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John Lennon e Yoko Ono: uma parceria criativa e amorosa

O grande casal do rock suportou os excessos com as drogas, a perseguição política, os impulsos sexuais de John com outras mulheres e o fardo de responsabilizá-la pela separação dos Beatles

O cantor John Lennon posa de pijama na cama com sua mulher, Yoko Ono.
O cantor John Lennon posa de pijama na cama com sua mulher, Yoko Ono.Cordon Press
Fernando Navarro
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Comecemos pelo final. Pela última imagem que se tem deles. Por aquela lendária fotografia de John Lennon nu abraçando Yoko Ono. Uma imagem captada poucas horas antes de o cantor —que teria completado 80 anos em 9 de outubro— ser assassinado na porta de sua casa por um fã. Lennon & Ono. Um amor que antecipou o fim dos Beatles e que se tornou o mais famoso de seu tempo. Uma marca. Dois nomes que formando um só passaram à história como o grande casal do rock. No entanto, Lennon e Ono não foram o casal idílico de Imagine.

Falamos em começar pelo final. Por aquela famosa imagem em que alguns encontraram teorias proféticas sobre a morte do músico em razão de sua posição fetal enquanto Yoko vestia o preto do luto. Em 1980, a revista Rolling Stone havia encomendado a Annie Leibovitz uma reportagem com o casal para ser a capa por ocasião do lançamento de Double Fantasy, um álbum em que Lennon, depois de cinco anos longe da indústria fonográfica, exaltava a vida de casado em Nova York e voltava à antiga colaboração artística com sua mulher, como havia acontecido em seus primeiros discos de vanguarda. Tanto era assim que no álbum eles se revezaram cantando. A famosa imagem surgiu espontânea, mas o destino queria que impactasse a todos na capa do especial de janeiro de 1981 em homenagem a John Lennon após seu assassinato.

Capa da revista 'Rolling Stone' de janeiro de 1981, em que John Lennon aparece nu e abraçando Yoko Ono, vestida de preto, e que foi considerada a melhor dos últimos 40 anos.
Capa da revista 'Rolling Stone' de janeiro de 1981, em que John Lennon aparece nu e abraçando Yoko Ono, vestida de preto, e que foi considerada a melhor dos últimos 40 anos. magazine.org

Uma fotografia icônica. Símbolo de um amor midiático. De dois seres sempre prontos para atuar, mas que, quando se observa bem, mostra um Lennon suplicante, beijando nu sua mulher e envolvendo-a com os braços, enquanto ela, vestida de jeans e camiseta e com seus cabelos negros desgrenhados, reflete uma certa indiferença, quase desdém. Yoko Ono sempre suportou o estigma de que a culpa da separação dos Beatles era dela, mas também aguentou os caprichos e os vaivéns do grande astro do rock. Mais do que de felicidade, seu rosto é de resignação.

Conheceram-se em 1966, justo quando os Beatles pararam de se apresentar ao vivo. Foi em uma galeria de arte em Londres onde ela inaugurava uma exposição. Lennon, viciado em ácidos, chegou drogado e hesitou ao ver suas obras. Ela, que já havia exposto nos Estados Unidos e no Japão, era uma estrela no mundo da anti-arte, uma derivação artística que o beatle desconhecia e que acabou absorvendo. Eles se deram bem, mas só em um segundo encontro em outra exposição surgiu a faísca. A relação começou com um frenesi artístico, compartilhando ideias e projetos para, em questão de dias, se tornar afetiva, mas foi condicionada pelo casamento de Lennon com Cynthia, muito querida pelo restante do grupo e, principalmente, por Paul McCartney. Durante o tempo que os Beatles passaram na Índia meditando, Yoko, separada do primeiro marido, lhe enviava cartas clandestinas. Nelas, só se lia: “Procure por mim, sou uma nuvem no céu”. Lennon seguiu o rastro daquela nuvem e, no retorno à Inglaterra, acabou correndo para Yoko, a ponto de Cynthia os encontrar em sua casa de roupão. A artista japonesa tinha ido gravar algumas músicas e o beatle e ela acabaram na cama.

A união criativa e sexual se transformou em carreira artística e amorosa. Lennon não sabia separar uma coisa da outra e, por isso, a levou para o estúdio de gravação com os outros Beatles durante a gestação do Álbum branco, em 1968, o que aprofundou as diferenças no grupo. Yoko nunca foi a causa da separação dos Beatles, mas um elemento a mais —importante— no desgaste da banda mais famosa do mundo. Era Lennon, mais cansado de ser um beatle do que qualquer outro membro, quem procurava uma saída e a encontrou em Yoko Ono. Ambos formaram uma nova sociedade que se movia na vanguarda artística. Estrearam em dezembro de 1968 no Royal Albert Hall dentro de um saco branco sem fazer nenhum ruído, mas se contorcendo de dor. Era o tiro de largada do bagism, o termo que inventaram para promover a paz mundial e satirizar os preconceitos, e que Lennon incluiria em canções como The ballad of John and Yoko e Give peace a chance.

Yoko Ono, John Lennon e Paul McCartney na estreia de 'Yellow submarine’, em Londres.
Yoko Ono, John Lennon e Paul McCartney na estreia de 'Yellow submarine’, em Londres. Cummings Archives (Redferns)

De união de Lennon & McCartney à de Lennon & Ono. A rivalidade entre os dois gênios dos Beatles rompeu a banda, mas também era tamanha que John improvisou um casamento expresso com Yoko, que não estava muito entusiasmada com a ideia, assim que soube do casamento de seu amigo Paul com Linda Eastman em março de 1969. Pegou um jato particular e quis celebrar seu casamento primeiro em Paris e depois em Amsterdã, mas, diante da impossibilidade legal de dois estrangeiros fazerem isso tão rápido, acabaram se casando em Gibraltar.

Decidiram celebrar a lua de mel no famoso encontro na cama com a imprensa em Amsterdã. Dando asas ao bagism, o novo casal realizou seu conhecido bed-in for peace, passando uma semana sem sair de uma cama de hotel e respondendo a todo tipo de perguntas. Uma ideia absurda que resultou em muito pouco em comparação com o disparate de álbum que lançaram intitulado Wedding album, uma obra experimental onde ambos ficam por mais de 20 minutos se chamando aos gritos. O casal mais midiático do mundo também se tornara o mais chato.

Nos primeiros quatro anos passaram todos os minutos do dia juntos. Enfrentaram um aborto, os excessos com as drogas, a perseguição política e os impulsos sexuais de John com outras mulheres. Lennon culpava Yoko por ter perdido o apetite sexual e costumava dizer a ela: “Você é como uma daquelas damas vitorianas, fica aí jogada e pensa na Inglaterra”. Por fim, ela aceitou um relacionamento aberto e até mesmo incentivou sua assistente pessoal a ser amante de seu marido. Foi o que ficou conhecido como “fim de semana perdido de Lennon”, ou seja, uma relação de 18 meses do músico na Califórnia com May Pang, 23 anos e de ascendência chinesa.

Após o nascimento de Sean em 1975, filho único de Yoko e John, o ex-beatle se esforçou para recuperar a vida com sua mulher, com quem voltou a compartilhar projetos e causas. Foi a época mais tranquila de sua existência, que ele descreveu como “seus dias do Dakota”, alguns anos em Nova York como marido e pai de família que duraram até o dia em que foi feita a foto mítica abraçando Ono, horas antes de levar cinco tiros pelas costas, de Mark David Chapman, diante do Edifício Dakota.

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