_
_
_
_
_
Música brasileira
Perfil
Texto com interpretação sobre uma pessoa, que inclui declarações

Duda Beat, a rainha da sofrência pop: “Todo mundo já amou sem ser correspondido, já levou um pé na bunda”

Na transição entre o êxito do primeiro álbum e a preparação do segundo, a rainha da sofrência pop vive o ‘meiostream’ enquanto se prepara para apresentar aos fãs uma persona mais madura e feliz

A cantora Duda Beat em sua casa, no Rio de Janeiro.
A cantora Duda Beat em sua casa, no Rio de Janeiro.FERNANDO TOMAZ (Divulgação)

A mulher perdidamente apaixonada, a última romântica, uma egoísta. A adepta de um amor bem gostosinho e sem compromisso, mas que clama pertencer a um tempo contrário ao presente, onde os amores são para sempre. Nos pouco mais de dois anos de carreira, Eduarda Bittencourt, de 33 anos, a Duda Beat (brincadeira com beat do movimento Mangue Beat que, assim como ela, é natural de Pernambuco), vem entoando as dores e delícias de uma geração de sentimentos intensos e intermitentes. Sofre-se, mas se chora dançando.

Nas 11 faixas de Sinto Muito — um trabalho independente com produção de Tomás Tróia, seu guitarrista e hoje seu marido, e com Lux, tecladista, e que abriga o hit Bixinho — com x mesmo —, Duda canta as desilusões de uma mulher que, como ela mesma diz, transborda um amor não correspondido. A primeira frase do álbum, da música Bédi Beat, já mostra de cara sua intensidade: “eu vivia à flor da pele, nem percebia que das vezes que eu ria era vontade de chorar”.

Mais informações
Herdeiros da MPB
Especial | Gils, Jobins, Buarques, Velosos... A sucessão na majestosa família da música brasileira
El cantante y compositor brasileño Caetano Veloso durante el documental 'Narciso de vacaciones'.
Caetano Veloso: “Minhas expectativas sobre o Brasil não são tanto a esperança. São mais a responsabilidade”
A cantora Adriana Calcanhotto.
Adriana Calcanhotto: “A política cultural é inexistente no Brasil”

Mas se a Beat fever ainda não afetou o seu sistema imunológico, talvez te passem despercebidos alguns detalhes, como o fato de que, apesar de ter sido catapultada ao posto de rainha da sofrência pop pela estética nada discreta e música exuberante, foi no silêncio que Eduarda se deu conta de que o seu futuro não estava nas elucubrações a respeito do ethos que tinha na Faculdade de Ciência Política que frequentava à época e muito menos na Medicina, sonho antigo que lhe roubou sete anos de aulas em cursinhos de pré-vestibular.

Depois de sucessivas decepções amorosas e um futuro ainda turvo no quesito carreira, por indicação de uma amiga, se matriculou em um retiro de meditação onde passou 10 dias em completo silêncio. Foi então, absorta em seus pensamentos, que Eduarda se deu conta que o seu gosto duvidoso para homens ligados à música na verdade escondia uma forte ligação dela mesma com a primeira arte. “Foi uma iluminação: se eu sempre me apaixono por músicos, eu devo gostar desse mundo, do palco. Então vou fazer isso para viver”. Nesse caso, o amor foi correspondido.

Sem nunca ter escrito uma canção sequer, saiu do retiro com a ideia já fixa na cabeça. Entrou em contato com o músico Tomás Tróia —na época, apenas um amigo—, e o convidou para que ele produzisse aquilo que a sua cabeça ainda marinava. “Todo mundo já amou sem ser correspondido, já levou um pé na bunda. Foi uma coisa que realmente veio do coração, acreditava que aquilo ia tocar as pessoas e que elas sentiriam empatia”, conta.

Veio ao mundo, então, a Duda Beat nos termos que hoje se conhece: a loira platinada, sempre de gloss nos lábios, acessórios neon e figurinos que poderiam ser aproveitados em desfiles do Met Gala, que canta toda a enxurrada de sentimentos que transborda pelos gadgets da geração Z. Fazem parte do primeiro disco versos como “Se não quer/Não me dá like”; “Minha mãe me ensinou/Que se é pra brincar de amor/Não pode ser desesperada”; e o mais famoso, “Só mais uma vez não vai fazer diferença”.


A cantora Duda Beat em sua casa, no Rio de Janeiro.
A cantora Duda Beat em sua casa, no Rio de Janeiro.Fernando Tomaz

A sofrência empoderada rendeu à pernambucana o troféu de Artista Revelação no Prêmio Multishow e Women’s Music Awards de Melhor Show, ambos em 2019. No Spotify, as suas músicas somam 100 milhões de plays. O clipe de Bixinho, de baixo orçamento mas não menos fiel à sua estética, tem mais de 11 milhões de visualizações. Entre as parcerias musicais firmadas, nomes como Ivete Sangalo, Daniela Mercury, Jaloo e Nando Reis. “Eu sempre tive segurança em mim. Uma pessoa que tenta Medicina sete vezes não desiste fácil, eu corro atrás, vou estudar, procuro reconhecer meus erros e aprender. Eu ainda me vejo nesse lugar de meiostream (gargalha), porque estou fazendo as coisas pouco a pouco, tenho muito que aprender”, reflete.

Com um novo disco gravado durante a quarentena e com previsão de lançamento no primeiro semestre de 2021, Duda pretende dar sequência ao Sinto Muito, para “continuar com esse título de rainha da sofrência pop”, define ela, aos risos, e canta ao outro lado do telefone, com o carregado e doce sotaque recifense: “Eu não vou buscar a felicidade em mais ninguém”. Esse é um trecho de sua canção Bolo de Rolo. “Essa é a frase que me representa muito, essa coisa de que a gente tem que olhar para gente e se amar”.

E Duda aprendeu a se amar. Sua relação com a moda, que vem desde a adolescência, foi uma grande parte desse aprendizado. As mangas bufantes que oscilam entre cores vibrantes e tons pastel e os grandes laços que a caracterizam são reflexo do seu “encontro de alma” com seu stylist, Leandro Porto. “Acredito que a roupa é uma extensão da nossa arte, conversa com a letra, a melodia, a narrativa que quero contar. Com cada estética, eu comunico algo ao meu público. Ser mulher no Brasil é sofrer pressão estética o tempo todo, mas eu lido com isso da melhor forma possível, eu amo meu corpo, não tenho medo de usar as roupas que eu uso. Sou muito bem resolvida com isso”, garante.

Ela também não tem medo de se posicionar politicamente nas redes sociais, seja falando em defesa dos trabalhadores da cadeia produtiva da música, alguns dos mais afetados pela crise econômica da covid-19, ou criticando o governo de Jair Bolsonaro pela má gestão no controle da pandemia. “Me posiciono politicamente porque é muito natural para mim. Eu quero que meu público saiba que voz ele está seguindo ali, acho que é uma maneira de eles me conhecerem também”, diz.

Enquanto se mantém ativa e criativa na quarentena, pensando também formas de ajudar sua equipe —graças à live que fez no Dia dos Namorados, pôde remunerar a todos—, ela continua trabalhando, já em modo de despedida, do Sinto Muito. O adeus definitivo talvez seja o clipe de Pro mundo ouvir. “Essa música é meu xodó, foi a primeira que compus pro disco”, derrete-se ela.

Duda Beat não para. E ela não vai buscar a felicidade em mais ninguém.




Mais informações

Arquivado Em

Recomendaciones EL PAÍS
Recomendaciones EL PAÍS
_
_