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Ministro Celso de Mello se licencia e eleva incerteza sobre casos de Bolsonaro e Moro no STF

Ministro já ficou fora de julgamento sobre dossiê antifascista do Ministério da Justiça e de decisão sobre delação de Palocci. Seu voto é decisivo no recurso de Lula contra ex-juiz da Lava Jato

O decano do STF, Celso de Mello, em julho de 2019.
O decano do STF, Celso de Mello, em julho de 2019.Nelson Jr. (SCO/STF)
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O ministro decano do Supremo Tribunal Federal, Celso de Mello, entrou em licença médica nesta quarta-feira. Em um curto comunicado enviado pela assessoria da Corte, o ministro informou que fará uma pequena cirurgia, mas não detalhou qual seria esta intervenção, quando ela ocorrerá, nem o tempo que ficará afastado dos trabalhos. “O ministro Celso de Mello necessitou pedir licença médica, a quarta licença em 52 anos de serviço público, para realizar um pequeno procedimento cirúrgico”. No início do ano ele passou por uma cirurgia no quadril. Sem Mello, a Corte passará a analisar os casos com dez dos onze ministros. Ele se aposentará compulsoriamente em novembro, quando completa 75 anos de idade. Seu sucessor será indicado pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido) ―a disputa por quem será o primeiro escolhido do ultradireitista para o posto já está a pleno vapor.

A ausência de Mello e sua aposentadoria próxima elevam a incerteza sobre o desfecho de ações cruciais ou o andamento de inquéritos sob sua responsabilidade. O decano é o relator do inquérito que investiga se o presidente Bolsonaro interferiu na Polícia Federal para colher informações em benefício próprio. Há expectativa de que o mandatário deponha nesta investigação. O magistrado também é o responsável por analisar as queixas do primogênito do presidente, o senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ), no caso que ficou conhecido como “rachadinhas”, assim como do processo contra o procurador e coordenador da Operação Lava Jato no Paraná, Deltan Dallagnol, em que ele pode ser punido pelo Conselho Nacional do Ministério Público por ter agido irregularmente em sua função.

Mello, que costuma ser o voto decisivo em julgamentos da Operação Lava Jato, deverá ser o voto de minerva no caso apresentado pela defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em que questiona a parcialidade do ex-juiz Sergio Moro para julgá-lo. Este processo tramita na segunda turma do Supremo, onde atuam cinco ministros. Dois deles, Cármen Lúcia e Edson Fachin, votaram a favor de Moro e contra Lula. Outros dois, Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski, sinalizaram que seguirão na direção contrária. O voto de Mello não estava claro ainda. Se a tese da defesa de Lula for vitoriosa, a condenação de Lula no caso do triplex, por exemplo, seria anulada, e influiria em outros processos contra o ex-presidente. De qualquer maneira, esse processo ainda não tem data para ser julgado.

Primeira ausência

O primeiro julgamento que o decano ficará oficialmente fora iniciou-se nesta quarta-feira. Trata-se de um processo em que era avaliada uma queixa apresentada pelo partido Rede Sustentabilidade contra um dossiê produzido pelo Ministério da Justiça e Segurança Pública com dados de servidores apontados como “antifascistas”. Até o momento, apenas a relatora do caso, a ministra Cármen Lúcia, votou e proibiu o ministério de produzir relatórios contra grupos antifascistas. “No direito constitucional o uso ou o abuso da máquina estatal, mais ainda, para a colheita de informação de servidores com postura política contrária a qualquer Governo caracteriza, sim, desvio de finalidade, pelo menos em tese”, afirmou a relatora. Os outros votos dos ministros do Supremo deverão ser colhidos nesta quinta-feira.

O dossiê antifascista veio à tona no final de julho por meio de uma reportagem do portal UOL. Nele, havia uma relação com 579 servidores da área de segurança e professores universitários que participariam de um grupo de ideologia antifascista. Conforme a apuração, esse grupo estava sendo monitorado pela Secretaria de Operações Integradas, do Ministério da Justiça. A revelação acendeu os alarmes dos que temem o uso de aparato do Estado para a vigilância ou investigação de opositores políticos do Planalto.

Em princípio, o ministro da Justiça, André Mendonça, não desmentiu a existência do documento. Em uma comissão do Congresso Nacional, ele admitiu a produção do dossiê, mas disse que ele era um relatório de inteligência e que não fez nenhum juízo de valor sobre os alvos da apuração. O mesmo argumento foi apresentado no julgamento desta quarta-feira no STF pelo advogado-geral da União, José Levi, e pelo procurador-geral da República, Augusto Aras. “Concluímos que os chamados relatório de inteligência representam na verdade uma compilação de dados e informações extraídas de fontes abertas”, afirmou o procurador. Entre as fontes citadas por ele estariam postagens no Instagram, Facebook, YouTube e manifestos publicados na Internet.

Em sua defesa, o ministro Mendonça ainda afirmou que não determinou a elaboração de nenhum relatório contra opositores, que só soube de sua existência por meio da imprensa, que a União é contra qualquer prática autoritária ou totalitária, inclusive o fascismo, que abriu uma sindicância para apurar a elaboração do documento e demitiu o diretor responsável pelo dossiê. “Se não há dossiê, do que estamos falando em matéria administrativa que resultou até no afastamento de um servidor?”, questionou a ministra Cármen Lúcia. Os outros ministros deverão apresentar os seus votos a partir desta quinta-feira.

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