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PF apreende celular e computador de Witzel e eleva suspeita de interferência política de Bolsonaro

Governador do Rio é investigado em suposto esquema de desvios de recursos destinados à Saúde. Presidente, suspeito de tentar interferir na Polícia Federal, parabeniza corporação

Agentes da PF deixam o Palácio das Laranjeiras, sede do Governo do Rio de Janeiro, nesta terça-feira, 26 de maio.
Agentes da PF deixam o Palácio das Laranjeiras, sede do Governo do Rio de Janeiro, nesta terça-feira, 26 de maio.Silvia Izquierdo (AP)
Felipe Betim

O Rio de Janeiro voltou a ser palco de mais uma operação contra a corrupção nesta terça-feira, 26 de maio. Entre os alvos dos agentes da Polícia Federal (PF) está o atual governador do Estado, Wilson Witzel (PSC), investigado no âmbito do Superior Tribunal de Justiça (STJ) por participar de suposto esquema de desvios de recursos destinados à Secretária da Saúde, mais especificamente na contratação de uma Organização Social (OS) para a instalação de hospitais de campanha que devem receber pacientes com suspeitas de coronavírus. Witzel, que viu seu celular e computador serem apreendidos a pedido da Procuradoria-Geral da República (PGR), nega qualquer envolvimento no esquema. Ele é o sexto governador fluminense envolvido em investigações policiais. Há indícios de que a chamada Operação Placebo já fosse conhecida do Planalto, em Brasília. O presidente, que é investigado no Supremo Tribunal Federal (STF) por suspeita de interferir na PF e é inimigo político do Governador do Rio, parabenizou a Polícia Federal ao ser questionado sobre a operação.

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A investigação aberta em 13 de maio, feita pelo Ministério Público Federal (MPF) em conjunto com a promotoria estadual, mira um contrato emergencial assinado entre o Governo Witzel e a OS Iabas no valor de 835 milhões de reais para construir e gerir sete hospitais de campanha. No pedido de busca e apreensão, o MPF afirma que há “provável envolvimento da cúpula do Poder Executivo fluminense”. A ação foi autorizada pelo ministro Benedito Gonçalves e mirou 12 endereços, entre eles o Palácio Laranjeiras, usado como residência oficial do governador, o Palácio Guanabara, de onde o Witzel despacha, a antiga residência do governador no bairro do Grajaú e o escritório de advocacia de sua esposa, Helena Witzel.

A operação faz parte de uma investigação que, no início do mês, prendeu o ex-subsecretário da Saúde do Rio, Gabriell Neves, e mais três pessoas por suspeita de obter vantagens ao realizar uma compra emergencial de respiradores. O caso, revelado na época pelo jornalista Rubens Berta, destampou as suspeitas de fraude em contratos sem licitação que somam 1 bilhão de reais para combater o coronavírus. O maior deles é o de 835 milhões com a OS Iabas. O juiz Marcelo Bretas, coordenador da Lava Jato fluminense, autorizou a prisão no dia 14 de maio do empresário Mário Peixoto, que comanda o grupo. Em meio às denúncias de fraude, Witzel demitiu dias depois o então secretário da Saúde Edmar Santos.

Os elementos colhidos pelos investigadores federais e estaduais foram então encaminhados à PGR, e as apurações passaram a atingir diretamente o governador. Um contrato de 540.000 reais achado no escritório da primeira-dama do Rio com a empresa investigada seria um dos indícios de que o governador teria se beneficiado do esquema, segundo informou a coluna Painel, do jornal Folha de S. Paulo. O valor deveria ser pago em 36 parcelas de 15.000. Witzel nega irregularidades e acusa o presidente Bolsonaro de perseguição política.

Possível interferência política na PF

Um dia antes da operação contra Witzel, a deputada bolsonarista Carla Zambelli afirmou em uma entrevista que haveria operações policiais contra governadores. A parlamentar é esposa de um agente da Força Nacional, subordinada, assim como a PF, ao Ministério da Justiça. A Federação Nacional de Policiais Federais defendeu nesta terça que o vazamento seja investigado, devido ao "conhecido e notório” vínculo de Zambelli com delegados. Ela negou ter sido avisada da operação desta terça. “Estranha-me e indigna-me sobremaneira o fato absolutamente claro de que deputados bolsonaristas tenham anunciado em redes sociais nos últimos dias uma operação da Polícia Federal direcionada a mim, o que demonstra limpidamente que houve vazamento”, afirmou Witzel em nota.

Nesta terça, Bolsonaro parabenizou a PF pela ação. A superintendência da PF no Rio está no centro do desentendimento do presidente com o então ministro da Justiça Sergio Moro, que deixou o cargo acusando o chefe de querer interferir no comando da corporação. As acusações de Moro levaram à abertura de um inquérito no STF à pedido do procurador-geral da República, Augusto Aras. Após a saída de Moro, o presidente exonerou o diretor da PF e, no mesmo dia, trocou a superintendência do Rio. No vídeo da reunião ministerial de 22 de abril, Bolsonaro também deu a entender que queria interferir na corporação para evitar que familiares e amigos fossem atingidos por investigações. Também especula-se que o presidente tem a intenção de usar a corporação contra adversários políticos, algo que ele nega.

Witzel embarcou no discurso bolsonarista e contou com o importante apoio de Flávio Bolsonaro para ganhar as eleições de 2018. O governador já no ano passado se tornou desafeto político de Bolsonaro, que o acusa de usar o aparato policial local para prejudicar a ele e sua família mirando as eleições presidenciais de 2022. Reportagem da revista Crusoé publicada no último dia 22 mostrou que o conteúdo de um dossiê que passou pelo Palácio do Planalto é o mesmo que embasou o inquérito sigiloso contra Witzel. Nesta terça, o blog da jornalista Andreia Sadi informava que integrantes do Planalto já esperavam há alguns dias a ação contra Witzel.

Em pronunciamento feito nesta terça, Witzel se voltou contra o senador Flavio Bolsonaro, seu antigo padrinho político. “Ao contrário do que se vê na família do presidente Bolsonaro, a família engaveta inquéritos, vaza informações. O senador Flávio Bolsonaro, com todas as provas que temos contra ele, já devia estar preso. Este sim", afirmou o governador, em referência às investigações abertas contra o filho do presidente sobre as suspeitas de rachadinha em seu gabinete. "A Polícia Federal deveria fazer o seu trabalho com a mesma serenidade que passou a fazer no Rio de Janeiro porque o presidente acredita que estou perseguindo a família, e ele acredita que a única alternativa é me perseguir politicamente”, acrescentou.

O senador rebateu Witzel em live no Instagram. “Quando você diz que eu já deveria estar preso, preso por quê? Eu não fiz nada de errado. Estou sendo investigado há mais de dois anos e não tem denúncia contra mim porque não tem como me denunciar. Agora, no seu caso não”, afirmou. “Peço desculpas a você que votou no governador Wilson acreditando em mim, no Bolsonaro. Eu, especificamente, porque o presidente ficou rodando outros Estados e me deixou sob incumbência para tocar a campanha no Rio de Janeiro”, concluiu.

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