas de 6,9% e 5,1%, respectivamente, e a fabricante de autopeças CIE Automotive, que cedeu mais de 3%.

“Faz sentido que caiam as ações relacionadas aos recursos básicos, por medo de uma desaceleração da economia chinesa e mundial, ou as do setor do turismo”, disse Susana Felpeto, diretora de renda variável da ATL Capital. De fato, a analista manifestou sua surpresa pelo fato de as Bolsas de Valores, já em níveis muito altos, não terem refletido na semana passada o aviso lançado pela Apple de que suas contas seriam afetadas por problemas de fornecimento na China.

De qualquer forma, nenhum valor subiu no Ibex. Os bancos cederam pouco mais de 3%, a Repsol 5,6%, a Naturgy 4,1% e a Inditex, que possui centenas de lojas e quase dois mil fornecedores na China e que tem a Itália como um de seus mercados mais importantes, 6,2%. As operadoras Telefónica e MasMovil e a empresa de eletricidade Iberdrola ficaram entre as que, ao lado de Viscofan e Ence, registraram as menores quedas. Felpeto se mostrou otimista com a evolução das Bolsas no médio prazo, “mas não nesta semana. Ainda podem corrigir (baixar) um pouco mais”.

Europa

Na Europa, o maior tombo foi o do índice MIB, de Milão, com uma queda histórica de 5,43%. A maior baixa foi a da Juventus de Turim, um time de futebol com sede no Piemonte, uma das regiões afetadas e que, além disso, poderia ter seus próximos jogos cancelados se os casos de contágio continuarem. Cedeu 11%. O impacto no setor do luxo se refletiu na queda de 8,9% da empresa de moda Salvatore Ferragamo. Durante o final de semana a Itália decretou o fechamento de colégios, escolas e universidades em várias regiões do norte do país, a entrada nas regiões do Vêneto e da Lombardia foi restrita, 50. 000 pessoas de 11 municípios foram isoladas e quatro partidas do futebol da Série A foram canceladas para conter a propagação do vírus. Sete pessoas morreram no país por causa do Covid-19.

No resto da Europa, a Bolsa de Londres caiu 3,3%, o CAC de Paris perdeu 3,94% e o Dax alemão 4,01%. Também na Europa, os valores mais afetados foram os relacionados ao turismo, ao luxo e aos produtos básicos. A operadora turística TUI caiu 9,8%, a IAG 9,1%, a mineradora Anglo American 8,5%. A Easyjet cedeu 16,67%, a Ryanair 13,46%, a Lufthansa 8,8% e a Air France 8,68%. A rede hoteleira Accor perdeu 5,5%, a têxtil Burberry 4,4% e a LVMH, o grupo de produtos de luxo que inclui, entre outros, a Louis Vuitton, 4,6%. As montadoras também não se salvaram: Peugeot, -6,9%; Renault, -6,6%; Daimler, -6,7%, Volkswagen, -5,43%, Ferrari, -5,1% e FIAT, -5,96%.

Por sua vez, o petróleo também reflete o impacto da crise sanitária global, com uma queda de 4,9% no preço do barril de Brent, o petróleo de referência na Europa, para 55,6 dólares. Por outro lado, os valores de refúgio se valorizaram. Assim, um tradicional, como o ouro, se beneficiou da fuga de outros valores e subiu 1,6%, para 1.676 dólares a onça, embora em alguns momentos tenha ultrapassado os 1.690 dólares. No início do mês, estava quase 100 dólares mais barato. Também a dívida soberana alemã aprofundou seus valores negativos, com a rentabilidade dos títulos de 10 anos caindo ainda mais. Cedeu quase 0,5%, quando no início de fevereiro a queda era de 0,35%. Assim, o prêmio de risco espanhol subiu para 69 pontos base (+3), enquanto o italiano subiu nove pontos, para 144. O euro também registrou quedas em relação ao dólar norte-americano, fechando em 1,09 dólares.

Mais informações

Arquivado Em

Recomendaciones EL PAÍS
Recomendaciones EL PAÍS
_
_