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Pandemia de coronavírus | O Brasil em luto
Tribuna
São da responsabilidade do editor e transmitem a visão do diário sobre assuntos atuais – tanto nacionais como internacionais

“Meu companheiro tinha sede de viver e só uma condição: dizia que eu estava proibida de morrer antes dele”

Darah escreve uma carta para o marido Cláudio Cardoso, que morreu aos 58 anos em decorrência da covid-19

Darah e seu esposo Cláudio Cardoso.
Darah e seu esposo Cláudio Cardoso.Arquivo pessoal
Darah Cardoso
Belém -

Cláudio Cardoso, de 58 anos, é definido pela esposa, Darah, como um contador de infindáveis causos. Um poeta apaixonado pela escrita e defensor ferrenho da literatura de cordel, que desbravou feiras literárias do Pará. “Era essa paixão que o movia todos os dias, mesmo em seus dias mais difíceis e em meio a vários tratamentos de saúde que ele passou nos últimos anos”, conta a companheira. Cláudio faleceu vítima da covid-19 e deixou um vazio na praça dos artistas de Belém e no coração de sua família. Nas linhas que seguem, o depoimento de Darah sobre a perda do marido.

“Mais de 100 mil famílias no Brasil passaram pela dor que eu passei... Perdi não somente o meu companheiro de vida, mas perdi um amigo, um poeta, um contator de infindáveis “causos” e perdi o “meu menino”, como eu carinhosamente o chamava em vida. É duro aceitar que nunca mais o verei recitando seus versos e prosas, mas penso que nossa história apenas deu uma pausa e ao invés de pensar que te perdi...Devo pensar que apenas nos demos um até logo. Mas quem foi Cláudio Cardoso?

Ele foi um homem imensamente apaixonado pela literatura e pelos livros, montou uma editora para dar vazão ao seu sonho de expandir conhecimento, arte e cultura por meio dos livros, ajudou a fundar a Academia Paraense de Cordel, coordenou por oito anos o Estande dos Escritores Paraenses na Feira Pan-Amazônica do livro e abraçou-se a essa paixão com toda a sua força.

O cordelista  Cláudio Cardoso.
O cordelista Cláudio Cardoso.Arquivo pessoal

Era essa paixão que o movia todos os dias, mesmo em seus dias mais difíceis e em meio a vários tratamentos de saúde que ele passou nos últimos anos. E numa luta quase que diária com a fragilidade de sua saúde, ele ia onde o chamassem, seja para dar palestras em escolas (ele amava o contato com as crianças), saraus ou feiras literárias nas cidades mais remotas. Para falar de poesia e literatura de cordel, lá estava ele a postos, não havia tempo ruim!

Todos os domingos tínhamos o compromisso de estar na Banca dos Escritores Paraenses na Praça da República divulgando autores locais. Esse espaço era uma espécie de refrigério, no qual ele sentia que o seu papel como propagador da cultura paraense estava sendo disseminado. Lá reencontrávamos velhos amigos e fazíamos novos amigos, vender livros era algo secundário. E eu fui a sua grande “retratista” nessa jornada bonita chamada vida! (Era assim que ele me chamava). Meu companheiro foi a pessoa que conheci que mais tinha sede de viver, e ele só tinha uma condição: dizia que eu estava proibida de morrer antes dele. E por razões que desconhecemos as coisas aconteceram dessa forma. Agora que cumpriu sua jornada ele foi brilhar em outro andar... Afinal, como diria Maiakóvski (um de seus poetas favoritos), Cláudio “Ilumina para sempre...Ilumina tudo. Até os últimos dias da eternidade... Ilumina e só...Eis o meu lema e o do sol”.

A história de Cláudio Cardoso foi contada pelo projeto Inumeráveis, um memorial dedicado à história de cada uma das vítimas do coronavírus no Brasil.

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