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Novas revelações de ex-aliado acossam Bolsonaro diante do inquérito do ministro Celso de Mello no STF

Paulo Marinho deu detalhes sobre ação da PF antecipada a Flavio Bolsonaro em 2018 para proteger Queiroz. Celso de Mello retoma investigação para saber se presidente tentou interferir na PF

Presidente Jair Bolsonaro, durante um ato em Brasília.
Presidente Jair Bolsonaro, durante um ato em Brasília.ADRIANO MACHADO (Reuters)

O ministro do Supremo Tribunal Federal, Celso de Mello, retoma nesta segunda (18) o inquérito que apura as acusações feitas pelo ex-ministro Sergio Moro de que o presidente Jair Bolsonaro tentou interferir na Polícia Federal do Rio de Janeiro para proteger seus filhos, alvos de investigação. A retomada do assunto já estava na agenda do Supremo. Mas o que o presidente não contava era com uma entrevista bomba dada pelo empresário Paulo Marinho, seu ex-aliado, à jornalista Mônica Bergamo, da Folha de S.Paulo. Marinho, que é suplente do senador Flavio Bolsonaro e teve papel decisivo na campanha eleitoral do então presidenciável do PSL em 2018, revelou que o filho do presidente soube antecipadamente de uma operação da Polícia Federal que atingiria Fabricio Queiroz, seu ex-assessor. A informação chegou a Flavio entre o primeiro e segundo turno da eleição e acabou protegendo Queiroz e o próprio Flavio, na apuração sobre as rachadinhas em seu gabinete.

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Quem encara as aglomerações (e arrisca a saúde) por Bolsonaro, em imagens
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“Bolsonaro tentar submeter a PF é ilegal, mas a competência para lidar com isso é do Congresso, não do STF”
AME9209. BRASILIA (BRASIL), 12/05/2020.- El presidente de Brasil, Jair Bolsonaro (arriba 2d), atiende a periodistas durante una rueda de prensa desde una rampa del Palacio do Planalto este martes, en Brasilia (Brasil). La defensa del exministro de Justicia de Brasil Sergio Moro demandó este martes que sea divulgado un video en el que quedaría comprobado que el presidente Jair Bolsonaro intentó "interferir" política e ilegalmente en la Policía Federal. EFE/ Joédson Alves
Bolsonaro disse que sua família era perseguida pela PF e cobrou mudanças, relatam espectadores de vídeo

A revelação joga mais lenha na crise política que acossa o presidente, e eleva a pressão sobre o procurador geral da República, Augusto Aras, que está envolvido na investigação de potenciais crimes que o presidente possa ter cometido, seguindo as acusações de Moro. Paulo Marinho contou que Flavio soube por intermédio de um delegado simpatizante de Bolsonaro sobre o curso da operação Furna de Onça, que investigava transações suspeitas de dinheiro, e passavam pelas chamadas ‘rachadinhas’ da Assembleia Legislativa do Rio. Queiroz, amigo de longa data do presidente, trabalhava para Flavio quando ele era deputado estadual. O hoje senador foi deputado entre 2003 e 2018. “Eu vou te contar uma história que nunca revelei antes porque não tinha razão para falar disso. Eu tenho até datas anotadas e vou ser bem preciso no relato que vou fazer”, disse Marinho na entrevista.

O empresário, que transformou sua casa em QG da campanha bolsonarista, deu detalhes de como em 13 de dezembro de 2018 foi procurado por Flavio Bolsonaro pedindo indicação um advogado criminalista. Dias antes, a imprensa havia revelado que Queiroz havia movimentado 1,2 milhão de reais em contas suspeitas ao longo de um ano. Segundo Marinho, Flavio soube da investigação sobre Queiroz logo após o primeiro turno da eleição, em outubro. Pelos relatos ouvidos do próprio Flavio e de seu advogado, Marinho reproduz o que o delegado teria dito a um interlocutor de Flavio, o Coronel Braga, hoje chefe de seu gabinete no Senado. “Vai ser deflagrada a Operação Furna de Onça, que vai atingir em cheio a Assembleia Legislativa do Rio. E essa operação vai alcançar algumas pessoas do gabinete do Flavio. Uma delas é o Queiroz e a filha dele, Nathalia”. Personal trainer, Nathalia era empregada do gabinete de Jair Bolsonaro quando ele era deputado, e a imprensa descobriu que ela não cumpria expediente, mesmo ganhando salário. Queiroz está desaparecido e não responde a requisições da Justiça, que já concluiu que ele movimentou na verdade uma quantia de até 6 milhões de reais, incluindo as 'rachadinhas’ que alcançam o senador Flavio Bolsonaro.

O vazamento espontâneo da agenda de operações da PF ainda contou com outro detalhe preocupante. Segundo Marinho, o delegado simpatizante de Bolsonaro disse ao coronel Braga que a operação ia ser adiada para não atrapalhar o segundo turno.

A entrevista bomba gerou uma petição do deputado Marcelo Calero (Cidadania-RJ) para que Paulo Marinho e os demais nomes citados por ele na entrevista sejam ouvidos no âmbito do inquérito conduzido pelo ministro Celso de Mello. “As informações divulgadas pelo então apoiador [Paulo Marinho] revelaram conexões com a atual investigação no STF que apura interferências políticas na Polícia Federal”, diz. Também a PGR se manifesta sobre o assunto. Segundo o jornal O Globo, um ofício foi enviado à Polícia Federal para que o depoimento de Marinho seja incluído no inquérito que apura eventuais interferências do presidente na PF.

O senador Flavio Bolsonaro se defendeu dizendo que nunca foi alvo da operação Furna de Onça desmentindo seu suplente. “Nem eu, nem meu ex-assessor, éramos alvo da operação da Polícia Federal (PF) denominada “Furna da Onça”. Mas, segundo meu suplente Paulo Marinho (agora assumidamente representante de Dória no Rio - PSDB), eu teria recebido informações de que a PF investigava meu ex-assessor.”

O presidente Bolsonaro, por sua vez, procurou mostrar tranquilidade em mais uma aparição para apoiadores em Brasíllia, como tem feito nos últimos domingos. Acompanhado de 11 ministros, e usando máscaras de proteção, assistiu a uma carreata em seu apoio e acenou para uma centena de manifestantes que apareceram na porta do Palácio do Planalto. “Agradeço a todos que estão aqui; os que torcem para que o Brasil realmente ocupe o lugar de destaque que ele merece. Nenhuma faixa, nenhuma bandeira que atente contra a nossa Constituição ou contra o Estado democrático de direito. O movimento está de parabéns", afirmou Bolsonaro, em vídeo divulgado nas redes sociais.

Sai o presidente que diz “quem manda sou eu” e abraça manifestantes com bandeiras pelo AI-5, entra o presidente preocupado com as instituições. Sem partido e negociando com o Centrão, formado por deputados que sempre renegou, Bolsonaro se apoia em pequenos núcleos radicais produzindo imagens favoráveis a si mesmo para as redes. “Emocionante, uma manifestação espontânea, pacífica. É muito gratificante e honroso da minha parte e de meu ministério receber uma manifestação de apoio neste sentido”, repetiu o presidente, desta vez, em tom conciliador, após semanas de embates com os demais poderes, onde seus apoiadores não se furtaram a pedir, inclusive, a volta da ditadura militar.

Mas apesar dos atos de apoio, os panelaços voltaram com força neste final de semana em vários pontos do país. Agora o presidente ― e o Brasil ― aguardam os próximos capítulos desta novela que coloca os militares e o Governo na mesma panela de pressão política em plena pandemia. Com o posto de ministro da Saúde vago e uma investigação em curso no Supremo, Bolsonaro encara mais uma semana à frente do país que já é o quarto em número de infectados por covid-19 no mundo, lutando contra o desgaste que tem lhe roubado o apoio de outrora.

A transcrição do vídeo da reunião ministerial de final de abril , estopim da saída de Moro e fonte das acusações de que Bolsonaro tentou interferir na PF do Rio, já trazia conteúdo comprometedor. “Já tentei trocar gente da segurança nossa no Rio de Janeiro oficialmente e não consegui. Isso acabou. Eu não vou esperar f. minha família toda de sacanagem, ou amigo meu, porque eu não posso trocar alguém da segurança da ponta de linha que pertence à estrutura”. A referência era a uma eventual troca na superintendência do Rio, que não tinha o aval do então diretor-geral da PF, Maurício Valeixo, aliado de Moro. Qualquer investigação que envolva Flavio e Queiroz passa pelo Rio.

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