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Câmara força Planalto a ceder e aprova o novo Fundeb, que financia mais da metade da educação básica no Brasil

Gestão Bolsonaro concordou em aumentar participação de 10% para 23% no principal fundo de financiamento da educação básica do Brasil. Governo queria reservar recursos para novo programa de Paulo Guedes, que pretende absorver Bolsa Família

Escola estadual em Santa Gertrudes (SP).
Escola estadual em Santa Gertrudes (SP).M. R.
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Brazil's President Jair Bolsonaro gestures while meeting supporters during a ceremony of lowering the national flag for the night, amid the coronavirus disease (COVID-19) outbreak, at the Alvorada Palace in Brasilia, Brazil, July 19, 2020. REUTERS/Adriano Machado
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Depois de cinco anos de discussões, a Câmara dos Deputados aprovou na noite desta terça-feira, com votação quase unânime, o novo Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação, o Fundeb. A proposta de emenda constitucional 15/2015 teve o voto de 499 deputados a favor e apenas 7 contrários à mudança no principal mecanismo de financiamento da educação básica do Brasil, que estava prestes a expirar. Como é uma emenda constitucional, eram necessários 308 votos entre os 513 deputados. O texto agora vai para o Senado.

A aprovação pode ser considerada uma derrota para o Governo Jair Bolsonaro, que queria usar parte dos recursos do fundo para o programa Renda Brasil, uma iniciativa que deve pagar até 300 reais para as famílias mais pobres e está sendo desenhado pela equipe econômica como uma substituição do Bolsa Família e de outras medidas assistenciais —uma aposta do Planalto de criar uma marca junto ao eleitorado. O defensor desse bloqueio no debate era o ministro da Economia, Paulo Guedes, que chegou a defender a criação de um voucher na educação em que escolas particulares receberiam uma verba da União para fazer o trabalho das escolas públicas.

A validade do Fundeb é dezembro deste ano. Se não for aprovado pelo Legislativo, a partir de 2021 Estados e Municípios ficarão sem parte dos 165 bilhões de reais do fundo. Vigente desde 2007 ele é composto por pela arrecadação de impostos municipais, estaduais e federais. Corresponde a cerca de 63% dos recursos para o financiamento da educação básica pública brasileira. Seu principal objetivo é reduzir a desigualdade de recursos entre as redes de ensino. Um estudo técnico da Câmara mostra que, sem o fundo, a desigualdade entre as redes seria de 10.000%, contra os atuais 564%.

Nesta terça-feira, os parlamentares aprovaram a PEC. Entraram noite adentro para finalizar a análise dos destaques (emendas) individuais e as feitas pelas bancadas. Agora, aos senadores analisarão o texto. A expectativa no Congresso é que a votação seja célere no Senado, já que houve intensa negociação entre senadores e deputados para a elaboração do texto relatado pela deputada Professora Dorinha Seabra (DEM-TO).

Ausente dos debates ao longo de um ano e meio, na segunda-feira, o Governo Bolsonaro sugeriu adiar a validade do novo Fundeb para 2022, ao invés de 2021, e usar os recursos distribuídos pela União no programa Renda Brasil. Quando notou que a proposta seria rejeitada pelo Legislativo, o ministro Luiz Eduardo Ramos, da Secretaria de Governo, pediu para adiar a votação para que o novo ministro da Educação, Milton Ribeiro, pudesse participar das discussões —ele foi empossado na semana passada. Ramos não foi ouvido e se viu obrigado a negociar.

Primeiro, o Executivo teve de concordar em validar o fundo já para 2021. Depois, cedeu a ampliar a sua participação do Fundeb. Atualmente, é de 10%. A relatora Dorinha Seabra sugeriu ampliar para 20%. No fim, o Governo concordou em reajustar para 23%, desde que 5% desse valor seja investido diretamente na educação infantil —que abrange crianças até os seis anos de idade. Hoje, os recursos podem ser investidos conforme os governos estaduais e municipais bem entenderem. A gestão Bolsonaro definiu esses 5% porque tem como meta de campanha investir na primeira infância.

O aumento na transferência de recursos do Governo será escalonado, sendo que seu ápice chegará em 2026. Se aprovado da mesma maneira no Senado, o novo Fundeb não terá prazo de expiração. Passará a ser uma política de Estado prevista na Constituição Federal. Ao fim de seis anos, a participação da União chegará a quase 30 bilhões de reais. Pelas contas de técnicos da Câmara, 24 das 27 Unidades da Federação terão mais recursos do que atualmente, sendo que os mais beneficiados serão: Bahia, Maranhão, Ceará, Pará e Pernambuco. Outro ponto destacado pelo projeto é o de definir que o fundo ao menos 70% dele seja usado para o pagamento de todos os profissionais de educação. Atualmente, é definido que 60% dele sejam destinados apenas aos professores.

“Se dependesse do Governo Bolsonaro teríamos um colapso. Em 2021 não teríamos esse fundo que financia quase 65% das escolas brasileiras”, disse a relatora Dorinha Seabra. Um outro sinal de que o Governo perderia no plenário: 20 dos 27 Governadores brasileiros assinaram uma carta de apoio ao relatório da deputada.

A ONG Todo pela Educação fez um cálculo para demonstrar a importância da aprovação do projeto: até 2026, o valor anual investido por aluno na rede pública aumentará de aproximadamente 3.700 reais para 5.700 reais. “A grande inovação e avanço do novo Fundeb é a maior eficiência alocativa dos recursos, direcionando mais para os alunos mais pobres”, disse a presidente da ONG, Priscila Cruz, em sua conta no Twitter.

Nos últimos dias, representantes do Governo tentaram reforçar o discurso de que esse não era o momento de se aprovar o novo Fundeb, porque o país enfrenta um grave problema econômico e fiscal em decorrência da pandemia de coronavírus. “Se enganam aqueles que pensam que educação não pode contribuir com a superação da crise que estamos vivendo. Serão nossas escolas públicas que acolherão os que terão de abrir mão da rede privada”, ressaltou a deputada Tabata Amaral (PDT-SP).

Entre os parlamentares que ocuparam a tribuna para se manifestar, quase todos disseram que a votação da proposta era um marco para a educação brasileira. Um dos que se empenharam nessa votação foi o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ). Ao final da votação do texto-base, Maia fez um incomum gesto e deixou que outro expoente da educação na Casa, o deputado Felipe Rigoni (PSB-ES), declarasse o resultado. Em seu discurso, Rigoni exaltou a importância do resultado. “O Fundeb define o futuro do nosso país. Ele define como cada homem, cada mulher, será formado”.


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