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Yuh-Jung Youn, a avó desbocada que pode levar o Oscar com ‘Minari – Em busca da felicidade’

A primeira atriz coreana a aspirar ao prêmio da Academia de Hollywood é a favorita depois de ganhar os prêmios do Sindicato dos Atores e o BAFTA

Yuh-Jung Youn com o menino Alan Kim em uma cena de ‘Minari – Em Busca da Felicidade’.
Gregorio Belinchón

“Obrigado pelo prêmio. Cada galardão é valioso, mas este é mais, porque é um reconhecimento dos britânicos, conhecidos por seu esnobismo [snobbish], que me aceitam como atriz. E isso me deixa muito feliz. Muito obrigada”. Assim terminou o discurso de agradecimento no domingo à noite de Yuh-Jung Youn, a atriz coreana que encarna a avó desbocada de Minari – Em busca da felicidade, depois de ganhar o BAFTA de melhor atriz coadjuvante. Sem papas na língua, provocando com a frase espirituosa comentários bem humorados na imprensa inglesa, Youn retratou em uma frase tanto o seu caráter quanto o de seu personagem no drama de Lee Isaac Chung, que obteve seis indicações ao Oscar e que tem nela seu maior trunfo para conseguir uma estatueta. Um reconhecimento para uma mulher que começou no cinema em 1971, alcançou o estrelato rapidamente, abandonou a carreira ao se casar e que neste século XXI voltou a ser um dos rostos mais populares de seu país, com mais de 80 papéis em séries de televisão.

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Em uma entrevista ao EL PAÍS, Chung brincou: “Depois do sucesso de Parasita no ano passado, e vendo como estão as coisas com Minari, poderíamos inaugurar uma nova categoria no Oscar, a de melhor filme coreano do ano”. É verdade que seu filme é 100% norte-americano e que quase todos os atores são asiático-americanos. Mas existem algumas conexões entre um dos filmes indie do ano nos EUA e a pujante indústria cinematográfica coreana. E uma delas é Youn, popular entre os cinéfilos atentos às estreias dos festivais e que agora viu a sua lenda crescer. “Sou muito famosa no meu país porque estou nesta profissão há muitos anos. Mas não me perguntem sobre meu futuro internacional nem sobre o Oscar, porque não sei o que vai acontecer”, disse na entrevista coletiva posterior aos BAFTA, que concedeu de Seul. Com a pandemia, ela foi poupada, como bem lhe disse Bong Joon-ho, o diretor de Parasita, de ter que fazer uma longa divulgação do filme nos EUA, de cidade em cidade e de almoço em almoço, atrás do Oscar. Sua vida foi reduzida e simplificada a um eterno Zoom. É a favorita depois de ganhar o prêmio britânico, o troféu do Sindicato dos Atores, ser candidata em sua categoria no prêmio Spirit de cinema independente e de ter sido recompensada com cerca de 20 prêmios de associações de críticos e de festivais. E em suas aparições, é vestida pela Dior Alta Costura.

A atriz nasceu em 1947, em Kaesong, no norte de seu país, embora tenha crescido, órfã de pai, em Seul. Começou a estudar Literatura e Língua Coreana na universidade quando passou no teste de atuação para a televisão TBC. Abandonou os estudos e em 1967 estreou na telinha. Deu o salto para o cinema em grande estilo em 1971, com Woman On Fire, de Kim Ki-young, o iniciador do cinema coreano moderno, no qual interpretou uma femme fatale, sua especialidade no início da carreira, e conquistou seu primeiro prêmio: o de melhor atriz no Festival de Sitges. Sob a direção de Kim, a atriz não teve medo de se arriscar em filmes como The Insect Woman (1972) e Be a Wicked Woman (1990). Esse salto no tempo ilustra a primeira e arriscada decisão de Youn: no auge de sua carreira, ela se casou com o cantor e estrela de televisão Jo Young-nam e eles se mudaram para a Flórida. Lá, afastada do mundo do espetáculo, foi mãe de dois filhos, até que se divorciou e mais de 10 anos depois voltou ao país natal. Em uma entrevista ao The New York Times, Youn lembra como foi complicado esse retorno: “Os telespectadores ligavam para as emissoras de televisão e diziam: ‘Ela é divorciada. Não deveria aparecer na tela’. Agora me idolatram. É estranho, mas humano. Valeu a pena, embora eu tenha considerado desistir e voltar para os EUA. Hoje, finalmente, sinto-me bem interpretando”.

Yuh-Jung Youn no domingo antes dos BAFTA, vestida pela Dior Alta Costura, com design de Maria Grazia Chiuri.
Yuh-Jung Youn no domingo antes dos BAFTA, vestida pela Dior Alta Costura, com design de Maria Grazia Chiuri. Yoon Jiyong & Alvin Goh

Youn fez e aceitou de tudo para criar os filhos: qualquer personagem menor em uma série de televisão servia. Quando seus filhos foram para a universidade não precisaram mais do seu apoio financeiro e ela começou a poder escolher seus trabalhos. Quando completou 60 anos, prometeu a si mesma colaborar apenas com quem lhe apetecesse. E assim, neste século XXI, a coreana se tornou um rosto habitual nos festivais por suas aparições em filmes de dois grandes nomes: Hong Sang-soo e Im Sang-soo. Com Hong fez quatro filmes, como A Visitante Francesa e Certo Agora, Errado Antes. Com Im fez outros quatro, e seu trabalho causou forte impressão em A Empregada. No entanto, não desprezou a televisão. Nos últimos tempos apresentou um reality show de culinária na Coreia (que já está na terceira temporada) e uma série de não ficção ambientada em um albergue. A indicação ao Oscar a pegou recém-chegada de Vancouver (Canadá), onde gravou a série Pachinko, para a Apple TV.

Chung, que em Minari ilustra as vicissitudes de sua família no Arkansas dos anos oitenta, conheceu Youn em 2018, no festival coreano de Busan, um dos mais importantes da Ásia. O diretor, que assim como Bong é fã de Woman On Fire, queria conhecer a protagonista. Eles simpatizaram e, em sua conversa com o The New York Times, a atriz afirma: “Ele é um homem muito tranquilo. Queria que fosse um dos meus filhos”.

A propósito, depois dos Bafta, Youn esclareceu seu comentário: “Bem, nasce da minha experiência pessoal. Visitei o Reino Unido várias vezes e até fiz um curso de interpretação em Cambridge há 10 anos. E as pessoas são esnobes, mas não de maneira negativa. Eles têm uma longa história nas costas e isso os deixa orgulhosos. Como mulher asiática, sinto que eles são uns esnobes, de verdade”.

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