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Covid-19 se espalha por órgãos públicos em Brasília enquanto Congresso ensaia pressionar presidente após morte de Major Olímpio

Câmara já registrou 21 mortes. Senado e 19 dos 23 ministérios se recusaram a responder a levantamento do EL PAÍS sobre vítimas. Pressionado, Arthur Lira suspende trabalho presencial de servidores

Protesto feito pelo Sindicato dos Servidores do Poder Legislativo com a frase "Vacina Já" no Ministério da Saúde, em Brasília.
Protesto feito pelo Sindicato dos Servidores do Poder Legislativo com a frase "Vacina Já" no Ministério da Saúde, em Brasília.UESLEI MARCELINO (Reuters)

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Em um período de três horas desta quinta-feira, o Departamento Médico da Câmara dos Deputados recebeu 20 atestados de funcionários que pediam licença para se tratarem de covid-19. No dia anterior, foram quase 60, segundo observado pelo vice-presidente do Sindicato dos Servidores do Poder Legislativo, Paulo Cezar Alves. Até a última semana, a Câmara havia registrado ao menos 21 óbitos de funcionários e 482 contágios desde março de 2020. Os números dão ideia de que a onda que varre o Brasil e nesta quinta-feira vitimou o senador Sérgio Olímpio Gomes (PSL-SP), o Major Olímpio, tem atingido com toda a intensidade órgãos públicos de Brasília que, em grande parte, decidiram retomar o trabalho presencial ou semipresencial.

No decorrer do dia, os senadores demonstraram indignação com o que consideram inépcia do Governo Jair Bolsonaro na atuação contra a pandemia. Após a morte de Olímpio, passaram a se articular para definir ações a serem tomadas. Começaram com a divulgação de um vídeo nas suas redes sociais em que o próprio Olímpio pedia para ser vacinado. Há um clima de indignação e consternação entre boa parte dos parlamentares. Parecem ter notado o descalabro apenas agora, quando morre o terceiro senador ―o outros foram José Maranhão e Arolde Oliveira― e o país caminha para chegar aos 300.000 óbitos, enquanto o presidente segue seu roteiro de sempre: duvidou do colapso da saúde nos Estados, com a superlotação de UTIs, e disse que vai recorrer ao Supremo Tribunal Federal contra os lockdowns.

Os casos dos servidores, no entanto, se acumulam e não há o mesmo destaque midiático do que o que acomete seus chefes. Vários se veem obrigados a voltar ao dia a dia, pois, no caso dos terceirizados, temem perder benefícios, como o auxílio alimentação ou, pior, o próprio emprego. Acabam se tornando números na pandemia. Muitas vezes, nem isso, já que 18 dos 23 ministérios do Governo Jair Bolsonaro, além do Senado Federal, se recusaram a responder à reportagem sobre o número de funcionários contagiados e óbitos registrados em decorrência de coronavírus nos últimos 12 meses. Na prática, entram para a contabilidade da Secretaria de Saúde do Distrito Federal, mas quase ninguém sabe quem são eles. Na capital do Brasil, 5.274 morreram dessa doença e 324.576 se contaminaram

Das cinco pastas que responderam, total ou parcialmente, aos questionamentos feitos pelo EL PAÍS, somados aos dados enviados pela Câmara, é possível afirmar que ao menos 91 servidores públicos perderam suas vidas para essa doença. E ainda houve 4.319 infectados.

No cálculo não estão os três senadores que morreram do vírus ―Olímpio, José Maranhão e Arolde Oliveira― nem o sargento do Exército Silvio Kammers, ajudante de ordens do presidente Jair Bolsonaro que teve seu nome omitido pelo Palácio do Planalto até a última quarta-feira, quando a imprensa brasileira noticiou o caso.

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Entre os cinco ministérios que responderam às perguntas, o que registrou mais mortes foi o Ministério da Economia, 49, seguido pela Agricultura, 19, e Justiça, 2. A pasta da Saúde, informou apenas o número de contagiados 333, mas não o de mortos. E a CGU informou que não foram registrado óbitos. Entre os outros 18 ministérios, nenhuma informação sobre essa contabilidade foi dada. No caso do Gabinete de Segurança Institucional, a resposta foi a de que a reportagem deveria acionar a Lei de Acesso à Informação para obter os dados. Ou seja, por conta dos prazos para cumprir a lei, a resposta poderia demorar até um mês.

Trabalho presencial e reação no Congresso

Na Câmara, uma das vítimas foi a chefa da secretaria de controle interno, Creuzi Rodrigues da Silva, de 60 anos. Ela, o marido e o filho se contaminaram com a doença. Seu caso foi o mais grave na sua família. Seus colegas e parentes ficaram três dias em busca de um leito em UTI, conseguiram no último dia 8, mas ela não resistiu aos sintomas e morreu no dia seguinte. Trabalhava no Legislativo havia 29 anos. Estava em teletrabalho até janeiro, mas foi obrigada a frequentar o Congresso Nacional em fevereiro, quando Arthur Lira (PP-AL) assumiu a presidência da Casa e determinou o retorno do trabalho presencial.

Nesta quinta-feira, Lira voltou atrás na medida e decidiu restringir a circulação de parlamentares e funcionários pelas próximas duas semanas. Os jornalistas da TV e a da Rádio Câmara foram orientados a não fazerem mais a transmissão ao vivo presencialmente depois que um dos funcionários do setor foi diagnosticado com coronavírus. O deputado sentiu-se pressionado pela maior parte dos parlamentares, assim como, indiretamente, por Rodrigo Pacheco (DEM-MG), o presidente do Senado que conclamou um “pacto nacional” de combate ao coronavírus. “Precisamos mais do que nunca de uma união nacional, um pacto nacional contra essa doença. Nossa tristeza que estamos sofrendo, com pessoas próximas, é uma tristeza que milhares de pessoas estão sofrendo no Brasil, e é preciso que nós da classe política façamos alguma coisa”, disse Pacheco em entrevista ao programa Brasil Urgente, da Band. Pacheco tem nas mãos um pedido de CPI para investigar a gestão Jair Bolsonaro. Até o momento, no entanto, prefere usá-lo apenas como instrumento de pressão política.

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